No começo do mês, o Supremo Tribunal Federal (STF) validou dispositivos da Lei da Reforma Agrária que permitem a desapropriação de terras produtivas, caso elas não cumpram sua função social, registra Lucas Almeida, do Uol. Alvos de desinformação, os termos não carregam o mesmo significado e têm suas diferenças previstas na lei.
Entenda o que difere os conceitos e o que cada um implica na decisão da Corte.
Apesar de ambos os termos tratarem sobre o uso da terra, eles expressam conceitos diferentes.
De acordo com o art. 186 da Constituição Federal, uma propriedade rural cumpre sua função social quando atende aos seguintes requisitos:
I – aproveitamento racional e adequado;
II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;
III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores
Já a terra produtiva, segundo o advogado e professor de Direito Vinícius Souza Barquette, especialista em direito do Agronegócio, é aquela que traz resultado financeiro, em produtos ou commodities, seja com agricultura, pecuária ou outras formas de aproveitamento da propriedade.
Dessa forma, uma terra produtiva pode ou não cumprir sua função social.
Na prática, qual é a diferença?
De acordo com Barquette, uma terra improdutiva por si só já não cumpre sua função social, pois se encontra parada.
Já a terra produtiva, a princípio, estaria cumprindo, uma vez que, a partir dessa produção, há a geração de empregos e a contribuição tributária.
No entanto, o advogado explica que a terra produtiva deixa de cumprir sua função social quando desrespeita as leis trabalhistas, fiscais e ambientais.
Alguns exemplos de descumprimentos dessas legislações são o uso de mão de obra em situação análoga à escravidão, invasão de terras indígenas, invasão de área de proteção ambiental, sonegação de impostos, entre outros.
“Ela produz, mas não cumpre as funções sociais de qualquer terra, de qualquer produção”, sintetiza Barquette.
Decisão do STF
A decisão do Supremo que permitiu a desapropriação de terras produtivas foca justamente nessas propriedades que, apesar de terem uma produção reconhecida, falham em cumprir sua função social.
De acordo com o ministro Edson Fachin, relator da ação movida pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA), é “pelo uso, socialmente adequado, que a propriedade é legitimada”.
Em seu voto, que foi seguido pelos outros ministros da Corte, o magistrado reforça que a própria Constituição “exige, de forma inequívoca, o cumprimento da função social da propriedade produtiva como requisito simultâneo para a sua inexpropriabilidade”. O entendimento foi acompanhado por Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Rosa Weber, Luiz Fux, Luís Roberto Barroso, Cristiano Zanin, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, André Mendonça e Nunes Marques.
Barquette explica que o veredicto do STF tem apenas um caráter confirmatório. “Nenhuma decisão do STF muda a lei em si. Ela vai indicar que tal interpretação é inconstitucional. Mas a lei continuaria lá, vigente. Nesse caso, ela mantém o teor da lei, como está. Continua o artigo 186 da Constituição como norteador”.
Para o advogado, a decisão deve ser aplicada individualmente. “Como toda Ação Direta de Inconstitucionalidade, ela não pode ser tomada genericamente. O caso em si precisa ser analisado”, defende.