Quem recebe o Auxílio Brasil perde o direito se começar a trabalhar com carteira assinada? O presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou em propaganda partidária do PL que a pessoa continua recebendo o benefício. Essa é uma verdade em parte. O benefício continua por dois anos, mas não indefinidamente. E também depende do salário que o trabalhador recebe.
Bolsonaro ainda deu a entender que o antigo Bolsa Família impedia os beneficiários de ingressarem no mercado de trabalho sob o risco de perderem o pagamento mensal. Também é parcialmente verdade. A regra é similar à do Auxílio Brasil. A pessoa também podia ficar dois anos no programa após conseguir o emprego.
No vídeo da propaganda, uma mulher que não tem o nome revelado diz que “muita gente deixou de arrumar um emprego justamente para não perder o Bolsa Família”.
Outra mulher, cuja identidade também não é revelada, afirma que a “irmã perdeu [o Bolsa Família] porque comprou uma geladeira”, ao que Bolsonaro responde: “Era para te manter escravizada”.
Critérios de permanência para trabalhadores são parecidos
Especialistas ouvidos pelo UOL declaram que a insinuação de Bolsonaro é falsa. Os beneficiários do Auxílio Brasil, bem como os do extinto Bolsa Família, podem receber o benefício por um período de até dois anos desde que a renda familiar por indivíduo não seja maior do que os critérios adotados em cada um dos programas.
No caso do Auxílio Brasil, a regra de emancipação dá aos beneficiários a possibilidade de permanecerem no programa desde que a renda familiar mensal por pessoa não supere R$ 525 — duas vezes e meia o valor que limita a linha da pobreza (R$ 210). Essa possibilidade é válida tanto para contratados com carteira assinada quanto para autônomos.
Por exemplo, se o chefe de uma família de quatro pessoas, consegue um trabalho com salário mínimo (R$ 1.212), a renda média da família por pessoa será de R$ 303 (R$ 1.212 dividido por 4). Está abaixo de R$ 525 e, portanto, a família pode ficar por dois ainda recebendo o Auxílio Brasil.
No Bolsa Família, a chamada regra de permanência permitia aos usuários o recebimento dos valores por até dois anos desde que a renda por pessoa de uma família não ultrapassasse meio salário mínimo — R$ 606 em 2022. Isso também abarcava emprego formal e aumento de renda como autônomo.
Leticia Bartholo, especialista em políticas públicas e ex-secretária nacional adjunta de Renda de Cidadania, afirma que os critérios são parecidos para ambos. “Quem tem aumento de renda no trabalho pode ficar até dois anos recebendo o pagamento, independentemente do programa. O Bolsa Família nunca excluiu as pessoas do mercado formal, é uma pura inverdade”, declara.
Atualmente, o Auxílio Brasil atinge mais de 18 milhões de famílias, com pagamento médio de R$ 409,51, de acordo com o Ministério da Cidadania, responsável por coordenar o programa.
Especialista critica propaganda
Denise de Sordi, pesquisadora dos programas de pós-doutorado da Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz e do departamento de sociologia da FFLCH-USP (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo), critica a abordagem da propaganda do PL.
“Ao dizer que o Bolsa Família mantinha os beneficiários escravizados, Bolsonaro quer desmoralizar o programa.”
Procurado pela reportagem, o PL não se manifestou até a publicação desta matéria. O Ministério da Cidadania também foi questionado sobre quantos beneficiários estão na transição de aumento de renda por emprego, mas não se pronunciou.