Os desastres naturais com chuvas custaram ao país ao menos R$ 149 bilhões entre 2014 e 2023, alta de 41% em relação aos R$ 104 bilhões da década anterior, revelam dados coletados pelo portal Uol no Atlas Digital de Desastres no Brasil, do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR).
O que aconteceu
O Atlas reúne os dados de catástrofes fornecidos por estados e municípios. Para descobrir o impacto financeiro de desastres com as mesmas características da tragédia no Rio Grande do Sul, o UOL coletou apenas os estragos provocados por chuvas intensas, alagamentos, enxurradas, inundações, vendavais/ciclones e ondas de frio.
O custo se refere à soma dos danos e prejuízos causados por esses desastres. O ministério explica a diferença:
- Danos: bens materiais e infraestrutura destruídos pelas intempéries, como casas, pontes, ruas, escolas, hospitais e locais públicos
- Prejuízos: estão ligados a serviços de água, luz, transporte, telefonia e outros
Na primeira década analisada, os danos superam os prejuízos, enquanto a lógica se inverte nos últimos dez anos. Os danos somaram R$ 59,5 bilhões entre 2004 e 2013, valor que caiu para R$ 43,3 bilhões entre 2014 e 2023 (-27,2%).
Já os prejuízos dispararam. Passaram de R$ 45,3 bilhões para R$ 105,5 bilhões de uma década para outra, alta de 133%. Se os valores forem somados, prejuízos e danos causaram um rombo de R$ 253,6 bilhões aos cofres públicos apenas nos últimos 20 anos.
As cifras refletem o aumento na frequência desse tipo de desastre no Brasil. As ocorrências semelhantes às do Rio Grande do Sul passaram de 10.456 para 14.161 de uma década para outra, alta de 35%. Embora o número de mortes tenha caído (de 2.162 para 1.333), os afetados passaram de 39 milhões para 61 milhões de pessoas, ou 100 milhões de brasileiros prejudicados em 20 anos.
‘Esse custo foi maior’
As cifras mostram apenas parte do impacto. “Quanto uma tragédia vai impactar no apetite de quem investe nessas regiões?”, questiona Marcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima. “O dono da padaria, da loja, da creche vai reconstruir seu negócio ou pensar duas vezes antes de investir seu dinheiro e passar por isso de novo?”
Gestores públicos não sabem lidar com tragédias, diz Astrini. Ele explica que existem três níveis de atuação governamental:
- Investir para “atacar a origem do problema”. Inclui acabar com desmatamentos no Cerrado e na Amazônia e substituir os combustíveis fósseis. “São essas as razões das mudanças climáticas”, diz.
- Adaptação. Se o primeiro nível não foi feito, é preciso restaurar a mata ciliar e recompor áreas aterradas, por exemplo, “para minimizar os impactos”.
- Gastar dinheiro depois do desastre.
O dinheiro colocado no primeiro nível economiza no segundo, porque investir em adaptação é mais caro do que reduzir as emissões. Se nada for feito, será preciso lidar com a tragédia, e obviamente é mais caro reconstruir uma cidade.Marcio Astrini, do Observatório do Clima
Apesar disso, o poder público gasta quase o triplo com os impactos de desastres do que com prevenção. A União repassou R$ 11,1 bilhões nos últimos dez anos para gerir as crises causadas por desastres naturais, contra R$ 4 bilhões desembolsados no mesmo período para prevenir essas mesmas tragédias.
A falta de prevenção adequada se deve a “diversos fatores”, diz o governo. “Fatores políticos, econômicos e culturais que perpassam tanto o poder público nas três esferas quanto a sociedade”, diz em nota o MDR. A pasta afirma que há cinco anos tem um plano “que busca capacitar os agentes locais” e a sociedade para gerir e reduzir desastres.
“Congresso é arma viva contra o meio ambiente”
Astrini pede atenção ao Congresso Nacional. “O Parlamento é uma arma viva contra o meio ambiente. Se tem um lugar em que se planta seca e tempestade é nos gabinetes do Congresso”, afirma. “Lá fica toda a engenharia de desmonte. Eles aprovam diversos projetos para acabar com área de proteção e afrouxar as leis ambientais.”
Nem o Congresso nem o Executivo regulamentam o Funcap, por exemplo. O Fundo Nacional para Calamidades Públicas, Proteção e Defesa Civil existe desde 2012, mas até hoje nunca foi usado, embora bastasse um decreto presidencial ou legislativo para isso.
Procuradas, as presidências da Câmara e do Senado não responderam até a publicação desta reportagem.
Parece que a missão do Congresso é piorar o que é ruim na área ambiental. Parece que trabalham para beneficiar o crime ambiental.
Marcio Astrini, do Observatório do Clima