Após críticas de empresários da Zona Franca de Manaus, receosos em perder o benefício concedido para a região, a proposta de reforma tributária sobre o consumo venceu as resistências iniciais dos investidores que atuam no polo industrial.
O texto já foi aprovado pela Câmara dos Deputados, mas ainda precisa passar pelo Senado Federal e por uma nova rodada de votação pelos deputados para ter validade.
▶️Criada em 1967 e com validade assegurada até 2073, Zona Franca concede benefícios fiscais para indústrias instaladas na região, com o objetivo de fomentar empregos e gerar renda na Amazônia.
▶️Só para este ano, a renúncia de impostos federais para a Zona Franca e áreas de livre comércio deve passar de R$ 35 bilhões.
▶️Levantamento da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), feito em dezembro de 2021, aponta que são 100 mil postos de trabalho entre efetivos, temporários e terceirizados. Representantes do setor industrial da região dizem que os empregos diretos e indiretos somam 500 mil.
Entenda o debate
Na reforma tributária, o Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI), o PIS e a Cofins federais, além do ICMS estadual e ISS municipal, são trocados por um IVA federal (CBS) e por outro IVA estadual (IBS), além de um imposto seletivo.
Um dos principais pontos questionados anteriormente pelos empresários da Zona Franca de Manaus é que a reforma tributária propõe extinguir o Imposto Sobre Produto Industrializado (IPI) — instrumento por meio do qual é concedido atualmente o benefício fiscal às empresas lá instaladas.
Isso ocorre porque os itens produzidos na ZFM não pagam o IPI. Mas os mesmos produtos, fabricados em outras regiões, pagam. Com isso, há vantagem competitiva para Zona Franca.
Com o fim do IPI, havia o temor que essa vantagem competitiva terminasse gerando desemprego. Desde o começo das negociações, o Legislativo e o governo federal asseguraram que isso não aconteceria. Entretanto, havia uma negociação sobre o formato que seria adotado para manter o benefício.
De acordo com Bernard Appy, secretário extraordinário para a mudança no sistema de tributos do Ministério da Fazenda, a PEC aprovada pela Câmara dos Deputados diz que os novos tributos, o IVA federal, o IVA federal e o imposto seletivo, vão ser calibrados para manter o chamado “diferencial competitivo” da região.
Isso quer dizer que os itens produzidos fora da Zona Franca manterão a diferença de alíquotas que existe atualmente em relação aos produtos fabricados em outras regiões — o que faz com que os itens lá produzidos sejam mais baratos. A forma como isso será feito, porém, será discutida somente em lei complementar, após a aprovação da PEC da reforma tributária pelo Legislativo.
“A lógica é manter o diferencial competitivo, não necessariamente a alíquota total que incide não só para a Zona Franca, mas todos os produtos no Brasil. Isso está sendo afetado pela reforma”, declarou Appy ao g1 e à TV Globo.
Pacificação
Luiz Augusto Rocha, presidente Conselho Superior do CIEAM (Centro da Indústria do Estado do Amazonas), afirmou em artigo que o texto aprovado pela Câmara dos Deputados atende aos pedidos do empresariado da região.
“As propostas da entidade que preservam a ZFM foram contempladas no texto constitucional, que foi aprovado na Câmara dos Deputados. Temos ainda enormes desafios. O próximo passo é a tramitação no Senado Federal e depois a regulamentação na legislação complementar. Com a certeza de que a reforma tributária ao final será sólida e equitativa. Não tem plano B, tem esse foco: preservar a ZFM até 2073”, afirmou Luiz Augusto Rocha, do Centro da Indústria do Estado do Amazonas.
Já o relator da proposta de reforma tributária no Senado Federal, o senador pelo Amazonas Eduardo Braga, avaliou que a questão da Zona Franca de Manaus foi “bem resolvida” na Câmara dos Deputados.
“O projeto Zona Franca de Manaus é o maior programa de conservação ambiental que o Brasil possui. A maior floresta em pé do mundo é a floresta do estado do Amazonas: 96% de um estado, 1,5 milhão de quilômetros quadrados de floresta está preservado, graças a um modelo de desenvolvimento econômico sustentável que não pressiona a floresta”, afirmou Braga nesta semana em entrevista ao programa “Roda Viva”, da TV Brasil.
Fundo de desenvolvimento da região
Esse fundo, que será definido posteriormente por meio de lei complementar, ainda não tem valores definidos. A ideia é estimular projetos relacionados com a bioeconomia, mais relacionados com a vocação natural da região.
“A ideia desse fundo é você criar um instrumento alternativo de desenvolvimento para a região e a própria PEC diz que, se tiver funcionando bem, em acordo com o governo do Amazonas, pode ter muito lentamente uma substituição, um incremento desse instrumento e uma redução dos instrumentos atuais [benefícios fiscais]. Mas isso ficou como uma uma possibilidade. É um instrumento novo que abre a possibilidade de desenvolver novas formas de desenvolvimento para a região”, disse Bernard Appy, do Ministério da Fazenda.
Em outubro do ano passado, Sergio Leitão, diretor-executivo do Instituto Escolhas, uma associação civil sem fins econômicos que busca “qualificar o debate sobre sustentabilidade”, avaliou que o custo da Zona Franca de Manaus é alto para fazer processos sem inovação. Ele disse também que a bioeconomia, como projetos de piscicultura e carne vegetal, por exemplo, são o “passaporte para o futuro” da região.
Em maio desse ano, o Banco Mundial divulgou um relatório no qual propõe novo modelo de desenvolvimento para a Amazônia Legal Brasileira. Entre as propostas, estão:
- Proteger a floresta por meio do fortalecimento da governança fundiária e florestal, incluindo a aplicação das leis existentes (comando e controle);
- Promover meios de subsistência rurais sustentáveis, valorizando o capital natural associado à floresta em pé e protegendo os modos de vida tradicionais;
- Estruturar o financiamento da conservação vinculado à redução mensurável do desmatamento e recorrer a recursos públicos e privados ou soluções baseadas no mercado.