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Tensão cresce nos EUA após secretário de Justiça de Trump autorizar inquérito sobre supostas fraudes eleitorais

Foto: Reprodução
terça-feira 10 de novembro de 2020 às 15:25h

A vitória de Joe Biden foi confirmada há quatro dias e, até agora, não há sinais de que Donald Trump pretenda reconhecer sua derrota, deixando os Estados Unidos à beira de um impasse.

Segundo o jornal O Globo, a tensão cresceu na noite de segunda-feira (9), após o Departamento de Justiça autorizar inquéritos federais para apurar supostas fraudes eleitorais denunciadas pelo presidente, mesmo sem quaisquer provas de sua existência.

A decisão de William Barr, o secretário de Justiça, gerou repúdio dentro de seu próprio departamento. O diretor do braço responsável por crimes eleitorais, Richard Pulge, pediu demissão e, em um e-mail para colegas, afirmou que a conduta do secretário “revoga uma política de não interferência de 49 anos para investigações de fraudes eleitorais”, que são apuradas primeiro pelos tribunais estaduais.

Enquanto a alta cúpula republicana no Congresso apoia a cruzada jurídica do presidente, outros grupos dentro do partido começam a repudiar a conduta do presidente e de Barr. Quatro ex-secretários de Segurança Nacional dos governos de George W. Bush e Barack Obama assinaram um comunicado afirmando que as eleições foram justas e que as tentativas de Trump de questionar o resultado da eleição não devem impedir a transição.

Em outro comunicado, ex-funcionários do Departamento de Justiça, entre eles o ex-conselheiro de Segurança Nacional de George W. Bush, Ken Wainstein, lembraram que “os eleitores decidem a eleição, não o secretário de Justiça”.

“Não vimos absolutamente quaisquer evidências de nada que possa impedir a certificação dos resultados, que é algo que cabe aos estados, não ao governo federal”, afirmaram. “O povo americano falou claramente, e agora o país precisa se mover em direção a uma transição pacífica de poder.”

Nos próprios escritórios de advocacia que representam Trump, diz o New York Times, há preocupações sobre os riscos do comportamento do presidente. Em duas das maiores firmas do país, a Jones Day e a Porter, Wright, Morris & Arthur, houve reuniões internas sobre o assunto. Ao menos um advogado se demitiu em protesto.

Apoio republicano

Se nos anos 1970, conforme ficava claro que Watergate custaria o mandato de Richard Nixon, uma série de parlamentares e lideranças republicanas foram à Casa Branca afirmar que não apoiariam o presidente, desta vez o cenário é outro na alta cúpula republicana no Congresso. As principais figuras do partido não fazem quaisquer esforços públicos para convencer o presidente a admitir a derrota e espalham a desinformação.

Enquanto reconhecem como legais os resultados na Câmara e no Senado, onde os republicanos tiveram ganhos, questionam a vitória de Biden na disputa pela Presidência. O poderoso líder da maioria republicana no Senado, Mitch McConnell, disse nesta terça que o comportamento do presidente “não é motivo de alarme”:

— Não é incomum, não deveria ser alarmante — ele afirmou, em entrevista coletiva. — Em algum momento, nós saberemos, finalmente, quem foi certificado vencedor em cada um destes estados, o Colégio Eleitoral determinará o vencedor e esta pessoa tomará posse em 20 de janeiro. Não há razão para alarme.

Parte desta retórica deve-se a tentativas de manter a base mobilizada até as eleições especiais na Geórgia, que determinarão qual partido terá a maioria no Senado. Como nenhum candidato obteve mais da metade dos votos, haverá um novo pleito em 5 de janeiro.

Kelly Loeffler e David Perdue, os dois pleiteantes republicanos, vieram a público demandar a saída do secretário de Estado local, o republicano Brad Raffensperger, após ele defender a integridade da eleição. Biden lidera no estado sulista, um antigo reduto republicano, por uma margem pequena de votos — resultado de um esforço do Partido Democrata para registrar mais eleitores negros e diminuir a supressão de votos.

Raras vozes dissonantes dentro da sigla, como o senador Mitt Romney, afirmam que é necessário convencer Trump a recuar, visando a saúde da democracia americana, mas o presidente não dá quaisquer sinais de que pretende mudar de posição. Pelo contrário, a chefe da agência responsável por liberar as verbas para que a transição de governo possa começar oficialmente, Emily Murphy, ainda sequer o fez.

Processos judiciais

Trump já se declarava vencedor antes mesmo do resultado oficial ser anunciado, retórica que só endureceu após a confirmação da vitória de Biden. Ao se recusar a admitir a vitória do adversário, o presidente põe em xeque princípios básicos de uma democracia saudável, argumentou o comentarista político do site Vox, Ezra Klein. Para o jornalista, autor do livro “Por que estamos polarizados?”, Trump tem poucas chances de ter sucesso em seus avanços, mas isto não significa que eles não sejam perigosos.

“Milhões acreditarão em Trump, verão as eleições como roubadas”, ele disse. “É a construção de uma realidade alternativa confusa, em que a eleição foi roubada de Trump e republicanos fracos estão deixando os ladrões escaparem.”

Trump lança mão de uma série de processos judiciais, até o momento mal-sucedidos, tentando convencer tribunais a deslegitimar votos favoráveis a Biden nos estados-chave e pedir recontagens. Em paralelo, seus advogados fazem pressão no sistema Judiciário, onde o presidente realizou uma revolução conservadora nos últimos três anos e meio — nos EUA, juízes federais são nomeados pela Casa Branca.

Eles miram os votos pelo correio, que tiveram adesão maciça entre os democratas neste ano, diante das limitações impostas pela pandemia. Diante do recorde de 65 milhões de votos por esta modalidade, vários estados estenderam o limite para a entrega de votos postados dentro do prazo pré-estabelecido, evitando que atrasos nos correios impedissem sua aferição. São estes os votos que Trump falsamente diz serem “ilegais”.

As cédulas nestas condições, no entanto, seriam insuficientes para reverter a margem de Biden. Em 2016, Trump ganhou os estados de Michigan, Pensilvânia e Wisconsin por um total de 80 mil votos somados. Neste ano, Biden já soma uma vantagem que ultrapassa 214 mil votos nestes estados. Nos outros três estados em que ainda não é possível projetar o vencedor, Biden lidera no Arizona e na Geórgia, e Trump apenas na Carolina do Norte.

2020 não é 2000

Haverá recontagem ao menos em Wisconsin e na Geórgia, onde a margem entre os candidatos é pequena. Grandes mudanças, no entanto, são improváveis: segundo a agência Associated Press, houve ao menos 31 recontagens estaduais desde 2000. Delas, apenas três mudaram o resultado da eleição, todas elas com margens inferiores a 300 votos. Em ambos os estados, a diferença entre os candidatos é superior a 10 mil votos. Na Pensilvânia, os republicanos demandam uma auditoria. Lá, a diferença entre os candidatos é superior a 45 mil votos.

A situação também é diferente da de 2000, quando a disputa acabou sendo decidida só em dezembro. Naquele ano, a vitória no Colégio Eleitoral do republicano George W. Bush ou do democrata Al Gore ficou dependendo do resultado apenas de um estado, a Flórida. Na época,  a Suprema Corte determinou em 12 de dezembro a suspensão da recontagem no estado, onde Bush ganhou por apenas 500 votos, o que lhe garantiu a Presidência com 271 votos no Colégio Eleitoral, contra 266 de Gore. Agora, Biden já tem garantidos 279 votos no Colégio Eleitoral, nove a mais do que os necessários para a vitória.

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