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domingo 24 de abril de 2022 às 06:21h

Presos na Lava Jato voltam às urnas e falam em ‘julgamento do povo’

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O ex-deputado federal Henrique Eduardo Alves passou 328 noites na prisão. O ex-senador Gim Argello ainda mais, 1.159.

Livres por diferentes motivos de processos judiciais da Lava Jato, a partir de 2023 a meta deles é voltar a exercer mandato no Congresso Nacional, onde talvez tenham a companhia de algozes como Deltan Dallagnol e Sergio Moro.

Assim como os dois, outros políticos que foram presos na operação deflagrada em Curitiba e em desdobramentos articulam a volta às urnas na eleição em outubro.

Homem jovem, sorrindo, mostra papel amarelo e vermelho ao lado de homem mais velho, de óculos, que usa camisa verde clara
O deputado federal Rafael Motta, presidente do PSB-RN, exibe ficha de filiação de Henrique Eduardo Alves (de verde), em foto feita em março – Reprodução @Rafael Motta no Facebook

O caso mais notório é o do ex-presidente Lula (PT), líder nas pesquisas de intenção de voto à Presidência depois de ter ficado um ano e sete meses detido no Paraná.

Também devem retornar às urnas o ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PTB-SP), o ex-deputado federal Luiz Argôlo (MDB-BA), além do ex-governador do Paraná Beto Richa (PSDB) e do ex-governador de Goiás Marconi Perillo (PSDB).

Henrique Eduardo Alves, que foi deputado federal por 11 mandatos consecutivos e presidente da Câmara entre 2013 e 2015, quer voltar após um hiato de oito anos fora do Congresso Nacional.

O retorno à política acontece cinco anos depois de ter sido preso preventivamente âmbito das operações Sépsis e Manus, que investigaram supostos desvios de recursos da Caixa Econômica Federal e da construção da Arena das Dunas, em Natal.

Alves, 73, enfrentou 11 meses de prisão preventiva, entre junho de 2017 e maio de 2018, em decorrência de investigações derivadas do caso iniciado no Paraná. Seu principal processo teve sentença anulada pela Justiça Federal do DF em dezembro, e o ex-deputado ainda enfrenta três ações na Justiça Eleitoral no RN.

“Me dói muito falar da prisão. Enfrentei uma das prisões preventivas mais longas do país, foram 328 dias sem ter uma condenação. Mas tudo o que eu vivi foi um aprendizado, me deu humildade e uma imensa capacidade de perdoar”, afirma.

A retomada, contudo, não promete ser fácil. O seu primeiro obstáculo foi o próprio MDB, sigla liderada localmente por seu primo, o ex-senador Garibaldi Alves, também pré-candidato a deputado federal.

Sem espaço para as duas candidaturas, Henrique Eduardo Alves decidiu deixar o MDB após 52 anos e criticou os antigos aliados por não reconhecerem os seus “longos anos de militância no partido”. Em março, assinou a ficha de filiação ao PSB.

Alves diz que não guarda mágoas de carrascos, incluindo o então procurador-geral Rodrigo Janot, que pediu a sua prisão. E afirma que não terá problema em ser colega de Moro e Deltan no Congresso, caso os três sejam eleitos.

“Quero virar essa página. Quem for merecedor, que se eleja e no Parlamento tenha capacidade de dialogar, de convencer e ser convencido”, diz.

Senador pelo Distrito Federal de 2007 a 2015, Gim Argello seguiu o mesmo caminho e tentará voltar ao cargo em 2022. Com 60 anos e filiado ao Pros, ele diz não ver rejeição do eleitorado e que vencerá a disputa ao Senado graças à lembrança da população de sua atuação no cargo.

Também afirma que está bem empresarialmente e que fala hoje “com quem quiser” na República: “Eu entrei e saí de cabeça erguida. Não virei delator. No mundo da política, virei herói. [Dizem:] O cara passou o que passou e não falou da vida de ninguém’. Não falei.”

A acusação das autoridades da Lava Jato era a de receber propina de empreiteiras, por meio de doações oficiais e de pagamento a uma igreja, em troca de protegê-las em uma CPI sobre a Petrobras.

Desde a prisão, em 2016, sempre negou que tenha havido corrupção e sustentou que os repasses de empresas a partidos eram legais à época. Foi condenado por Moro a 19 anos.

Só saiu em 2019 ao ser beneficiado por um indulto expedido pelo então presidente Michel Temer. Da cadeia, ficaram lembranças de cenas impactantes de tentativas de suicídio de outros presos e uma religiosidade mais forte.

“Graças a Deus só me senti preso dois dias: no dia em que me levaram e o dia em que perdi um neto e eu estava lá dentro. Me senti horrível.”

Conta que obteve abatimento da pena graças à participação no Enem e que fez cursos de logística e um de marketing digital. “Todos os dias eu acordava às 5h30 da manhã e distribuía remédios. Sempre trabalhei, sempre estudei.”

As acusações contra o ex-senador voltaram à estaca zero neste ano com decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) que decidiu que o caso deveria ter tramitado na Justiça Eleitoral, e não na Federal, já que envolvia caixa de campanha. A corte seguiu precedente julgado no Supremo Tribunal Federal.

Também diz que hoje não se importaria com a eventual companhia de Moro e Deltan no Congresso. Limita-se a dizer que perdoou todos.

O caminho até uma nova candidatura neste ano tem como único entrave, segundo ele, a contrariedade da esposa, Cristina, a quem tenta convencer.

Diz que não se identifica nem com Lula nem com Jair Bolsonaro. Seu presidenciável favorito seria o empresário e youtuber Pablo Marçal, do Pros, que se tornou conhecido neste ano ao liderar tentativa frustrada de um grupo de escalar uma montanha no interior paulista sob temporal.

Outro ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, se filiou ao PTB no fim de março, partido hoje aliado do presidente Bolsonaro, do PL, anunciando a intenção de voltar a concorrer a deputado.

Cunha também se beneficiou da anulação nas instâncias superiores de uma de suas condenações, mas está inelegível. Isso por ter sido um dos poucos parlamentares cassados por colegas por quebra de decoro em consequência das descobertas da Lava Jato.

O então deputado perdeu o cargo em 2016 por quebra de decoro e pouco depois foi preso por ordem de Moro. Agora, precisará de alguma espécie de liberação judicial para concretizar a candidatura.

Também deve voltar às urnas em 2022 o ex-deputado federal baiano Luiz Argôlo, um dos primeiros políticos presos pela Lava Jato. Detido em 2015 sob acusação receber propina de fornecedoras da Petrobras, cumpriu quatro anos de prisão em regime fechado e está em liberdade condicional desde 2019.

Depois de um período recluso, voltou a se movimentar politicamente e se filiou ao MDB, partido que na Bahia é liderado pelo ex-ministro Geddel Vieira Lima, também preso por corrupção e em condicional.

A adesão ao grupo governista mostrou que o ex-deputado ainda é influente: ele conseguiu emplacar José Antônio Maia Gonçalves, seu advogado nos processos da Lava Jato, como novo secretário de Administração Penitenciária da Bahia.

O secretário terá como função gerir as unidades prisionais da Bahia, incluindo a Penitenciária Lemos Brito, onde Argôlo cumpriu parte da pena.

Em seu retorno às urnas, o ex-deputado vai trabalhar para retomar suas bases eleitorais, sobretudo na região de Entre Rios (141 km da capital baiana), onde a sua família tem fazendas e um parque de exposições e vaquejadas.

Mesmo com pretensões eleitorais, Luiz Argôlo e Gim Argello seguem fora das redes sociais e fazem poucas aparições públicas.

Há três semanas, Argôlo foi ao ato de lançamento da pré-candidatura de Jerônimo Rodrigues (PT) ao governo da Bahia com a presença de Lula. Mas preferiu ficar nos bastidores e se manteve no fundo do palco.

Cunha, por outro lado, segue ativo nas redes e se tornou um fervoroso bolsonarista. Mudou o domicílio eleitoral para São Paulo e vai apoiar a candidatura da sua filha, Danielle Cunha (União Brasil), a deputada federal pelo Rio.

Depois de meses mais recluso, Henrique Eduardo Alves voltou a percorrer o interior do Rio Grande do Norte, retomando o contato com os “bacuraus”, seu tradicional grupo político que no estado rivaliza com os “araras”.

Será uma espécie de volta às origens após ter atingido o seu ápice como presidente da Câmara e mergulhado em uma espiral de revezes que culminaram com a prisão. “Estou de cabeça erguida e pronto para andar esse estado inteiro. O povo vai me julgar”, afirma.

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