A União Europeia fez um aceno ao presidente Lula de que está disposta a ceder para chegar a um acordo comercial com o Mercosul ainda neste ano. O embaixador do bloco europeu no Brasil, Ignacio Ybáñez, avalia que seria ruim para os dois lados jogar fora mais de duas décadas de negociações. “Seria muito ruim tanto para a União Europeia como para o Mercosul, sobretudo para o Brasil. Seria uma pena não chegar a um acordo”, avaliou em entrevista à Coluna Estadão.
O presidente Lula está na presidência temporária do Mercosul e quer aproveitar as discussões do aditivo de ações de sustentabilidade – previsto a partir do acordo de 2019 e apresentado em março deste ano – para incluir outras renegociações, como as regras que definem as relações dos Estados dos dois blocos com compras públicas dos países.
A inclusão das compras governamentais no acordo UE-Mercosul é um ponto criticado por Lula. Ybáñez garante, no entanto, que isso não será empecilho para o avanço do acordo.
“Nós vamos ser flexíveis. Para nós, o acordo é muito mais importante do que as compras públicas, que pequenos detalhes que podem se fechar ao final da negociação. O acordo é uma aposta mirando para o futuro e pensamos que as duas partes ganham. Se não ganhamos em tudo, já buscaremos uma certa compensação olhando pra frente”, afirmou.
Os países do Mercosul querem garantir que as compras governamentais poderão ser usadas para mais políticas públicas locais. Pelo acordo negociado em 2019, as empresas dos dois blocos econômicos podem participar de licitações em condições de igualdade com as firmas locais. Porém, são incluídas algumas exceções, como aquisição de produtos da lista do SUS e para programas de segurança alimentar.
O embaixador da União Europeia considera legítimo o presidente Lula, que tomou posse este ano, tanto no Brasil como na presidência pro tempore do Mercosul, reavaliar os termos que foram assinados por outros presidentes. Ybáñez lembra que a única parte que havia ficado pendente para discussão, após 2019, era referente às exigências ambientais, mas reforça que o surgimento do debate sobre as compras públicas não fecha a porta.
“Se chegam propostas no âmbito das compras públicas é uma coisa que não estava pensada na declaração de 2020. Isso não quer dizer que não vamos aceitar, pois não sabemos o que vão pedir. Pode ser que as coisas que os países do Mercosul peçam sejam boas e possamos aceitar”, concluiu.
Quando o governo brasileiro recebeu da União Europeia, neste ano, exigências adicionais na área ambiental para finalizar o acordo de livre comércio com o Mercosul, o presidente Lula reagiu. Considerou uma ameaça, por exemplo, um trecho que proíbe que a Europa importe produtos de áreas desmatadas, e reclamou de os termos serem colocados agora.
O embaixador europeu negou que haja a possibilidade de sanções e explicou que o aditivo só foi apresentado neste ano porque não havia ambiente durante o governo Jair Bolsonaro para avançar nessa pauta.
“Em 2019, os dados sobre desmatamento foram fora da curva e o Brasil ficaria fora dos compromissos do Acordo de Paris. Depois, avaliamos positivamente a mudança de discurso com a troca dos ex-ministros Ricardo Salles (Meio Ambiente) e Ernesto Araújo (Relações Internacionais). Mas, a prática não mudou”, relembrou.
Ybáñez diz que agora é diferente. O governo Lula põe a questão ambiental no centro da pauta e entregou o Ministério do Meio Ambiente a Marina Silva, reconhecida internacionalmente pelos seus esforços para reduzir drasticamente o desmatamento.
“Não é verdade que estivemos esperando a chegada do presidente Lula e apresentamos a ele documento que era pensado para o governo anterior. O documento é para o futuro, porque o acordo vai pra frente”, concluiu.