Em duas de cada três cidades do país, não há nem sequer um partido que tenha declarado despesas realizadas em 2017. É o que mostra levantamento feito tendo como base as prestações de contas partidárias, geradas pelo Tribunal Superior Eleitoral em com informações declaradas até 28 de julho.
Trata-se do primeiro ano em que essas informações estão em um banco de dados disponível ao público. Isso foi possível devido à implementação do Sistema de Prestação de Contas Anual (SPCA).
O prazo inicial para a apresentação das contas era 30 de abril. O TSE, no entanto, concedeu mais 90 dias para os partidos retificarem ou complementarem as contas, motivado por pedido de um grupo de partidos para suspender o uso do SPCA devido a dificuldades no envio de informações e necessidade de ajustes no sistema. O prazo termina neste domingo (29). Agora, a Justiça Eleitoral iniciará o exame dessas contas.
A análise mostra que houve registro de despesas de pelo menos um partido em somente 2.009 dos 5.569 municípios brasileiros (Brasília foi excluída da análise por possuir diretórios zonais), o que representa 36% do total. Já os registros de arrecadação ocorreram em um número pouco maior de municípios: 2.094.
Pela resolução nº 23.464, de 2015, do TSE, que regulamenta as prestações de contas partidárias, os partidos devem prestar contas mesmo na ausência de movimentação financeira.
“A Justiça Eleitoral recebe com frequência prestações de contas que declaram que não há movimentação de recursos de espécie alguma”, afirma Denise Goulart Schlickmann, secretária de Controle Interno e Auditoria do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina (TRE-SC).
O problema é que as informações de prestações de contas divulgadas no sistema contêm somente aquelas que registraram alguma movimentação financeira. A partir dos dados disponibilizados não é possível dizer, portanto, quantos partidos entregaram a prestação zerada e quantos deixaram de entregar a prestação.
Para o professor de ciência política da USP Bruno Wilhelm Speck, esse processo espelha o histórico de outras etapas da introdução de mecanismos de maior transparência, como a prestação de contas eletrônica para candidatos e partidos nas eleições. “Nas eleições, alguns simplesmente ignoraram. Existiram até mesmo candidatos eleitos que não prestaram contas nas primeiras [após a introdução do sistema eletrônico]. Como este é o primeiro ano [do SPCA], eu imagino que a Justiça Eleitoral não vá aplicar grandes multas ou penalidades”, diz.
A principal sanção para o caso de não prestação de contas é a proibição de recebimento de recursos do Fundo Partidário, além da devolução de quaisquer recursos advindos do fundo que estes órgãos tenham recebido. A verba do Fundo Partidário prevista para distribuição entre os partidos em 2018 é de R$ 888 milhões, dos quais R$ 780 milhões decorrem de dotações orçamentárias e R$ 108 milhões de multas e penalidades eleitorais.
No caso de desaprovação das contas pela Justiça Eleitoral, além de vedação de recebimento de recursos do Fundo Partidário, as sanções podem incluir a devolução de quantias apontadas como irregulares, somadas de multa de até 20%.
Em 2017, os partidos arrecadaram mais de R$ 1,3 bilhão (uma vez descontadas as transferências entre seus próprios diretórios e com outras agremiações) para manter a estrutura das 35 siglas existentes no Brasil. Esses recursos são provenientes de diferentes fontes, como doações de pessoas físicas, sobras de campanha, sendo a principal delas o Fundo Partidário.
Prestações de contas em cada partido
Em média, cada partido registrou movimentação de despesas em 156 cidades do país. Porém, há importante variação entre eles. No gráfico abaixo, é possível perceber que mais da metade dos 35 partidos brasileiros registraram movimentação em menos de 100 cidades.
Registro de despesas e comissões provisórias
Não registrou despesa | Registrou despesa | |
Comissão Interventora | 230 | 2 |
Não informado / Sem órgão | 101.657 | 21 |
Órgão Definitivo | 16.729 | 3.206 |
Órgão Provisório | 65.320 | 2.215 |
Despesas eleitorais e não eleitorais
O resultado bruto dos gastos dos diretórios nacionais, estaduais e municipais dos partidos segundo uma divisão entre despesas eleitorais e não eleitorais revela uma disparidade entre esses órgãos. Os gastos com eleições correspondem a 30,7% dos órgãos municipais (de um total de R$ 56,7 milhões), a 6,6% (de R$ 218,9 milhões) dos estaduais e a 1% do total de pagamentos dos diretórios nacionais (de R$ 661,4 milhões). Considerando todos os gastos realizados em 2017, as despesas com eleições totalizam R$ 38,4 milhões.
Porém, esses resultados são puxados por poucos diretórios municipais com muitos gastos eleitorais, especialmente dívidas de campanhas assumidas, que correspondem a 89% dessas despesas por órgãos municipais.
Os sete diretórios municipais com maiores gastos eleitorais são responsáveis por mais da metade dessas despesas nos municípios em 2017. São eles:
- PT – São Paulo
- Avante – Belo Horizonte
- DEM – Salvador
- PR – Fortaleza
- PSDB – Manaus
- MDB – Cuiabá
- PSB – Recife
Apesar do resultado bruto indicar uma quantia considerável de gastos eleitorais, a análise individual dos municípios revela que cada diretório municipal gasta, em média, somente 3,6% das suas despesas com eleições em um ano não eleitoral.
As eleições suplementares realizadas em 59 municípios no ano de 2017 pouco afetam o perfil apresentado. Do total de disputas, 44 ocorreram em municípios com até 20 mil habitantes, onde os gastos em valores absolutos são comumente mais baixos.
Somente duas dessas disputas ocorreram em cidades com mais de 500 mil habitantes: Foz do Iguaçu (PR) e Gravataí (RS). Em Foz do Iguaçu, 99% das despesas do diretório municipal do PTB foram gastos com eleições (R$ 49,9 mil). Em Gravataí, nenhum diretório registrou despesas eleitorais.
Diretórios municipais com mais despesas
Os 10 diretórios municipais com as maiores despesas em 2017, em números absolutos, estão localizados em capitais. Eles são de nove diferentes partidos: PT, Avante, DEM, PR, PSD, PTB, PRB, PSB e PSDB.
Os diretórios com o maior volume de despesas em 2017
PARTIDO | CIDADE | VALOR (em R$) |
PT | São Paulo | 2.916.645 |
Avante | Belo Horizonte | 2.017.314 |
DEM | Salvador | 1.589.959 |
PR | Fortaleza | 1.281.086 |
PSD | São Paulo | 1.268.357 |
PTB | Porto Alegre | 1.109.714 |
PTB | Rio de Janeiro | 945.582 |
PRB | São Paulo | 881.051 |
PSB | Aracaju | 819.364 |
PSDB | Manaus | 743.167 |
Segundo a assessoria de imprensa do diretório municipal do PT de São Paulo, o protagonismo nesta lista é atribuído ao tamanho de São Paulo, “a maior cidade do país”. O partido diz ainda que “a avaliação dos custos ocorre de acordo com as necessidades da conjuntura política”. A expectativa de gastos para o ano de 2018 do diretório é de R$ 2 milhões.
Por Lucas Gelape