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Bolsonaro desperta amor (secreto) no mercado financeiro

quinta-feira 17 de maio de 2018 às 13:13h

Dava para ouvir os aplausos e risadas de longe, no hall onde os repórteres foram instruídos a ficar. Foram sucessivos rompantes espontâneos ao longo de uma hora e meia.

O palestrante: o pré-candidato à presidência Jair Bolsonaro.

Compareceram ao almoço alguns dos nomes mais importantes do mercado, incluindo profissionais de bancos de investimento, analistas de ações e operadores de câmbio.

As reações a ele lembram o que muitos americanos falavam sobre Donald Trump na disputa pela Casa Branca em 2016.

“Ele diz o que eu penso, mas eu não posso dizer” é uma frase ouvida frequentemente sobre Bolsonaro, vinda de motoristas de táxi ou operadores de câmbio. Isso ajuda a explicar porque Bolsonaro tem alguma vantagem nas pesquisas de intenção de voto, cinco meses antes da eleição.

“Podem ter, sim, pessoas que têm a intenção de votar e escondem isso por algum motivo”, disse Lucas de Aragão, sócio da consultoria política Arko Advice, em Brasília. “Não só no mercado financeiro, mas isso pode existir em qualquer setor.”

O curioso sobre a recepção calorosa a Bolsonaro por investidores é que não se sabe o que a eleição dele significaria para os mercados. Bolsonaro costuma fazer piada sobre sua falta de conhecimento de economia e insiste que deixará as decisões na área fiscal e financeira para seus assessores.

Um deles é Paulo Guedes, economista formado pela Universidade de Chicago que defende a privatização de estatais e a reforma da previdência – duas medidas consideradas essenciais para conter o déficit público e para o País recuperar o grau de investimento após a recessão.

Os investidores adorariam que essas propostas se concretizassem. Mas o próprio Bolsonaro já lançou ideias muito menos ortodoxas, como proibir que empresas chinesas invistam no Brasil e cortar os juros para 2 por cento (um terço da taxa Selic atual).

As mensagens inconsistentes geram certa confusão entre investidores. Ainda assim, eles parecem inclinados a apoiar a candidatura, em parte por acreditarem que ele é capaz de impedir a volta do Partido dos Trabalhadores ao poder, menos de três anos depois do impeachment de Dilma.

Com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na cadeia e fora do páreo, há temores de que o PT possa apoiar outro candidato de esquerda — como Fernando Haddad ou Ciro Gomes – e derrotar Bolsonaro no segundo turno em outubro.

O ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, é bem visto pelos investidores, mas tem poucas intenções de voto.

“O nível de incerteza quanto à trajetória e ao resultado dessa eleição é bem maior do que no passado”, escreveram a estrategista Emy Shayo Cherman e a economista Cassiana Fernandez, do JPMorgan Chase, em relatório a clientes.

“Desta vez, parece que há mais em jogo no que diz respeito às perspectivas para o País do que em ciclos políticos anteriores.” Bolsonaro não quis comentar sobre as percepções dos investidores sobre ele e suas ideias.

Os ativos brasileiros têm sido prejudicados por temores de que o eventual vencedor da eleição não encare as reformas impopulares, porém necessárias para sanar o déficit público.

O quadro fiscal fez com que a dívida brasileira fosse considerada de alto risco pelas agências internacionais de classificação de crédito.

O real é uma das moedas de pior desempenho nos mercados emergentes desde o fim do primeiro trimestre, com desvalorização de 8,8 por cento.

A parcela da dívida pública em moeda local nas mãos de investidores estrangeiros em março estava no menor nível em seis anos de 11,8 por cento, comparado a uma fatia recorde de 21 por cento, em maio de 2015.

Bolsonaro entrou na política pelas Forças Armadas. Nascido e criado em Campinas, no interior paulista, ele entrou no Exército e foi promovido a capitão ao longo de 17 anos de carreira militar.

Ele concorreu a cargo público pela primeira vez em 1988, quando foi eleito vereador do Rio de Janeiro. Dois anos depois, foi eleito deputado federal e nunca mais deixou o cargo.

E apesar de tanto tempo ali, ele só se tornou figura de projeção nacional quando anunciou que concorreria à presidência. O uso agressivo das redes sociais pela equipe dele atraiu muita atenção do público, assim como seus comentários polêmicos.

Alguns comentários também chamaram a atenção do Ministério Público, que acusou Bolsonaro por crimes de racismo e manifestação discriminatória.

A assessoria de imprensa dele afirmou em comunicado que as acusações são “ataques infundados” com o objetivo de “gerar notícias sensacionalistas”, acrescentando que o candidato tem direito e dever de “debater temas polêmicos que afligem o povo brasileiro e seu eleitorado”.

Naquela tarde de fevereiro no BTG, poucos pareciam incomodados. Eles estavam se divertindo demais para isso. Quase sem exceção, os presentes disseram que Bolsonaro foi surpreendentemente razoável e engraçado – um verdadeiro showman.

“Ele foi bom”, disse um participante, “em entreter o público”.

 

 

 

 

Por Aline Oyamada e Julia Leite

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