O corte de 1,1 milhão de barris ao dia na produção de petróleo dos países que formam a Organização dos Países Exportadores de Petróleo e Aliados (Opep+), a partir de maio, joga mais pressão sobre a Petrobras. A empresa passa a ser observada sobre qual decisão tomará em relação aos preços dos combustíveis no país caso as cotações da commodity se mantenham altas por mais tempo. A redução da produção do cartel, anunciada no domingo (2), provocou forte alta nas cotações internacionais da commodity ontem e o preço do barril do tipo Brent fechou a segunda-feira em alta de 6,31%, a US$ 84,93, depois de subir até 8% no dia. O Goldman Sachs prevê que o Brent encerre o ano a US$ 95, chegando aos US$ 100 no fim de 2024. Até sexta-feira, o barril operava abaixo de US$ 80 e, caso a alta se mantenha, pode pressionar a estatal brasileira a reajustar o diesel e a gasolina.
A avaliação inicial de especialistas ouvidos pelo Valor, porém, é de que é preciso esperar alguns dias para se ter um quadro mais nítido do mercado global.
O ex-diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), Décio Oddone, diz que ainda não há certeza sobre o comportamento do barril em prazos mais longos. Ele ressalta que atualmente há forças operando no mercado que puxam as cotações para cima e para baixo. Entre as forças de baixa, cita o desvio da produção russa para a China e outros países do Oriente e o risco de recessão global. Entre os efeitos de alta, está a recente decisão da Opep+.
Ele afirma que o mercado global de petróleo opera com oferta e demanda próximas a 100 milhões de barris/dia, o que significa dizer que um corte de 1 milhão de barris faz diferença na formação de preços a curto prazo: “O que pode acontecer [em prazos mais longos] é o resfriamento econômico pressionar para baixo [as cotações]”, diz.
Ações ordinárias (ON) da Petrobras fecharam em alta ontem na B3, com avanço de 4,76%, cotadas a R$ 27,75.
Apesar da surpresa que a decisão da Opep+ causou ao mercado, as ações de petroleiras no país fecharam em alta. As ações ordinárias (ON) da estatal encerram com avanço de 4,76%, a R$ 27,75. Papéis ON da Prio fecharam o pregão na B3 cotadas a R$ 32,40, alta de 3,88%, segundo o Valor Data.
“Embora surpreendente, esse corte pode refletir em mudanças econômicas importantes e em prováveis implicações políticas”, disse o Goldman Sachs, em relatório. O UBS BB projeta uma elevação em mais de US$ 5 o barril, como reação ao anúncio do corte da produção de petróleo. Embora tivesse notado em janeiro uma perspectiva de ação por parte da Opep+, a instituição esperava que o cartel mostrasse “mais paciência”, dada a recente trajetória de alta dos preços do barril.
A principal incerteza, no Brasil é qual cenário a Petrobras enfrentará diante das pressões para abandonar o preço de paridade de importação (PPI) como referência para o mercado interno. Em diversas ocasiões, o presidente da companhia, Jean Paul Prates, tem dito que não aceita o PPI como um “dogma”. Ele se alinha ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que defende “abrasileirar” o cálculo dos preços dos combustíveis, criando temores de que a estatal volte a subsidiar os preços.
O ex-diretor de relações institucionais e sustentabilidade da Petrobras, Rafael Chaves, que deixou o cargo semana passada, diz que a estatal tem que analisar se os movimentos de mercado são perenes ou transitórios para então decidir sobre o preço dos derivados: “A Petrobras é testada todos os dias, e criticada por vezes simultaneamente pelos consumidores e pelos concorrentes/importadores”, diz. “Se seguir o mercado, tem defesa consistente. Se desviar, dará razão às queixas, de um lado ou de outro”, acrescenta.
O presidente do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), Roberto Ardenghy, avalia que é preciso aguardar ao menos duas semanas para observar se a alta do barril foi um “solavanco” do mercado, provocado pela surpresa com o anúncio da Opep+, ou se mostrará ser uma tendência de longo prazo.
“Talvez o preço que a gente viu aumentar muito, hoje [ontem], não se sustente a longo prazo”, afirma. Ardenghy também diz que o mercado espera efeito limitado da restrição, pois os países da Opep+ já não estavam atingindo o corte de 2 milhões de barris por dia, anunciado em outubro. “A gente não acha que vai chegar a 1 milhão de barris por dia”, diz, sobre a nova medida.
O executivo afirma ainda que não vê espaço “estrutural” para grandes aumentos em função da alta de estoque nos Estados Unidos, do fim do inverno no hemisfério Norte – quando há redução do consumo – e pelo que considera um crescimento ainda modesto da economia chinesa. “Esses três fatores puxam o petróleo para baixo.”
Ex-diretora-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Magda Chambriard reconhece que o aumento das cotações internacionais gera uma pressão sobre a Petrobras. Ela defende, no entanto, que altas não devem ser repassadas “pari passu” ao consumidor e sugere que os cálculos devem levar em conta o impacto das medidas econômicas anunciadas pelo governo sobre o câmbio. “A alta do petróleo aumenta o preço na bomba mais cedo ou mais tarde. Mas o que a gente defende é que o intervalo [do reajuste] seja maior. Só de o [Fernando] Haddad dizer que estava com o pacote fiscal pronto, o câmbio já caiu. E se continuar caindo, talvez não precise de reajuste ou, pelo menos, de um reajuste tão grande’, diz.