Ao longo dos últimos quatro anos, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) passou de principal dor de cabeça para o presidente Jair Bolsonaro (PL) —por causa do escândalo da rachadinha— para nome central da articulação política do governo e principal arrecadador da campanha de 2022.
Visto como o filho com maior desenvoltura política da família Bolsonaro e o menos radical, o 01 assumiu a postura de interlocutor do pai com a classe política e acumulou poder ao longo do governo, além de ter construído uma sólida rede de relacionamentos com o Judiciário.
Procurado, Flávio Bolsonaro não respondeu à Folha.
Flávio se transformou em problema para o pai após a revelação, pelo jornal O Estado de S.Paulo, das transações suspeitas na conta de Fabricio Queiroz, assessor no seu gabinete da Assembleia Legislativa do Rio e amigo pessoal da família.
A investigação do caso fez uma devassa em sua vida ao longo dos anos de 2019 e 2020 e resultou em uma denúncia, em novembro de 2020, por peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Ele foi acusado de liderar uma organização criminosa para recolher parte do salário de seus funcionários em benefício próprio.
Ainda em 2020, enquanto resolvia suas pendências com a Justiça, Flávio já atuava nos bastidores no apadrinhamento de nomes importantes para cargos no governo e nas tratativas para emplacar indicações em vagas abertas no Judiciário e órgãos de fiscalização.
A aproximação do senador com integrantes do Judiciário e da advocacia foi uma das principais características de Flávio durante o governo do pai.
Advogado por formação, ele chegou a se registrar na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e passou a atuar, tanto oficialmente como informalmente, nos tribunais da capital federal.
Foi com parte desse dinheiro da advocacia que Flávio diz ter adquirido uma mansão por R$ 5,97 milhões em Brasília.
Uma das primeiras aproximações foi com a juíza federal do Tribunal Regional Federal da 1ª Região Maria do Carmo Cardoso, depois apelidada de Tia Carminha pela família presidencial.
Flávio atuou na nomeação para o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) da advogada Lenisa Rodrigues Prado, filha de Maria do Carmo.
Nessa época, Bolsonaro já havia sinalizado que seu indicado para a vaga de Celso de Mello, primeiro ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) a se aposentar em seu governo, seria alguém “terrivelmente evangélico”.
Mas após a atuação da juíza, e com a ajuda de Flávio e de Ciro Nogueira (PL), o nome de Kassio Nunes foi levado pelo 01 ao presidente.
Naquele momento, a situação jurídica de Flávio necessitava de uma definição com o avanço das investigações. Em junho de 2020, Queiroz havia sido preso e, em novembro, denunciado.
Kassio era um conhecido garantista e favorável à tese de foro especial para o senador, que tinha sido investigado na primeira instância na maior parte do tempo. Kassio foi escolhido por Bolsonaro como seu primeiro indicado ao STF.
Em 2021, a situação jurídica de Flávio começou a melhorar. Com os contatos conquistados nas cortes superiores de Brasília, o senador viu uma série de decisões minarem a investigação conduzida pelo Ministério Público do Rio de Janeiro.
Ainda em fevereiro, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) anulou a quebra de sigilo bancário e fiscal contra o senador, apontando problemas de fundamentação na decisão judicial que autorizou as medidas.
O efeito da decisão foi imediato na postura do senador. Como mostrou a Folha, desde então Flávio deixou de atuar apenas nos bastidores e tomou a frente na atuação pelo governo no Congresso durante os problemas políticos do pai causados pela condução errática da pandemia.
O filho 01 do presidente se esforçou para tentar enterrar a CPI da Covid-19 e atuou diretamente para aproximar Rodrigo Pacheco, presidente do Senador, e o então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello.
O senador também atuou fortemente e teve destaque na aprovação da lei que possibilitou a compra das vacinas Pfizer. O projeto foi redigido na residência oficial do Senado e teve atuação conjunta de Pacheco, Flávio e Randolfe Rodrigues (Rede-AP), expoente da oposição a Bolsonaro.
Flávio começou o ano de 2022 sem o peso das investigações contra ele, uma vez que em novembro do ano anterior o STJ anulou todas as decisões tomadas pela primeira instância do Judiciário do Rio em seu caso —o que inviabilizou a denúncia.
Com o caminho livre para atuar, o senador passou a ser o nome do pai nas negociações políticas para a formação da chapa que disputaria as eleições em que Bolsonaro tentou a reeleição.
No fim do ano anterior, o senador já havia participado de toda negociação para ida do pai ao PL, partido presidido por Valdemar Costa Neto.
Em seguida, passou a costurar as alianças para a campanha e a atuar no Congresso para viabilizar a aprovação de projetos de interesse do governo, entre eles os que possibilitaram a expansão do Auxílio Brasil.
Com a chegada do período eleitoral, o senador foi ainda escalado pelo pai como coordenador da campanha e responsável por centralizar a arrecadação nos setores mais próximos do bolsonarismo.