Uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) analisou as principais campanhas de publicidade da Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência da República dos últimos seis anos e identificou falhas no planejamento que revelam ausências de critérios e de objetividade nas ações. Em síntese, as propostas para divulgar as ações do governo são superficiais, não há parâmetros para definir os valores das campanhas, nem é possível medir os resultados alcançados.
A equipe técnica do tribunal de contas também apontou falta de transparência ativa por parte da Secom na publicização dos gastos e de documentos das campanhas.
A auditoria analisou materiais das cinco campanhas mais caras de cada um dos últimos três governos, o que incluiu ações sobre o Programa Nacional de Imunização, o combate a desinformação e o novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). No total, foram 15 campanhas das gestões Michel Temer (MDB), Jair Bolsonaro (PL) e Lula da Silva (PT) que, juntas, somam R$ 542,8 milhões. A falta de critérios e parâmetros foi encontrada em todos os casos, independentemente do governo.
Procurada, a Secom destacou que preza pelo cumprimento das legislações e pela eficiência de suas ações. O órgão acrescentou que segue acompanhando as discussões sobre o assunto no TCU. O relatório, obtido pelo Estadão, ainda não foi analisado pelo plenário do tribunal.
O volume de gastos realizados pela Secom com campanhas publicitárias apresenta uma tendência de alta ano após ano. Só em 2023, foram destinados R$ 379 milhões para a divulgação de ações do governo federal. O volume de recursos chamou a atenção dos técnicos do tribunal frente à falta de métricas da Secretaria. “Esta equipe de auditoria não pode afirmar se os gastos das campanhas publicitárias desenvolvidas pela Secom estão ou não adequados, tendo em vista a ausência de indicadores para medir os resultados das campanhas, o planejamento deficiente e a análise superficial das propostas de planos de mídia”, afirmaram.
A título de exemplo, não foram encontradas estimativas realizadas pela Secom que pudessem verificar o orçamento adequado de uma campanha publicitária.
“Não há, por parte do órgão público, detalhamento do cálculo realizado para se chegar a tal valor, nem qualquer indicação de relação entre a verba prevista e os objetivos de comunicação da campanha”, diz o relatório. “Essa falta de parâmetros leva à percepção de que o orçamento é estimado com base em entendimento subjetivo dos profissionais da Secom, baseado no nível de importância de cada campanha para o governo federal”, acrescentou.
Também foi evidenciada pela equipe técnica a ausência de indicadores para mensurar se os objetivos da ação publicitária foram atingidos. Dessa maneira, não é possível saber se uma ação que custou R$ 10 milhões poderia ter custado R$ 8 milhões ou R$ 6 milhões.
“A ausência de indicadores aptos a medir os resultados das campanhas gera duas consequências principais, ambas opostas a preceitos basilares da administração pública: a primeira, que se contrapõe ao princípio da eficiência, é o fato de que não há como saber se o orçamento destinado a uma ação publicitária foi insuficiente, ideal ou excessivo; a segunda, afronta direta ao princípio da motivação, reside no fato de o gestor público ter liberdade para gastar centenas de milhões de reais com base em justificativas demasiadamente genéricas, denotando grau de discricionariedade excessivo”, destacou.
As campanhas analisadas pelo TCU foram realizadas pela Secom em parceria com cinco agências: Calia, NBS, Artplan, Nacional e Propeg. A verba é definida pela Secretaria e integra o briefing encaminhado às agências para criação e apresentação de propostas de campanha.
Em nota, a Calia informou que cumpre todas as determinações constantes das instruções normativas que orientam a realização dos serviços prestados à Secom, “apresentando soluções de comunicação baseadas na melhor técnica e economicidade para que informações de qualidade cheguem à população brasileira”. A Nacional explicou que todos os seus trabalhos seguem estritamente as regras definidas em contrato e diretrizes do órgão, e assim continuará fazendo. A Propeg, por sua vez, apontou que o contrato data de maio de 2022 e que “realiza suas campanhas em consonância com todo o arcabouço normativo publicitário, estando em conformidade com a legislação e as instruções normativas dispostas pela Secom”. As outras empresas não responderam.
A Secom, por sua vez, destacou que executa as atividades em observância ao que disciplinam as legislações pertinentes e que preza pelo cumprimento legal e a eficiência de suas ações. “Importante esclarecer que o procedimento TC 032.845/2023-5 ainda não foi concluído. Seguimos acompanhando e colaborando com as discussões em torno do assunto.”
De acordo com o decreto 6.555/2008, a realização de uma campanha publicitária, bem como o dimensionamento do investimento, tem como base atributos como: relevância da temática, prioridades da ação governamental, alcance e impacto da mensagem, oportunidade de comunicação, mobilização social para acesso a direitos, manutenção da ordem democrático-institucional, transparência e estímulo social ao controle, entre outros.
“Com relação à avaliação dos resultados das ações de comunicação, as pesquisas de audiência são a ferramenta utilizada para indicar a eficácia e o alcance das campanhas publicitárias. No entanto, nos casos dos veículos que não possuem essa métrica, recorre-se às fontes de informação disponíveis, como dados demográficos e pesquisas de mercado”, acrescentou a Secom.