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terça-feira 11 de outubro de 2022 às 17:23h

Como bolsonarismo ‘encolheu’ bancada evangélica na Câmara

NOTÍCIAS, POLÍTICA


Segundo o BBC News Brasil, influente, temida por setores da esquerda e um dos braços fortes da direita, a bancada evangélica teve uma ligeira diminuição no número de membros na comparação entre o número de parlamentares em 2018 e os que se elegeram neste ano.

De acordo com os cálculos do pesquisador Guilherme Galvão Lopes, da Fundação Getulio Vargas (FGV), em 2018 foram eleitos 84 parlamentares evangélicos. Neste ano, ele estimou o número de eleitos entre 60 e 65.

Galvão e outros especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, avaliam que parte da responsabilidade por essa redução se deu pelo crescimento do chamado bolsonarismo, uma corrente política conservadora liderada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL).

Se por um lado o número de evangélicos eleitos caiu, por outro, a bancada do PL, partido de Bolsonaro, saiu de 33 deputados federais em 2018 para 99 em 2022.

Apesar disso, os especialistas afirmam que a redução da bancada evangélica não deverá significar uma diminuição da influência da pauta religiosa conservadora no Parlamento.

Segundo eles, isso deverá acontecer porque, a maior parte das pautas defendidas pelos candidatos evangélicos foi incorporada pelo bolsonarismo.

Assim, ainda que o número de candidatos ligados ao eleitorado tenha caído, a pauta continuaria influente porque será defendida por candidatos bolsonaristas.

“O bolsonarismo assimilou a pauta conservadora e fez com que candidatos de fora do universo evangélico, mas que defendem essas pautas, ganhassem destaque nas eleições”, resume Galvão.

A atenção ao eleitorado evangélico ganhou novos contornos nos últimos anos. Dados de 2020 do Datafolha mostram que evangélicos (em suas diversas denominações) somariam 31% da população brasileira.

São o segundo grupo religioso mais numeroso do país, atrás apenas dos católicos, que representariam 50% da população.

Há algumas décadas, esse volume de eleitores passou a se materializar em uma bancada influente no Congresso Nacional. O grupo já deu suporte aos governos dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Dilma Rousseff (PT), mas a partir de 2014, passou a se posicionar de forma crítica ao PT.

Em 2018, lideranças influentes no universo evangélico como o pastor Silas Malafaia, da Igreja Assembleia de Deus, e Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de Deus, declararam apoio à candidatura de Jair Bolsonaro.

Neste ano, o apoio de Malafaia, por exemplo, foi redobrado. Recentemente, o pastor acompanhou Bolsonaro em viagens internacionais ao Reino Unido e aos Estados Unidos.

Ao longo de sua campanha em 2018 e durante o seu governo, Bolsonaro se colocou como aliado do eleitor evangélico e defensor de pautas importantes para parte desse eleitorado como a não-descriminalização das drogas e do aborto.

Lula, que disputa o segundo turno das eleições presidenciais com Bolsonaro, vem tentando conquistar o apoio dessa faixa do eleitorado. As pesquisas de intenção de voto mais recentes como a do Ipec, no entanto, continuam apontando que o eleitor evangélico continua preferindo Bolsonaro ao petista.

Levantamento divulgado na quinta-feira (7/10) mostra que 61% dos eleitores evangélicos afirmam votar em Bolsonaro contra 31% que dizem votar em Lula.

Galvão explica que esse deslocamento do voto evangélico para candidatos bolsonaristas se deu, em grande parte, pelo fato de o bolsonarismo não representar apenas as bandeiras tradicionalmente evangélicas. Segundo ele, o movimento liderado por Bolsonaro oferece isso e outras pautas.

“Anteriormente, tínhamos parlamentares de diferentes denominações exercendo liderança sobre esse eleitorado. Hoje, elas veem Bolsonaro e o bolsonarismo com essa liderança.

Antes, os candidatos pastores militavam em pautas mais específicas do eleitorado evangélico. Agora, candidatos bolsonaristas oferecem essas mesmas pautas e outras como a da segurança pública”, disse o professor.

“Quem ficou apenas no discurso evangélico e não se engajou com o bolsonarismo perdeu voto. Se a gente for olhar friamente, os candidatos evangélicos mais identificados que foram pro PL e que estiveram mais engajados com o bolsonarismo tiveram o melhor desempenho eleitoral”, diz o pesquisador.

Irmão (nem sempre) vota em irmão

A professora de Sociologia da Universidade de Brasília (UnB) e pesquisadora do Instituto de Estudos da Religião (ISER), Jacqueline Moraes Teixeira, aponta uma outra possível causa para a diminuição da bancada evangélica em detrimento do aumento da bancada bolsonarista.

Como pensam evangélicas, que podem definir eleição para presidente
Segundo ela, pesquisas recentes mostram que, para o eleitor evangélico, mais importante do que o candidato ser evangélico é que ele seja identificado como cristão. Isso contrapõe um ditado que circulou durante anos dentro do universo religioso sobre o assunto: “Irmão vota em irmão”.

“Candidatos que constroem sua imagem dentro de uma identidade cristã recebem o voto do evangélico independentemente de suas filiações religiosas. Já vimos, em 2020, por exemplo, candidatos católicos terem melhor desempenho nesse segmento dos candidatos evangélicos”, explicou a professora.

O pastor, sociólogo e pesquisador do ISER, Clemir Fernandes, aponta um outro motivo que ajudaria a explicar a redução no número de evangélicos eleitos em 2022.

“Uma hipótese pertinente é que há certa exaustão em se falar de política nos espaços de cultos das igrejas. Os evangélicos são cidadãos e têm participado cada vez mais da política institucional, mas parece haver um crescente mal-estar em falar de política nos cultos e púlpitos das igrejas”, disse o pesquisador.

“É como se pastores e líderes estivessem misturando demais ‘sagrado’ e ‘profano’, ou fé com política num nível tido como razoavelmente inaceitável. Política os crentes têm na rede social, no WhatsApp, na TV, no trabalho. Na igreja, ele quer uma mensagem de espiritualidade e de paz, não de tensão, como é próprio da política por dividir opiniões”, diz Clemir Fernandes.

Pauta se mantém forte

Para Guilherme Galvão, doutorando em História e Política pela FGV e autor do livro “Evangélicos, Mídia e Poder”, a queda no número de evangélicos eleitos para a Câmara dos Deputados não deverá levar a uma redução da influência da pauta conservadora defendida por parte desse eleitorado no Parlamento.

“Essa queda não é uma demonstração de fraqueza da pauta evangélica. Bolsonaro fez com que houvesse um deslocamento do voto em candidatos evangélicos em candidatos identificados com o bolsonarismo. A pauta continuará relevante e influente ainda que defendida por parlamentares não-evangélicos”, avaliou o professor.

Clemir Fernandes pontua que a maior aceitação de propostas conservadoras pode ter feito aumentar o número de candidaturas que defendam esse tipo de pauta. Consequentemente, o que poderia indicar uma redução da influência dessa agenda, na realidade pode ser um aumento do seu poder na cena política.

“Talvez a ampliação desses temas morais e tradicionais na sociedade tenha aumentado a oferta de candidaturas, mesmo sem identidade religiosa […] O que pode parecer redução da bancada evangélica é uma possível ampliação de uma ‘bancada conservadora’, tanto na Câmara Federal e Senado, mas também nas assembleias legislativas estaduais”, disse o pesquisador.

“O fato de a bancada evangélica ser menor não diminui o engajamento da pauta porque ela será replicada com muita força por outros parlamentares que não são evangélicos”, afirmou a pesquisadora.

Jacqueline Moraes diz que tão importante quanto avaliar a quantidade de parlamentares evangélicos eleitos é ver o tamanho que a Frente Parlamentar Evangélica (FPE) terá no Congresso Nacional a partir de 2023. A FPE é um grupo suprapartidário composto por evangélicos e não-evangélicos que defende as pautas relativas a esse segmento do eleitorado.

“A articulação dessas pautas dentro da Frente Parlamentar Evangélica pode ser maior do que dentro desse grupo reduzido e mais coeso que o de parlamentares religiosos”, explica.

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