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O segundo módulo do "Palácio Celestial" chinês foi lançado por um foguete na província de Hainan - Foto: REUTERS - CHINA DAILY
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domingo 16 de julho de 2023 às 13:48h

EUA e China travam nova guerra pela Lua; o que eles querem encontrar lá?

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Mais de meio século depois de Neil Armstrong dar aquele que se tornaria o mais famoso passo da humanidade, a Lua voltou segundo  Roberta Jansen, do jornal O Estado de São Paulo, a estar no foco das atenções políticas mundiais. Os Estados Unidos querem levar quatro astronautas para lá no ano que vem ou em 2025. Mais recentemente, a China também anunciou o plano de missão tripulada ao satélite natural da Terra até o fim desta década, abrindo uma nova era da exploração lunar.

O objetivo declarado por ambos é científico: retomar as pesquisas de campo interrompidas em 1972. Entre as possibilidades de recursos a serem explorados na Lua, estão água, minerais e energia (que não andam sobrando no nosso planeta). Também será uma oportunidade de preparar as bases para uma futura missão a Marte.

“Uma base lunar seria um facilitador grande para uma missão tripulada a Marte”, explica o astrônomo Alexandre Cherman, vice-presidente da Associação Brasileira de Planetários. “E não tenho dúvidas de que a primeira pessoa que chegará em Marte já está entre nós. Não sei se é adolescente ou bebê, mas, certamente, já nasceu.”

A ciência, porém, está longe de ser o único propulsor da nova corrida. Está em jogo a soberania geopolítica e tecnológica, além de interesses econômicos. Enquanto Marte ainda não é um destino viável, a (re)conquista da Lua é o símbolo dessa nova supremacia mundial, como foi há 54 anos.

“Não é uma nova Guerra Fria, mas certamente é uma competição muito acirrada entre duas potências, em que a questão militar é crucial”, afirma Leonardo Valente, do Instituto de Relações Internacionais e Defesa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “Uma corrida dessa envergadura é, na verdade, voltada para a Terra”, diz.

Não é uma nova Guerra Fria, mas certamente é uma competição muito acirrada entre duas potências, em que a questão militar é crucial.

Leonardo Valente, do Instituto de Relações Internacionais e Defesa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

Para ele, há duas razões essenciais. A primeira é a política de prestígio e superioridade. “Se a União Soviética foi a grande rival no passado, agora é a China que se posiciona como rival em todas as áreas. Outro fator é a geração de tecnologia de ponta para uso na Terra, inclusive bélica. A sopa desidratada da dieta da moda, as armas sofisticadas usadas na Ucrânia, entre tantas outras coisas, são fruto da tecnologia gerada pela corrida espacial.”

O próprio diretor da Agência Espacial Americana (Nasa), Bill Nelson, não esconde o clima de concorrência. “É um fato: estamos numa corrida espacial”, afirmou, em janeiro. “E é melhor tomarmos cuidado para que não ocupem uma parte da Lua à guisa de pesquisa científica. Não é inimaginável que nos digam algo como: Fiquem de fora, estamos aqui, é nosso território’.”

Lua não está sujeita a apropriação nacional, prevê tratado

China, os Estados Unidos e outros 132 países são signatários do Tratado do Espaço Sideral, de 1967, segundo o qual “o espaço, incluindo a Lua e outros corpos celestes, não está sujeito a apropriação nacional por alegação de soberania, de ocupação ou qualquer outra”.

Por enquanto, os Estados Unidos estão à frente na disputa. Mas a China, que se abre menos para olhares externos, tem demonstrado capacidade de surpreender o Ocidente nas últimas décadas.

Pelas contas da cientista Svetla Bem Itzhak, da Air University (Paquistão), que pesquisa o envolvimento de cada país na exploração espacial, o orçamento dos Estados Unidos para o setor em 2021 foi de aproximadamente US$ 60 bilhões (R$ 288 bilhões). Já a China, embora eleve exponencialmente o montante, não investiu mais de US$ 16 bilhões (R$ 76 bilhões).

De um total de 5.465 satélites em órbita da Terra, os americanos operam nada menos que 3.433, ante 541 da China. Os Estados Unidos têm sete plataformas de lançamento espacial em operação (e outras 13 em desenvolvimento) e a China, quatro (duas em planejamento).

Ainda segundo Svetla, a Casa Branca já assinou 169 acordos de compartilhamento de dados com 33 países, o Brasil entre eles, e organizações internacionais; 129 com parceiros comerciais (entre eles a SpaceX de Elon Musk e a Blue Origin de Jeff Bezos) e outros sete com instituições acadêmicas.

Embora a China também tenha parceiros – o mais importante é justamente a Rússia, que já foi a principal opositora de Washington – eles são em menor número e têm bem menos capacidades espaciais desenvolvidas.

Na última década, foram feitas seis tentativas de pouso lunar. Três delas, bem sucedidas, pela China que, inclusive, trouxe de volta à Terra amostras de solo, e outras três fracassadas, lideradas por Índia, Japão e Israel.

E mais: a China acaba de encerrar a construção de uma estação espacial, a Tiangong. A Estação Espacial Internacional (ISS), uma parceria dos EUA com outros 14 países, por sua vez, deve encerrar suas atividades em 2030, quando já estará com 32 anos.

Da ‘A Terra é azul’ ao ‘salto para a Humanidade’

Nos anos 1960 e 1970, a corrida espacial motivou as duas grandes potências, os EUA e a ex-União Soviética, a levarem o primeiro homem à Lua, como símbolo máximo do poderio bélico e tecnológico.

Por muito tempo, os soviéticos se mantiveram à frente. Em 12 de abril de 1961, a ex-URRS levou pela primeira vez um homem à órbita terrestre, o cosmonauta Iuri Gagarin (1934-1968) a bordo da espaçonave Vostok 1. É de autoria de Gagarin, o primeiro a ver nosso planeta do espaço, a famosa frase: “A Terra é azul”.

Os EUA só ultrapassariam a primazia soviética quase dez anos depois, em 20 de julho de 1969, quando pousaram uma missão tripulada na Lua, e mostraram ao vivo, pela TV, os primeiros passos de um homem (Neil Armstrong) em solo lunar: “Um salto para a Humanidade”.

“A primeira corrida espacial, entre EUA e a ex-URSS tinha um caráter diferente. Naquela época, havia a tensão da bomba atômica, uma disputa bélica”, lembra o astrônomo João Eduardo da Fonseca, diretor do Planetário do Ibirapuera, em São Paulo. “Era uma questão de dizer: ‘se consigo colocar um homem na Lua e trazê-lo de volta à Terra em segurança, também consigo colocar um míssil na sua porta.”

Era uma questão de dizer: ‘se consigo colocar um homem na Lua e trazê-lo de volta à Terra em segurança, também consigo colocar um míssil na sua porta.

João Eduardo da Fonseca, diretor do Planetário do Ibirapuera, em São Paulo

A exploração lunar acabou sendo abandonada em 1972, quando a Nasa levou a última missão tripulada à Lua. Desde então, tanto os EUA quanto a Rússia vinham se dedicando a enviar sondas e robôs a outros planetas do Sistema Solar e a construir estações espaciais. Subitamente, mais de meio século depois, a atração pela Lua ressurgiu.

Mas por que a Lua entrou na moda de novo?

Do ponto de vista científico, a descoberta e a confirmação da existência de água congelada nos polos lunares, no início dos anos 2000, reacendeu esse interesse. A presença de uma fonte importante de oxigênio e hidrogênio deu às agências espaciais uma nova razão para explorar a Lua.

Um segundo fator, foi a ascensão do programa espacial chinês, que enviou uma série de missões bem sucedidas à Lua e, desde logo, anunciou seu interesse de levar taikonautas (como Pequim chama seus astronautas) ao satélite e, depois, a Marte.

Por fim, há interesses econômicos de empresas privadas que querem explorar recursos minerais na Lua. Por princípio, a Lua não pertence a ninguém. Mas quem conseguir estabelecer as primeiras bases ou colônias lunares, certamente vai alegar prioridade.

“A exploração comercial de minério no espaço, do ponto de vista econômico, não é economicamente viável, por enquanto”, afirma Cherman. “Mas a tecnologia avança exponencialmente. Em algum ponto, essa balança vai se inverter.”

Seis missões ao satélite terrestre estão previstas para acontecer até o fim deste ano, em antecipação aos lançamentos tripulados. Além de Estados Unidos e China, Índia, Japão e Rússia (de novo ela) já anunciaram suas missões (não tripuladas) à Lua e o engajamento aos programas americano ou chinês.

Finalmente, em 2025 ou mesmo um pouco depois, a Nasa prevê o pouso de uma nave tripulada por quatro astronautas na Lua. Dois deles, uma mulher e um homem negro, caminharão na superfície lunar. A missão Artemis III terá trinta dias de duração e prevê três caminhadas.

“Juntos, estamos inaugurando uma nova era da exploração para uma nova geração de navegantes das estrelas e sonhadores – a geração Artemis”, disse o administrador da Nasa, Bill Nelson, ao confirmar os planos da agência espacial americana.

O programa espacial chinês também anunciou um pouso na Lua até 2030. Para isso, os cientistas chineses desenvolvemum novo modelo do foguete Long March, uma nova geração de espaçonaves para a viagem e o pouso, além de um robô que poderá rodar sobre a superfície lunar tripulado por astronautas.

Na semana passada, Zhang Hailian, da agência espacial chinesa (CMSA), deu novos detalhes sobre a missão. Serão enviados ao espaço um módulo de pouso na superfície do satélite e uma espaçonave tripulada. Depois, os dois objetos de acoplam e os astronautas entram no módulo de pouso para, enfim, pousar na Lua.

“É um grande movimento, que tem viés político, mas também importância grande na compreensão do Universo, dos momentos mais primevos do Sistema Solar, de quando a Lua foi formada”, afirma a astrônoma Carolina de Assis, do Centro de Ciência e Educação do Rio de Janeiro.

Uma nova casa – vermelha?

Tanto para americanos quanto para chineses, criar uma estação científica na Lua é o primeiro passo para uma viagem a Marte – esta, sim, uma façanha inédita. O planeta vermelho, quando está mais próximo da Terra, está a 54,6 milhões de quilômetros, enquanto a Lua se encontra a meros 384,4 mil quilômetros de distância.

São três dias de viagem para chegarmos ao satélite terrestre. Para Marte, a jornada leva sete meses. Mas há quem sonhe não apenas com a viagem, como também com uma possível colonização do vizinho. Em tempos de aquecimento global, a ideia pode até parecer boa.

Mas, enquanto as temperaturas sobem em ritmo cada vez maior, será que dá tempo de se instalar em Marte antes da catástrofe climática? José Eduardo da Fonseca recomenda melhorarmos como inquilinos. “A vida modificou a Terra e a Terra modificou a vida”, alerta. “Só temos esse lugar para viver.”

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