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sexta-feira 29 de setembro de 2023 às 09:27h

Petrobras e Ibama miram plano B para a Margem Equatorial

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A Petrobras busca um plano B junto com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para explorar áreas na Margem Equatorial. A medida resulta da dificuldade da empresa em obter a licença ambiental para perfurar poço de petróleo na bacia da foz do rio Amazonas. Documento obtido por Claudia Safatle, do jornal Valor mostra que a estatal pediu ao Ibama para priorizar o licenciamento de dois blocos na bacia Potiguar, no Rio Grande do Norte, onde a empresa tem produção. Mas o presidente da companhia, Jean Paul Prates, disse na quinta-feira (28) que a palavra final é do Ibama: “Quem define a prioridade entre as bacias é o órgão ambiental”.

A Petrobras prevê, no plano estratégico 2023-2027, investimentos de US$ 6 bilhões para campanhas exploratórias, sendo cerca de US$ 3 bilhões só na Margem Equatorial. Essa região é formada por cinco bacias sedimentares: foz do rio Amazonas, Pará-Maranhão, Barreirinhas, Ceará e Potiguar. A Margem Equatorial é tida como essencial para a reposição de reservas de petróleo da empresa e para manter o atual nível de atividade de óleo e gás no país a médio e longo prazos. No caso da bacia da foz do rio Amazonas, o interesse se dá pelo potencial elevado verificado em países vizinhos, em especial a Guiana e o Suriname.

“Quem define a prioridade entre as bacias é o órgão ambiental”
— Jean Paul Prates

A iniciativa da Petrobras de procurar opções para explorar a Margem Equatorial é resultado de um impasse surgido no governo neste ano, opondo a empresa e o Ministério de Minas e Energia (MME), de um lado, favoráveis à atividade na região; e o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e o Ibama, de outro, que apresentaram restrições ao desenvolvimento de trabalhos da indústria de petróleo na foz do rio Amazonas, região mais sensível do ponto de vista ambiental.

Em outra frente, o governo federal tenta destravar o licenciamento de áreas de exploração que pertencem à Petrobras nas cinco bacias da Margem Equatorial, e não apenas na bacia da foz do rio Amazonas. As negociações têm sido conduzidas pelo ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, e envolvem MME, MMA e Ibama, além da Petrobras. As tratativas se intensificaram na última semana, com várias reuniões. Em uma delas, segundo participantes, ficou assegurado que a Petrobras iria cumprir todas as condicionantes do Ibama.

O presidente da Petrobras disse que a empresa vem fazendo o papel que lhe cabe nessa discussão: “Estamos cumprindo o que o Ibama pede e o compromisso de perfurar que temos com a ANP [Agência Nacional do Petróleo], e aguardando a licença sair. Se o Estado [brasileiro] dissesse que não vai haver exploração na foz do Amazonas, acabou o problema, seríamos impedidos. Mas não aconteceu”. Na semana passada, a Petrobras fez uma avaliação pré-operacional (APO) na bacia Potiguar. Trata-se de uma das últimas etapas antes da concessão da licença.

O teste durou três dias, contou com 50 barcos e incluiu resgate de fauna e de população. “Mas estamos prontos para fazer [a APO] na foz também. O Ibama é quem diz em quais das bacias da Margem podemos avançar em cada etapa. De repente, o Ibama veio dizer que na Potiguar podíamos fazer a APO. A sonda não precisou ir até lá, foi processo de simulação de óleo vazado. Foi nota dez”, afirmou. “Para onde a sonda vai, é o Ibama que vai decidir. Podemos ir para a bacia Potiguar furar por quatro ou cinco meses e depois seguir para a foz do Amazonas ou vice-versa. Não tem licença em lugar nenhum, é uma fila. Mas a APO é uma das fases, é como a prova final. E já saiu na Potiguar. Seria a mesma sonda para todas as bacias.”

Prates negou que a escolha da bacia Potiguar tenha vínculo com o fato de ela se situar no Estado que é berço político do executivo e pelo qual ele foi senador até 2022: “Não há conexão política nenhuma, tentaram dizer que era porque eu vim do Rio Grande do Norte”.

Em maio, o Ibama negou a licença ambiental da perfuração do bloco FZA-M-59, na foz do Amazonas, à Petrobras, que pediu ao órgão ambiental que reconsiderasse a medida. Claudia Safatle, do Valor, teve acesso ao processo de licenciamento do bloco. Em carta enviada no dia 1º de setembro deste ano pelo diretor de exploração e produção da Petrobras, Joelson Mendes, para o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, a petroleira afirmou que o navio-sonda contratado para a campanha na Margem Equatorial previa como primeira atividade da campanha perfurar o poço da foz do rio Amazonas, situado a 540 quilômetros de distância do continente e a cerca de 180 km do Oiapoque (Amapá). Depois viriam os dois poços na bacia Potiguar, denominados Pitu e Anhangá.

A Margem Equatorial já teve explorações feitas pela indústria de petróleo. Blocos foram concedidos em leilões da Agência Nacional do Petróleo (ANP) nos anos 2000, inclusive com descobertas declaradas. Na Margem, 37 blocos estão na fase de exploração. Essa é a primeira fase dos contratos, na qual as empresas realizam estudos e atividades, como sísmicas e perfuração de poços, para identificar presença ou não de petróleo e gás e avaliar se as descobertas são ou não comerciais.

Com o plano de avaliação de descobertas cumprido, a empresa decide se devolve o bloco à ANP ou o desenvolve, iniciando a fase de produção. A Petrobras possui 17 dos 37 blocos exploratórios concedidos na Margem, segundo a ANP. Na fase de produção, há só seis campos de pequena produção em águas rasas, todos na bacia Potiguar. Mas não há nenhuma descoberta em águas profundas e, portanto, campos produtores, em áreas de nova fronteira, semelhantes às áreas da Guiana, do Suriname e da Margem Oeste africana (existem bacias sedimentares com as mesmas características na África). Águas rasas são jazidas em profundidades de lâmina d’água entre zero e 300 metros e águas profundas dali até 1,5 mil metros.

Um executivo do setor de petróleo disse que a Petrobras perfurou em águas rasas na bacia Potiguar e que existe produção em terra no Estado, o que abre perspectiva de haver reservas em águas profundas. Ele avalia que a bacia Potiguar pode ser uma área de produção complementar: “O que tem [de reservas] em águas rasas também tem em águas profundas?”, questiona o executivo, para quem o grande potencial está no Amapá, onde se situa a foz do Amazonas.

No documento ao Ibama, a Petrobras diz que a negativa da licença para o FZA-M-59 levou a empresa a pedir licenciamento para perfurar na Bacia Potiguar enquanto aguarda a avaliação do pedido de reconsideração feito pela companhia. O Ibama disse que a Petrobras pediu que priorizasse a licença de dois blocos na bacia Potiguar (POT-17 e POT 162). A estatal confirmou o pedido.

Procurada por Claudia Safatle, do Valor, a Petrobras afirmou em nota: “Todos os projetos aprovados no plano estratégico da Petrobras são considerados prioritários. O cronograma de execução considera a capacidade dos órgãos reguladores de atender a demanda de análises e também a capacidade de atendimento do mercado fornecedor. Os próprios órgãos reguladores e licenciadores requerem que a companhia sinalize seu cronograma de atividades e projetos para gerenciarem sua capacidade de atendimento”.

A campanha exploratória da Petrobras também prevê perfuração de poços na bacia de Barreirinhas, no Maranhão. Segundo o Ibama, a empresa pediu licenciamento para perfurar dois poços no local. O pedido foi negado e a empresa entrou com recurso: “Devido à priorização de outros projetos pela empresa, o Ibama não iniciou avaliação [sobre Barreirinhas]”. Um terceiro bloco na região até recebeu licença prévia em 2008, renovada em 2011, mas após sucessivos adiamentos pela empresa o processo foi arquivado. Esses blocos em Barreirinhas pertenciam à americana Devon e foram vendidos em 2010 para a Petrobras. Com a transferência, o processo de licenciamento ambiental no Ibama foi reiniciado e está em curso.

Claudio Jorge de Souza, diretor da ANP, diz que faz sentido buscar novas áreas nas duas bacias – Potiguar e Barreirinhas -, onde existem descobertas de gás natural em águas rasas. Souza esteve nesta semana com o governador do Maranhão, Carlos Orleans Brandão Junior, para discutir o cenário de reservas de hidrocarbonetos no Estado. O diretor da ANP afirmou que novas perfurações são necessárias na região para identificar também a existência de óleo: “É necessário perfurar mais para determinar o tamanho das jazidas”.

O argumento do Ibama para negar a licença à Petrobras para perfurar um poço no FZA-M-59, na foz do rio Amazonas, se apoiou na falta de estudos sobre eventuais impactos sobre comunidades indígenas. Os riscos às populações locais incluíam sobrevoos de aeronaves entre o aeródromo do Oiapoque e o local da perfuração. O órgão ambiental também apontou falta de análise sobre o tempo de resposta e atendimento à fauna atingida por óleo, em caso de vazamento. Ao mesmo tempo, o Ibama viu a necessidade de apresentação de uma Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS), o que ajudaria na análise do projeto.

A AAAS é um estudo de caráter estratégico que avalia a compatibilidade entre a indústria de petróleo e o contexto socioambiental da região. Ela dimensiona impactos e consequências de projetos de petróleo, que dão apoio à tomada de decisões e formulação de políticas. A Portaria Interministerial 198/ 2012, assinada por MME e MMA, exige a realização da AAAS e diz que os dois ministérios têm responsabilidade pela elaboração da análise. Os estudos podem ser feitos pelos ministérios ou por terceirizados, como a Empresa de Pesquisa Energética (EPE).

“É notório que a realização de tais avaliações, como a Avaliação Ambiental de Área Sedimentar, a AAAS, permitiria traçar conclusões a respeito da adequabilidade da cadeia produtiva da indústria petrolífera, contexto em que se insere o projeto analisado, o que traria segurança técnica e jurídica para o processo de licenciamento, dirimindo, inclusive, a sua contestação e a possibilidade de judicialização”, diz o parecer do Ibama.

Suely Araújo, ex-presidente do Ibama e especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima, afirma que a AAAS é uma obrigação do governo e que tais avaliações já deveriam ter sido feitas nas cinco bacias que compõem a Margem. “Quando o governo não realiza AAAS, está dando um tiro no pé. Porque, se ele realizasse, o melhor seria realizar antes da oferta pública, os blocos sairiam com mais segurança jurídica de que não teria problema depois, no licenciamento, que é uma fase posterior”, disse Araújo.

Um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) destaca que a AAAS não é exigível. Na discussão sobre o licenciamento, a AGU não pode representar a Petrobras pelo fato de a empresa ser pessoa jurídica de direito privado, mesmo que a União seja a principal acionista. Foi o MME que acionou o órgão para debater o tema. Em resposta, a AGU entendeu que o processo legal para exploração de petróleo foi respeitado na 11ª Rodada de Licitações, quando foi leiloado o bloco que a Petrobras tenta perfurar na foz. À época, o bloco pertencia a um consórcio formado por Petrobras, Total e BP. Anos depois, a estatal comprou a fatia dos sócios.

Na 11ª Rodada, o governo ofertou 289 blocos em 11 bacias sedimentares, incluindo a da foz do rio Amazonas. O leilão foi realizado no dia 14 de maio de 2013. Antes do certame, as áreas passaram por análises prévias quanto à sensibilidade ambiental. O grupo de trabalho formado por técnicos do MMA, do Ibama e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) não viu restrições para os blocos da bacia da foz do rio Amazonas, pois situavam-se distantes da costa. O grupo viu, contudo, “desafios especiais” para o licenciamento ambiental, diante da dificuldade de acesso à região e da falta de informações sobre o ecossistema local.

“De forma geral, esses desafios são derivados do fato de a região ser de acesso bastante remoto, tanto no mar quanto em terra, com grandes lacunas de conhecimento sobre a bioecologia das comunidades marinhas e situada próxima à fronteira com a Guiana Francesa”, disse o grupo de trabalho em um dos pareceres. A Petrobras tem afirmado recorrentemente que está em contato permanente com as autoridades dos países vizinhos para tratar do tema.

A AGU também abriu processo de conciliação na Câmara de Mediação e de Conciliação da Administração Pública Federal (CCAF), com expectativa de participação de Ibama, Petrobras, MME e MMA. “A solução consensual eventualmente produzida na CCAF no caso pode ser, ao final, formalizada em Termo de Conciliação, que, após os processos de validação, passa a ter natureza de título executivo extrajudicial”, disse a AGU.

Na carta ao Ibama, a Petrobras afirma que o indeferimento da licença para o bloco FZA-M-59, no Amapá, sustentou-se em argumentos que não eram conhecidos pela empresa até então, e que eram de difícil solução naquele momento, como a ausência da AAAS.

Ao Valor a Petrobras disse que poderá colaborar com MME e MMA na elaboração da AAAS. Disse também que empenha todos os esforços para obter a licença e que está disposta a colaborar com a conciliação na CCAF. “A empresa ressalta ainda que todos os estudos e exigências solicitados pelo Ibama, no âmbito do licenciamento ambiental, foram atendidos e que está pronta a incorporar novas solicitações que se façam necessárias.”

No pedido para o Ibama reconsiderar o licenciamento do FZA-M-59, a Petrobras disse que perfurou cerca de 700 poços em águas rasas na Margem Equatorial e que propôs mudanças na rota e na altitude de aeronaves para reduzir impactos sobre terras indígenas. E que disponibilizará o dobro de embarcações para proteção à fauna em caso de eventual vazamento de óleo na perfuração. Contatados, o MME e o MMA não responderam até a conclusão desta edição.

Quase 80% do gasto no Brasil é com Previdência Social e com a folha de pagamentos dos três níveis de governo e nos três Poderes.

Esse é um dado que chama a atenção por ser fora da curva. Na grande maioria dos países a soma das duas despesas se situa na casa dos 60%.

O gasto com saúde, no Brasil, fica aquém dos 4% do Produto Interno Bruto (PIB). Esse é outro número que surpreende. É impossível pretender ter um sistema de saúde universal e gratuito com esse padrão de gasto. Apenas para ter uma ideia, no Reino Unido, ele é de 8% do PIB.

Foi avaliando os números fiscais do Brasil que Arminio Fraga concluiu que não basta ter um ajuste fiscal que coloque a dívida em trajetória de queda. E nota-se que ela não está em queda.

É preciso ir além disso e promover uma faxina geral nos gastos, repensar as prioridades.

“Começou a ficar claro para mim que não era só produzir um saldo primário positivo. O atual governo fala em zerar o déficit, mas o primário”, diz Armínio. Pelo conceito primário não se leva em conta a despesa com juros da dívida.

Aqui, é bom lembrar que Lula teve a oportunidade de discutir zerar o déficit nominal em 2005, no seu primeiro mandato. Na ocasião, o déficit nominal – que é a expressão mais ampla da real situação de solvência do Estado brasileiro – era de 2,96% do PIB e a proposta em discussão era a de zerar esse déficit num prazo de até dez anos.

Estavam envolvidos na articulação dessa proposta, a pedido de Lula, os ministros da Fazenda, Antonio Palocci, do Planejamento, Paulo Bernardo, e Delfim Netto. Foi quando Dilma Rousseff, autorizada por Lula chamou a proposta de “rudimentar” e o assunto foi encerrado.

“ Fiz a contabilidade de fontes e usos de recursos públicos”, prosseguiu Arminio. “E daí para a constatação de que precisamos fazer um redirecionamento geral do gasto foi um pulo”, disse.

Há um bloco potencial de recursos que viria de mais reformas na Previdência, na folha de salários e corte nos subsídios. Se o governo conseguisse eliminar metade dos subsídios, que custam um total de 4% do PIB, e que são injustificáveis do ponto de vista da produtividade e da desigualdade, sobrariam recursos para dar uma acalmada na macroeconomia, com redução dos prêmios de risco e da taxa de juros. E canalizaria o gasto público para as áreas que seriam positivas, seja para a produtividade, seja para a redução das desigualdades. Áreas como saúde, educação e de melhoria da infraestrutura.

Outra área que precisa de mais recursos é a de investimentos, que já foi de 5% do PIB no governo militar e, atualmente, não passa de 1% do PIB. Mesmo o mais liberal dos liberais vai concordar que há necessidade de investimento público, acredita ele.

Nos dois blocos de gasto – Previdência e folha de pagamento – deve ser possível, num período de dez anos, passar dos 80% para 70% do PIB, ou para 60%, que é onde a maioria dos países está.

“E isso traria espaço para se redirecionar os gastos de uma maneira socialmente mais justa,” concluiu Arminio.

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