Em fim de mandato, o presidente Jair Bolsonaro (PL), primeiro a não se reeleger na história do Brasil, vai enviar uma representação esvaziada para a 17ª Cúpula do G-20, em Bali, na Indonésia. Além de o próprio Bolsonaro ter desistido da viagem, o vice-presidente Hamilton Mourão e o ministro da Economia, Paulo Guedes, recusaram liderar a comitiva brasileira. A delegação será chefiada pelo ministro das Relações Exteriores, Carlos França.
Além das ausências de Bolsonaro, Mourão e Guedes, outra falta confirmada pelo Estadão é o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. O BC disse que não enviará representantes à cúpula.
Criado no fim dos anos 1990, o G-20 é um dos mais importantes fóruns multilaterais econômicos, tendo participação das maiores economias e papel de destaque dos ministros de finanças e presidentes de bancos centrais. Eles se reúnem ao longo do ano e preparam o evento principal, que desde a crise financeira de 2008 passou a reunir os chefes de Estado anualmente. Nas cúpulas, são discutidos acordos e coordenadas de ações internacionais entre os países. Os presidentes e primeiros-ministros também costumam aproveitar a ocasião para reuniões bilaterais.
A próxima cúpula, entre 15 e 16 de novembro, é considerada importante por autoridades do governo por causa da situação das economias em todo o mundo, face à inflação global enfrentada pelos países, as consequências da Guerra na Ucrânia e a recuperação pós-pandemia. O governo da Indonésia decidiu promover discussões sobre a transição energética, transformação digital e arquitetura global de saúde, com destaque para distribuição igualitária de vacinas.
Nas palavras de um embaixador, será um G-20 “sensível” com todas as discussões que envolvem crédito, inflação, segurança alimentar, e o Brasil pode se ver com uma representação tecnicamente capacitada, mas de segundo escalão político, sem peso para discutir com as principais delegações do mundo.
Questionados, o Ministério da Economia e o Banco Central não justificaram as ausências de Guedes e Campos Neto.
Até a derrota nas eleições, Bolsonaro havia participado de todas as cúpulas do G-20. Em 2019, estreou em Osaka, no Japão. Em 2020, discursou de Brasília, quando a reunião ocorreu por videoconferência, por causa da pandemia da covid-19. No ano passado, despediu-se ao liderar a comitiva brasileira em Roma, na Itália, ocasião em que foi flagrado deslocado na antessala reservada aos líderes.
Logo após a derrota para o ex-presidente Lula Inácio Lula da Silva (PT), Bolsonaro se recolheu no Palácio da Alvorada e cancelou compromissos, inclusive internacionais. Passou a receber apenas alguns ministros e aliados, despachando da residência oficial, e não promoveu mais nem mesmo as transmissões nas redes sociais. Encastelado, não quis se deslocar enquanto parte de seus apoiadores continuam a contestar o resultado das eleições e cobram intervenção militar.
Diante da negativa de Bolsonaro, integrantes do primeiro escalão do governo se esforçaram para elevar o nível político de representação do País. Em vão. Um dos que tentaram convencer o vice-presidente a ir à cúpula foi o chanceler Carlos França, a quem sobrou a tarefa de chefiar a delegação.
Além do deslocamento longo, com mais de 36 horas de voo com escalas, pesou o fato de o assunto não ser da esfera de domínio de Mourão. Ele teria de fazer um discurso com informações técnicas, sob encomenda. Como não houve uma determinação de Bolsonaro, que deixou o vice decidir livremente sobre o embarque, ele optou por não participar.
Mourão já havia “escapado” da Cúpula do Clima (COP-27), no Egito, assim como Guedes. Embora seja o nome forte do Conselho da Amazônia Legal, o vice havia ficado descontente em não ter liderado a delegação despachada no ano passado à COP-26, em Glasgow, e agora viu risco de desgaste político e cobranças com a presença de Lula e aliados em solo egípcio.
Antes, Paulo Guedes também rejeitou liderar a comitiva do G-20, embora seja considerado o “dono da bola” no assunto. O ministro decidiu enviar como representante da pasta o secretário de Assuntos Econômicos Internacionais, Marco Rocha. Um auxiliar do ministro ponderou que o roteiro das cúpulas de líderes é diferente das reuniões ministeriais, quando os titulares das pastas e presidentes de bancos centrais têm maior protagonismo.
O Ministério das Relações Exteriores também enviará o embaixador Sarquis José Buainain Sarquis, que é o sherpa do País na organização. Secretário de Comércio Exterior e Assuntos Econômicos, Sarquis foi indicado por Bolsonaro como próximo representante permanente do Brasil na Organização Mundial do Comércio (OMC), mas a aprovação está pendente no Senado e depende de acordo com Lula. Dois funcionários da coordenação-geral de G-20 também compõem a delegação brasileira.