Ponderação — essa seria a palavra mais adequada para se entender a composição do futuro governo do Chile, anunciada ontem. A sugestão é de Gabriel Boric, presidente eleito que assume no próximo dia 11 de março: “Faz mais sentido a ideia de ser ponderado do que moderado.”
Boric surpreendeu ao vencer (com 55,8% dos votos) o candidato da ultradireita José Antonio Katzs, e, agora, na escolha do ministério. Montou uma equipe com idade média de 42 anos (ele tem 36 anos), ampla maioria de mulheres (elas são 14, eles 10), metade com formação em escola pública e um terço de políticos independentes.
O resultado é uma diversidade de forças muito além das fronteiras da coalizão que o elegeu e uma composição ministerial diferente de tudo que o Chile viu desde o fim do regime militar, nos anos 80 do século passado. Na essência, distanciada da tradição endogâmica característica da elite do país.
Formado no Partido Comunista, reconhecido como radical, Boric levou para o ministério seus companheiros de luta estudantil, deputados Camila Vallejo e Giorgio Jackson, e deu a Defesa a Maya Fernández, neta do presidente socialista Salvador Allende, morto em 1973 no golpe de estado do general Augusto Pinochet.
Surpreendeu mesmo em três áreas estratégicas de governo:
1) Entregou a chefia do ministério – equivalente à Casa Civil — à médica-cirurgiã Izkia Siches. Ela se destacou na liderança do contraponto ao governo que resultou numa bem-sucedida atuação do serviço de saúde pública na pandemia;
2) Deixou a Fazenda nas mãos do economista Mario Marcel, um socialista moderado, que presidia o Banco Central do governo liberal de Sebastián Piñera. Ele terá que conseguir receita tributária equivalente a 5% do Produto Interno Bruto para financiar um leque de programas sociais; e,
3) Nomeou a experiente advogada Antonia Urrejola para o Ministério de Relações Exteriores. Ela presidia a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, com postura crítica a regimes ditatoriais como o de Nicolás Maduro na Venezuela.
Boric, que na década passada chegou a elogiar o coronel Hugo Chávez, agora vê a Venezuela como um modelo de fracasso: “A principal demonstração são os seis milhões de venezolanos em diáspora”, disse ontem à repórter Andrea Vila Herrera, da BBC News.