O fornecimento de eletricidade está se tornando o mais novo obstáculo ao crescimento da Inteligência Artificial (IA), segundo os principais líderes do setor de tecnologia, uma vez que centros de dados famintos por energia aumentam a pressão sobre as redes de distribuição de energia do mundo todo.
O bilionário Elon Musk disse este mês que, embora o desenvolvimento da IA tenha sido “restringido pelos chips” no ano passado, o mais novo gargalo à tecnologia de ponta é o “fornecimento de eletricidade”.
Antes disso, neste ano, Andy Jassy, presidente da Amazon, já havia dito que “não há energia suficiente no momento” para alimentar os novos serviços de IA generativa.
Amazon, Microsoft e Alphabet, a controladora da Google, estão investindo bilhões de dólares em infraestrutura de computação à medida que tentam desenvolver suas capacidades de IA, inclusive em centros de dados que geralmente levam vários anos para serem planejados e construídos.
Limitações de capacidade
Mas alguns dos lugares mais procurados para a construção de instalação, como o norte do estado da Virgínia, estão enfrentando limitações de capacidade ,que, por sua vez, estão alimentando uma procura por locais adequados em mercados globais de centros de dados em crescimento.
“A demanda por centros de dados sempre existiu, mas nunca foi assim”, diz Pankaj Sharma, vice-presidente-executivo da divisão de centro de dados da Schneider Electric. No momento, “provavelmente não temos capacidade suficiente disponível” para operar todas as instalações que serão exigidas globalmente até 2030, diz Sharma, cuja unidade está trabalhando com a fabricante de chips Nvidia para projetar centros otimizados para cargas de trabalho de IA.
“Uma das limitações do emprego de chips na nova economia da IA será… onde vamos construir centros de dados e como obteremos energia”, afirma Daniel Golding, diretor de tecnologia da Appleby Strategy Group e ex-executivo de centro de dados da Google. “Em algum momento, a realidade da rede de energia irá atrapalhar a IA.”
Impacto ambiental
O problema do fornecimento de energia também vem alimentando preocupações com o impacto ambiental do mais recente boom tecnológico. Países do mundo todo precisam cumprir os compromissos de energias renováveis e eletrificar setores como o de transporte, em resposta à aceleração das mudanças climáticas. Para apoiar essas mudanças, muitas nações precisarão reformar suas redes de eletricidade, segundo analistas.
As exigências sobre as redes de energia são o principal ponto para a Amazon, segundo afirma Kara Hurst, diretora de sustentabilidade, acrescentando que está “conversando regularmente” com autoridades dos EUA sobre a questão.
Os centros de dados – prédios industriais que muitas vezes ocupam grandes áreas de terra e que abrigam os componentes físicos que sustentam os sistemas de computação, como cabos, chips e servidores – são parte da espinha dorsal da computação.
O grupo de pesquisas Dgtl Infra estima que os gastos de capital globais com centros de dados ultrapassarão US$ 225 bilhões em 2024.
US$ 1 trilhão em centros de dados
Jensen Huang, presidente-executivo da Nvidia, disse neste ano que centros de dados no valor de US$ 1 trilhão terão de ser construídos nos próximos anos para dar suporte à IA generativa, que exige muita energia e envolve o processamento de volumes enormes de informações.
Esse crescimento exigirá quantidades enormes de eletricidade, mesmo que os sistemas se tornem mais eficientes. Segundo a Agência Internacional de Energia (AIE), a eletricidade consumida pelos centros de dados no mundo vai mais que dobrar até 2026, para mais de 1.000 terawatt/hora, uma quantia mais ou menos equivalente à que o Japão consome anualmente.
“Regulamentações atualizadas e melhorias tecnológicas, inclusive em termos de eficiência, serão fundamentais para moderar o aumento do consumo de energia dos centros de dados”, disse a AIE este ano.
A expectativa é de que o consumo de eletricidade pelos centros de dados nos EUA cresça de 4% para 6% da demanda total até 2026, enquanto a indústria da IA deverá crescer “exponencialmente” e consumir pelo menos 10 vezes a sua demanda de 2023 até 2026, segundo a AIE.
Antes mesmo do boom da IA generativa, alguns grandes mercados estavam lutando para acompanhar a demanda. Pode levar anos para novos projetos de energia renovável, como parques eólicos, obterem aprovação reguladora e serem conectados à rede de distribuição de energia. Há também uma necessidade em alguns lugares de construir novas linhas de transmissão, que conduzem eletricidade de um ponto a outro.
No norte do estado da Virgínia, o maior entroncamento de centros de dados do mundo, a distribuidora de energia Dominion Energy interrompeu novas conexões com centros de dados em 2022, para analisar como lidar com o salto na demanda, atualizando inclusive partes de sua rede.
Em outubro, a companhia disse em documentos encaminhados às autoridades reguladoras da Virgínia, que estava registrando “um crescimento significativo da carga, devido ao desenvolvimento de centros de dados” e que a demanda crescente por energia representa um “desafio”.
Irlanda e a Holanda tentam limitar centros de dados
Em resposta à demanda, autoridades de jurisdições como a Irlanda e Holanda vêm tentando limitar o desenvolvimento de centros de dados, enquanto Cingapura, recentemente, suspendeu uma moratória.
Os desenvolvedores estão tentando construir instalações em áreas em crescimento como os estados de Ohio e Texas, nos EUA, regiões da Itália e leste da Europa, além de Malásia e Índia, segundo analistas.
Interesse em energia nuclear e geração local
Encontrar locais apropriados pode ser um desafio, com a energia sendo apenas um fator a ser considerado entre outros, como a disponibilidade de grandes volumes de água para resfriar os centros de dados.
“Para cada 50 locais que analiso, talvez dois cheguem ao ponto em que podem ser desenvolvidos”, diz Golding, da Appleby Strategy. “Os caras estão vasculhando um grande número de propriedades.”
As preocupações despertaram o interesse entre os desenvolvedores de centros de dados em opções como a energia nuclear e a geração de energia no local. Para isso, a Microsoft contratou este ano um diretor de “aceleração de desenvolvimento nuclear”.