Com dois ministros impedidos em razão da atuação de seus filhos e uma plateia de políticos atrás do plenário, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou, nesta quarta-feira (19) conforme Luiz Vassallo e Gustavo Queiroz, do Estadão, uma disputa bilionária de municípios por royalties da exploração de petróleo. Por unanimidade, os ministros mantiveram a suspensão de uma decisão judicial que havia obrigado a Agência Nacional de Petróleo (ANP), responsável pela partilha, a enquadrar os municípios de São Gonçalo, Magé e Guapimirim como beneficiários dos royalties.
A decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região fazia com que Rio de Janeiro e Niterói deixassem de receber R$ 1 bilhão destinados a estas cidades originalmente pela agência reguladora. O dinheiro era redirecionado ao caixa das três cidades que travam a disputa judicial.
Por unanimidade, os ministros acompanharam um sucinto voto da presidente do STJ, Maria Thereza de Assis Moura. Segundo ela, a decisão “impôs, ao município de Niterói e ao município de Rio de Janeiro, perda financeira relevante capaz de comprometer todo o planejamento orçamentário dos entes publicos”. “Assim, restou demonstrado nos autos concretamente a grave lesão à ordem e à economia pública”.
Impedimentos para julgar
No início do julgamento, a presidente da Corte registrou que dois ministros, Luis Felipe Salomão e Francisco Falcão, estavam impedidos de julgar a demanda. Os advogados Luis Felipe Salomão Filho e Djaci Falcão Neto, filhos dos ministros, atuam na defesa de municípios que haviam sido beneficiados pela decisão que foi cassada hoje pelo STJ.
O filho de Salomão representou os municípios apenas em recursos aos Tribunais, em questões de direito processual. Já Djaci defende Magé, Guapimirim e São Gonçalo desde o primeiro grau. Ele é do quadro jurídico da Nupec, uma entidade sem fins lucrativos que firmou contratos com mais de 15 municípios e pode receber mais de R$ 300 milhões em honorários advocatícios em ações relativas a royalties do petróleo.
Como mostrou o Estadão, a entidade, que também conta com o genro do ministro Luiz Fux, Hercílio Binato, e o advogado Vinicius Peixoto – que foi alvo da Lava Jato do Rio de Janeiro no passado, mas obteve a anulação da denúncia em razão da competência das varas eleitorais para julgá-la -, firma contratos sem licitação com os municípios e está na mira do Ministério Público e do TCE do Rio. A Corte de Contas chegou a determinar a suspensão de pagamentos à entidade em outros casos. A entidadea sempre ressaltou que os contratos são vantajosos aos municípios.
Julgamento durou cinco minutos
Durante o julgamento, que durou apenas cinco minutos, não houve sustentações orais. Mas a sessão foi acompanhada por uma plateia de políticos interessados no fundo do plenário. O deputado Altineu Côrtes (PL), que tem base em São Gonçalo e defende abertamente o município nesta disputa, se fez presente. Procurado, ele não se manifestou.
Côrtes chegou a receber agradecimentos públicos por seu empenho na guerra dos royalties em uma live do prefeito da cidade, o bolsonarista Capitão Nelson (PL). Durante a campanha eleitoral de 2022, Capitão Nelson disse, em um palanque ao lado de Bolsonaro, que os municípios em disputa pelos royalties são “bando de fdp”, o que provocou forte reação de políticos do Rio e do próprio prefeito Eduardo Paes (PSD).
O prefeito de Niterói, Axel Grael (PDT), que estava do outro lado da disputa, também esteve no STJ. Ele se disse feliz com o resultado. “Niterói tem sido referência no uso dos recursos dos royalties do petróleo.
Nunca podemos nos esquecer de exemplos mal-sucedidos do uso desses recursos que são finitos para gastos de custeio. A chamada Doença Holandesa não pegou Niterói. Temos revertido parte dos recursos para a poupança dos royalties e outra parte para investimentos estruturantes para o desenvolvimento da nossa cidade”, disse ao Estadão.