segunda-feira 23 de dezembro de 2024
Joaci Góes foi eleito para o mandato de 2024-2025 - Foto: Ana Lucia Albuquerque/Correio
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quarta-feira 2 de outubro de 2024 às 07:37h

Presidente do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia denuncia governo do Estado por ‘retaliação política’

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O corte de R$ 700 mil, valor que representa 85% do orçamento do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB), ocorreu segundo reportagem de Maysa Polcri, no jornal Correio, por retaliação política da Secretaria de Cultura do Estado (Secult-BA). É o que denuncia Joaci Fonseca de Góes, presidente do IGHB e eleito para o mandato de 2024-2025. Em entrevista exclusiva ao jornal, ele, que integra a Academia de Letras da Bahia, afirma que o instituto é alvo de perseguição do titular da Secult, Bruno Monteiro. O presidente afasta ainda a possibilidade de suspensão das atividades e diz contar com doações da sociedade baiana para manter o equipamento funcionando.

Durante a entrevista, Joaci Fonseca de Góes relembrou dois episódios que, segundo ele, motivaram o corte no instituto, fundado em 1894. O primeiro teria acontecido em novembro do ano passado, quando um evento sobre o Dia da Proclamação da República, promovido pelo IGHB, teve como um dos convidados Ernesto Araújo.

O ex-ministro das Relações Exteriores do governo Jair Bolsonaro esteve envolvido em polêmicas e atua, hoje, como assessor da Fundação Dissenso, ligada ao partido espanhol de extrema-direita Vox. Na época, a pasta retirou o apoio do evento após a divulgação da participação de Ernesto Araújo. O episódio mais recente teria sido um almoço em que Joaci Góes foi visto com o senador Sérgio Moro, que foi ministro da Justiça do governo Bolsonaro, em Brasília.

Corte afeta orçamento do Instituto de 130 anos
Corte afeta orçamento do instituto de 130 anos Foto: Marina Silva/Correio da Bahia

Em março deste ano, a Secretaria de Cultura do Estado da Bahia cortou R$ 700 mil da verba destinada ao instituto, como prevê a Lei nº 6.575/1994. A pasta aponta como pior critério da instituição a “harmonia com a política estadual”. No dia 9 de setembro, o IGHB entrou com um mandado de segurança contra a medida. A Justiça deu prazo de 30 dias para que as partes manifestem a decisão do processo administrativo.

A Secult-BA foi questionada, através da sua assessoria de imprensa, sobre as acusações de perseguição política, e disse que tem “apoiado, de forma democrática e plural, instituições culturais que garantem a salvaguarda da memória e da arte na Bahia”. A pasta afirma que o instituto foi contemplado, entre 2009 e abril de 2024, pelo Edital de Apoio a Ações Continuadas de Instituições Culturais.

“No certame deste ano, o IGHB teve sua proposta classificada como suplente após avaliação técnica da Comissão Avaliadora, que seguiu critérios de pontuação descritos no edital”, diz a Secult-BA. Veja a íntegra do posicionamento da secretaria ao final da entrevista.

O Instituto Geográfico e Histórico da Bahia completou 130 anos de fundação em maio deste ano. Qual tem sido a importância do equipamento para a preservação da história da Bahia?

O instituto, que foi fundado em 1894, é reconhecido pelo seu significado como repositório da memória geográfica e cultural do Estado da Bahia. Já foi reconhecido, em teses de doutorado, como a mais importante instituição cultural da Bahia, desde sua fundação até 1946, quando foi fundada a Universidade Federal da Bahia (Ufba).

O IGHB é cognominado como a casa da Bahia, por ser aberto a todas as pessoas que tenham interesse em conhecer seu extraordinário acervo. Sua pinacoteca [coleção de quadros] é a mais rica do Nordeste entre as instituições culturais. Assim como sua hemeroteca, que guarda revistas e jornais. Os jornais que foram publicados, de meados do século XIX até hoje, na Bahia, são guardados em cópias.

Qual a média de visitantes que o IGHB recebe por mês?

Não recebemos menos de 1 mil visitas por mês, ou seja, 12 mil a cada ano. Fora a Biblioteca dos Barris, não acredito que outra instituição cultural tenha, sequer, metade desse número de visitantes na Bahia.

A Secretaria de Cultura do Estado da Bahia cortou R$700 mil destinados ao equipamento. A verba corresponde a 85% do orçamento total do instituto. Quais têm sido os impactos da diminuição do orçamento?

Em 1994, foi feita uma perícia no instituto e a promulgação da Lei nº 6.575, que determina que o instituto deve receber um valor mensal atualizado a cada ano. Neste momento, o valor é da ordem de R$700 mil, o que representa 85% do funcionamento para que o IGHB opere como museu e casa de cultura. Esse valor, no entanto, não paga os valores necessários à manutenção. Só a recuperação do anexo do instituto, onde funcionou o Senado da Bahia, depende de um investimento de R$2 milhões, que estamos buscando na sociedade baiana.

Quando o Estado da Bahia suspendeu, em março, sua contribuição ao instituto, pela primeira vez na história, tivemos que recorrer ao expediente de pessoas amigas e outras instituições para cobrir esse buraco. Em paralelo, ingressamos com um mandado de segurança para que a Justiça obrigue a Secretaria de Cultura a cumprir a lei.

Quais são os riscos? Há possibilidade de suspensão das atividades do instituto?

A Bahia, por todos seus diferentes setores, não deixará que o instituto pare de funcionar. Os cidadãos não vão negar uma contribuição para evitar a vergonha nacional de que a instituição cultural mais importante do Nordeste feche por uma decisão equivocada de um secretário de Estado.

Ao elaborar os critérios para o orçamento, a Secult considerou a “a harmonia com a política estadual” o pior critério do instituto. Como o senhor interpreta a avaliação da pasta?

As pessoas especulam que um dia, em um restaurante em Brasília, o secretário de Cultura [Bruno Monteiro] me viu almoçando com alguns parlamentares, inclusive, o senador Sérgio Moro (Republicanos/PR). Além disso, em novembro do ano passado, uma das pessoas que falaram no evento sobre o Dia da Proclamação da República foi Ernesto Araújo, que foi chanceler de Bolsonaro.

Naquele momento, o secretário de Cultura entrou nas redes sociais para concluir que o governo democrático do Estado da Bahia, nas palavras dele, não poderia financiar uma instituição que escuta alguém cometeu o pecado mortal de colaborar com o governo anterior.

O senhor acredita que o corte ao IGHB foi, na verdade, motivado por retaliação política?

Só duas pessoas, na Bahia, acreditam nisso: Deus e o mundo (risos).

Em 2021, o IGHB foi alvo de denúncias de associados, que acusaram a então diretoria de má gestão financeira. Dois anos antes, a Secult identificou irregularidades como o remanejamento sem autorização de parte do recurso repassado. Na época, o então presidente se defendeu dizendo que os ataques tinham motivações eleitorais. A relação entre associados e diretoria continua tensa?

Eu não integrava a diretoria do instituto na época, mas acompanhei as apurações das denúncias. Ficou comprovado que foram feitas por um funcionário que foi demitido, não se conformou com a decisão e resolveu fazer as denúncias. O Ministério Público examinou as contas e concluiu que não havia irregularidades nas contas.

A partir do corte no orçamento, quais serão os próximos passos tomados pelo instituto?

Pela minha experiência de luta e de vida, eu tirarei isso de letra. O instituto arrumará colaboradores. Eu só não resolvi isso até agora porque não quero emprestar a esse episódio caráter político e eleitoral. Estamos na véspera das eleições e quero dar oportunidade ao governador de evitar que esse assunto vire nacional. Será um escândalo nacional se um Estado, com a respeitabilidade da Bahia, chancelar uma atitude mesquinha como essa, tomada pelo secretário de Cultura.

Ainda sobre a questão financeira, o instituto possui dívidas em atraso?

Não há nada em atraso e nós não deixaremos isso acontecer. O Instituto Histórico e Geográfico da Bahia é muito maior do que a pequenez das intenções daqueles que querem derrubá-lo.

O que diz a Secult-BA

“A Secretaria de Cultura da Bahia (SecultBa) tem apoiado, de forma democrática e plural, instituições culturais que garantem a salvaguarda da memória e da arte na Bahia. Uma das formas de apoio é via editais do Fundo de Cultura, dentre eles o Edital de Apoio a Ações Continuadas de Instituições Culturais, no qual o Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB) foi contemplado de 2009 até abril de 2024. No certame deste ano, o IGHB teve sua proposta classificada como suplente após avaliação técnica da Comissão Avaliadora, que seguiu critérios de pontuação descritos no edital.

A avaliação realizada pela Comissão Avaliadora do Edital de Apoio a Ações Continuadas de Instituições Culturais em nada tem a ver com qualquer retaliação política à instituição, como tem sido informado erroneamente. Quando em novembro de 2023, o IGHB anunciou o ciclo de palestras comemorativas da Proclamação da República, no qual a abertura contou com a participação do ex-ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, o Instituto possuía Termo de Fomento firmado com a SecultBa através do Edital do Programa de Apoio a Ações Continuadas de Instituições Culturais do ano 2016. Na ocasião, a Secretaria informou ao Instituto que a referida ação não poderia ser considerada como parte do plano de trabalho em vigor e que não seria aceita no relatório de execução das atividades, devido ao teor que descumpriu o Termo vigente.

Importante ressaltar, inclusive, que o Instituto em nenhum momento durante o apoio recebido via Fundo de Cultura foi penalizado, tampouco houve destrato por parte da SecultBa. Todas as intervenções realizadas pela Secretaria de Cultura junto ao IGHB tiveram como objetivo sanar eventuais irregularidades em relação ao descumprimento de clausulas contratuais do Termo de Fomento. Os procedimentos adotados são comuns em monitoramento de projetos apoiados com recursos públicos, para manter a consonância com as designação dos editais.

Em 2024, o Edital de Apoio a Ações Continuadas de Instituições Culturais foi lançado com ampliação de recursos e do número de instituições contempladas. No triênio 2024-2027, serão investidos R$ 30 milhões em propostas de Organizações da Sociedade Civil (OSC) e número de instituições contempladas passou de 17 para 22.

Por fim, a SecultBa entende a importância do IGHB para a sociedade baiana, porém também se baseia no respeito à diversidade e pluralidade para a democratização do apoio à cultura baiana, prezando pela oportunidade de diversas organizações serem fortalecidas e potencializarem suas ações culturais. O secretário de Cultura Bruno Monteiro tem se empenhado em buscar alternativas em conjunto com representantes do IGHB”. 

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