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segunda-feira 15 de novembro de 2021 às 06:52h

Biocombustíveis, a energia mundial, passado e futuro

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O número de vítimas de queimaduras graves, algumas fatais, aumentou no Brasil. Sem dinheiro para comprar gás de cozinha, cujo preço subiu 30% neste ano, muitas famílias pobres recorrem ao etanol e pessoas se ferem em acidentes domésticos.

Um número maior de brasileiros pobres voltou a usar a lenha, menos explosiva, mas também causadora de acidentes e poluição doméstica prejudicial à saúde. É mais barato no campo, enquanto nas cidades as pessoas queimam tábuas e móveis velhos, nem sempre tão disponíveis como o álcool ou o etanol, que podem ser adquiridos em qualquer posto de gasolina.

Na verdade, os biocombustíveis, como madeira, etanol, biodiesel e biogás, competem com os combustíveis fósseis desde o início do uso industrial do carvão na Inglaterra, no século XVIII. Fatores econômicos e ambientais influenciam a tomada de decisões públicas e privadas com relação à sua produção e uso.

Um compromisso assumido por 103 países na 26ª Conferência das Partes (COP26) sobre Mudanças Climáticas, que está ocorrendo na cidade escocesa de Glasgow durante os primeiros 12 dias de novembro, para reduzir as emissões de metano dos níveis de 2020 em 30 por cento até 2030, pode agora dar um novo impulso aos biocombustíveis.

Substituir petróleo, gás e carvão por outras fontes ajudará a contribuir para esse objetivo.

“No Brasil, a demanda por etanol foi imposta por razões econômicas: preços elevados do petróleo; e energia: o risco de desabastecimento ”, disse Regis Leal, engenheiro aeronáutico e especialista em Desenvolvimento Tecnológico do Laboratório Nacional de Biorenováveis, da estatal .

Etanol nos anos setenta

O etanol é um combustível produzido a partir da cana-de-açúcar, milho ou qualquer vegetal com alto teor de sacarose, utilizado principalmente em veículos automotores. O Brasil é o segundo maior produtor mundial de etanol, depois dos Estados Unidos.

O Programa Nacional do Álcool (Proálcool) foi criado no Brasil em 1975, dois anos após a primeira grande crise do petróleo que mais do que triplicou o preço do barril de petróleo. O Brasil, que na época importava mais de 80% do petróleo bruto que consumia, perdeu o ímpeto de uma economia que havia crescido mais de 10% ao ano entre 1968 e 1973.

Com o álcool ou o etanol em substituição à gasolina ou misturado a ela, o objetivo era reduzir a dependência do petróleo importado, ao mesmo tempo em que intensificava a busca por depósitos de hidrocarbonetos para autossuficiência, que o Brasil só alcançou três décadas depois.

Esta usina de açúcar e destilaria de etanol estão no estado de São Paulo, no sul do Brasil, grande parte de seu território foi transformado em um grande campo de cana-de-açúcar. CRÉDITO: Mario Osava / IPS

Nos Estados Unidos, o uso do etanol começou a ser fomentado na década de 1980, mas por questões ambientais, Leal disse à IPS em entrevista por telefone de Campinas, cidade do interior de São Paulo, próxima ao maior açucareiro do país. e área produtora de etanol.

Em cidades localizadas em grandes altitudes, como Denver, capital do estado do Colorado, no oeste dos EUA, a 1.600 metros acima do nível do mar, níveis mais baixos de oxigênio levam à combustão incompleta de derivados de petróleo e, consequentemente, maior contaminação por monóxido de carbono e danos à saúde, ele explicou.

A mistura de MTBE (éter metil terc-butílico), uma combinação de produtos químicos, adicionou oxigênio, mas por ser um produto altamente tóxico logo foi substituído pelo etanol, feito de milho, no caso dos EUA

Tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, a produção de biocombustíveis também impulsionou ou estabilizou os preços do açúcar e do milho ao absorver o excedente da produção.

Esse é um aspecto mal compreendido por aqueles que condenam a produção de biocombustíveis por aparentemente reduzir a produção de alimentos. É um falso dilema, porque deve ser analisado caso a caso, disse Suani Coelho, coordenadora do Grupo de Pesquisa em Bioenergia (GBio) do Instituto de Energia e Meio Ambiente da Universidade de São Paulo.

“Na Tanzânia, um estudo da FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação ) avaliou a produção de etanol de mandioca. A hipótese parecia duvidosa, até porque o balanço energético da mandioca não é tão bom. Mas na Tanzânia há um excedente da safra que não pode ser exportado. Então, vale a pena aproveitar para fazer etanol ”, disse Coelho, engenheiro químico com doutorado em energia.

No Brasil, onde o etanol é feito quase que exclusivamente da cana-de-açúcar mais produtiva localmente, o milho foi incorporado à indústria em 2017, com uma destilaria em Lucas do Rio Verde, no estado de Mato Grosso, maior produtor de soja, milho e milho do país. algodão.

“O milho é produzido lá como segunda safra, depois da soja, na mesma área, em volume que não é viável para exportação. Portanto, faz sentido usá-lo para o etanol ”, disse à IPS por telefone, de São Paulo.

O etanol gerou uma grande melhoria no ambiente urbano.

No Brasil, já substituiu 46% da gasolina, segundo a associação da indústria da cana-de-açúcar (Unica), com uma produção anual de 35 bilhões de litros. É usado apenas como combustível em veículos motorizados ou como uma mistura de 27% na gasolina.

Os Estados Unidos produzem 50 a 70 por cento a mais que o Brasil, dependendo do ano. Juntos, eles respondem por cerca de 84% da produção mundial, um nível de concentração que impede o livre comércio internacional de etanol.

Biocombustíveis ou eletrificação

Coelho e Leal não concordam com a afirmação de que a eletrificação do transporte tende a dificultar a expansão dos biocombustíveis para outros países e grandes produtores.

Os países em desenvolvimento não têm capacidade de fazer grandes investimentos para construir novas infra-estruturas, como pontos de recarga elétrica para veículos. Além disso, “o Brasil vive uma crise, está aumentando a geração termelétrica a combustível fóssil, tornando a matriz energética mais suja, e não tem outra forma de aumentar a oferta de energia elétrica”, argumentou Coelho.

Leal disse que a demanda por etanol pode crescer muito. “Qualquer aumento em sua mistura nos Estados Unidos, que responde por metade do consumo mundial de gasolina, terá um impacto enorme”, disse ele.

O especialista em etanol também questiona as vantagens ambientais e climáticas dos veículos elétricos, levando em consideração todo o ciclo de produção, transporte, baterias, emprego e outros aspectos.

Vista de uma vasta plantação de dendezeiros em Tailandia, município do estado do Pará, na floresta amazônica oriental do Brasil. A intenção de transformar o óleo de palma em biodiesel não deu certo, porque o óleo atende a um mercado mais atraente nas indústrias alimentícia e química. CRÉDITO: Mario Osava / IPS

O biodiesel não teve tanto sucesso quanto o etanol, mas também melhorou o ambiente urbano e tem futuro, com algum esforço adicional.

É produzido a partir de óleos vegetais ou animais, mesmo usados, e outros materiais graxos.

Seu principal problema é que ele é mais caro e, portanto, não pode competir com o óleo diesel para substituí-lo, destacou Leal. Atualmente, a mistura de diesel foi reduzida de 12 para 10 por cento, para não aumentar ainda mais o custo do combustível diesel, cujo preço está aumentando em todo o mundo.

Outro biocombustível, que existe há muito tempo, mas agora está em expansão, é o biogás.

Não só é limpo, mas na verdade ajuda a reduzir a poluição, já que é o gás gerado a partir do lixo, águas residuais, resíduos agrícolas e excrementos animais, que não é mais lançado no ar, reduzindo os gases de efeito estufa que causam o aquecimento global.

Seu uso é incipiente no Brasil, mas tem potencial para substituir 70% do óleo diesel consumido no país, a um custo menor, segundo a Associação Brasileira de Biogás. E as grandes cidades e o enorme setor agrícola do país oferecem muitas matérias-primas.

Por meio de um simples processo de refino, o biogás é convertido em biometano, equivalente ao gás natural e, portanto, um combustível que pode até mesmo ser utilizado para movimentar veículos pesados. Se for utilizado para geração de eletricidade, poderá atender 36% da demanda nacional, estima a associação de empresas do setor.

Os pequenos biodigestores produzem biogás que pode impedir o uso de lenha e etanol, e os acidentes e poluição decorrentes, entre as famílias pobres, especialmente no campo, observou Coelho.

“Políticas públicas adequadas e empréstimos a juros baixos para investimentos” poderiam impulsionar o biogás e seus benefícios ambientais, em um momento em que as instituições financeiras internacionais estão cortando o financiamento para usinas movidas a carvão e outras usinas de combustível fóssil, disse Leal.

Os dois especialistas destacaram que todos esses biocombustíveis desempenham um papel importante para tornar o hidrogênio verde, produzido a partir de fontes de energia renováveis, viável e reconhecido como fundamental para o futuro energético mundial.

Os biocombustíveis têm servido à humanidade desde o seu passado, nem sempre de forma sustentável. O primeiro foi a lenha, da qual ainda dependem 2,8 bilhões de pessoas no mundo, de acordo com um relatório de outubro de 2020 do Banco Mundial. Mas é prejudicial ao meio ambiente e leva ao desmatamento e à poluição doméstica.

Os óleos e resinas que iluminaram cidades e casas nos séculos passados, antes do advento da eletricidade, também eram destrutivos. Óleos extraídos da gordura de baleia e dos ovos de tartarugas amazônicas são exemplos, quase levando algumas espécies à extinção.

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