O perfil discreto do ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, colaborou para que as críticas nas redes sociais à mais recente crise de segurança pública — no mês passado, dois presos fugiram da penitenciária federal de Mossoró (RN) — recaíssem sobre o governo Lula, em vez de se concentrarem em uma única figura. Essa postura longe dos holofotes adotada pelo jurista opõem-se à atuação do antigo ocupante do cargo, Flávio Dino, até então o mais retumbante integrante do Planalto na arena digital.
A discussão nas redes sobre o caso repercutiu negativamente para a gestão petista, com a presença de termos que indicam responsabilização e cobrança sobre o episódio, bem como antigas associações falsas entre o Executivo e facções criminosas. Essas são algumas das tendências observadas em pesquisa feita a pedido de Luis Felipe Azevedo, do Globo, pela Escola de Comunicação, Mídia e Informação da Fundação Getulio Vargas (FGV-ECMI), que analisou a repercussão no X (antigo Twitter) de 14 a 28 de fevereiro.
O período abrange as duas semanas seguintes à primeira fuga registrada na história do sistema penitenciário federal, que conta com cinco unidades de segurança máxima. Deibson Cabral Nascimento e Rogério da Silva Mendonça escaparam da cadeia e permanecem foragidos.
Segundo o estudo, Lewandowski é apenas o nono ministro mais mencionado desde o dia que assumiu a pasta, em 1º de fevereiro, mesmo diante de sua primeira crise. Os primeiros lugares foram ocupados pela ministra da Saúde, Nísia Trindade, que lida com uma epidemia de dengue no país, e Geraldo Alckmin, que ganhou destaque a partir de cobranças por um posicionamento contrário à fala do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre Israel.
Por outro lado, Dino, o ministro mais mencionado durante o primeiro ano do governo Lula, manteve presença na discussão e foi alvo de críticas sobre o caso Mossoró, mesmo fora do ministério. Os pesquisadores entendem que ele alcançou uma projeção no debate sobre política institucional e segurança pública que ultrapassa temas específicos e sua presença à frente da pasta.
Na avaliação do pesquisador da FGV Victor Piaia, a ausência da participação de Lewandowski nas redes desinfla o antagonismo com a oposição observado na gestão de Dino, de modo que os parlamentares contrários ao governo têm menos armas para criticá-lo. Por consequência, o debate sobre segurança perde fôlego.
— Mesmo sem solução, a repercussão sobre o caso tem caído. Ao analisarmos o perfil discreto de Lewandowski e todo o movimento de Dino nas redes em 2023, que ganhou relevância não só pelas suas próprias postagens, mas também pela forma como respondia críticas de opositores, tudo leva a crer que a fuga de Mossoró estaria sendo mais comentada caso ele estivesse à frente da pasta do que ocorre com o novo ministro — aponta Piaia.
O estudo indica que, apesar de Dino ser mencionado, a primeira semana após o ocorrido teve Lewandowski como principal foco. No dia seguinte à fuga, o atual ministro foi citado em aproximadamente 16 mil postagens, enquanto Dino esteve na casa dos seis mil. Já uma semana depois, no dia 22, o acúmulo de críticas contra o atual ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) pelo seu período na pasta da Segurança gerou um novo pico de menções sobre o caso. O crescimento foi motivado por um post que elenca ações de Dino e que sugere, sem que haja nenhum indício ou investigação sobre isso, que ele estaria por trás da fuga dos criminosos de Mossoró.
— A fuga alimentou uma linha conspiratória de alguns setores da oposição, especialmente ligados ao ex-presidente Bolsonaro. Chama atenção a mobilização de termos que associam o governo a facções criminosas, como “dama do tráfico” e “Comando Vermelho” — afirma Piaia.
O pesquisador avalia que ainda será necessário analisar o posicionamento de Lewandowski nos próximos meses para entender qual será a cara e o impacto do ministro no debate digital da segurança pública, uma vez que o grau de exposição e uso das redes influencia o tamanho da mobilização em torno do nome dele.