O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), criticou nesta segunda-feira (20) a proposta do governo de transferir parte da complementação da União no Fundeb ao Renda Brasil e sugeriu que a equipe econômica resiste em priorizar recursos para a educação.
As declarações foram dadas em meio à insistência do governo de adiar a votação do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação).
O ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, argumenta que o novo ministro da Educação, Milton Ribeiro, precisa participar das negociações.
A intenção de Maia é iniciar discussão da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que torna o Fundeb permanente ainda nesta segunda e votar o texto na terça (21).
O deputado chamou de “ideias soltas” a sugestão do governo de destinar metade da complementação adicional da União para um benefício voltado a crianças no Renda Brasil, programa que o governo quer que substitua o Bolsa Família.
Também criticou a proposta de que as novas regras do Fundo só comecem a vigorar em 2022. “Você adiar o Fundeb para 2022 ou a sua complementação é uma sinalização muito negativa. Adiar o percentual que está combinado para 2022…eu não vejo sentido nesse encaminhamento”, afirmou.
“Até porque nós estamos vendo que, para alguns temas, parece que o governo entende que tem dinheiro. Para outros temas, como essa prioridade de curto prazo na educação, parece que o governo gera mais resistência. Pelo menos a equipe econômica.”
Maia afirmou que o texto da relatora, deputada Professora Dorinha (DEM-TO), está consolidado. “Se o governo quiser fazer um outro programa para a educação dentro do Fundeb, dependendo da redação, pode ser aceito, claro. Mas precisa ser para a educação”, afirmou.
A alfinetada tem relação com a intenção da equipe econômica de transferir dinheiro para um programa de voucher-creche dentro do Renda Brasil. Na avaliação de Maia e da relatora, a proposta teria caráter assistencial, não educacional.
“Se o governo quiser complementar para que a educação infantil tenha uma prioridade, que eu concordo que é um caminho correto, nós temos aí 30% de crianças apenas nas creches, eu acho que é uma boa ideia”, disse. ‘Mas como não é o foco do fundeb, tem que ser algo complementar àquilo que já está consolidado em relação ao percentual do Fundeb.”
O deputado lamentou ainda que o debate sobre o Fundeb tenha ficado “esquecido” pela área responsável no governo durante muito tempo –o MEC (Ministério da Educação) não participou da discussão diretamente.
O Fundeb, principal mecanismo de financiamento da educação básica, é responsável por R$ 4 de cada R$ 10 gastos pelas redes públicas nesta etapa. Sua vigência expira no fim deste ano.
O dispositivo reúne parcelas de impostos e recebe uma complementação da União para estados e respectivos municípios que não atingem o valor mínimo a ser gasto por aluno no ano. O complemento federal atual é de 10% –cerca de R$ 16 bilhões no ano.
A PEC da Câmara torna o Fundeb permanente, amplia a complementação da União para 20% de modo progressivo até 2026, e altera, entre outras coisas, o formato de distribuição dos novos recursos.
O Fundeb nunca esteve entre as prioridades de articulação do governo Bolsonaro, e o ex-ministro Abraham Weintraub (Educação) pouco se envolveu com o assunto. Em 2019, defendeu alta menor na complementação (de até 15%) e fez coro pela prorrogação do formato atual.
Com a alta da complementação, é previsto um incremento de R$ 66,9 bilhões de investimentos da União até 2026, a depender do crescimento econômico.
O valor mínimo gasto por aluno no país teria uma alta de 39%, passando de R$ 3.427 para R$ 4.778, segundo cálculo da Consultoria do Orçamento da Câmara. O número de municípios beneficiados com a complementação seria 34% maior, das atuais 1.699 cidades para 2.284 em 2026.
O texto prevê, segundo a Folha, sobre a adoção de um modelo híbrido de divisão do dinheiro. A distribuição dos atuais 10% continua sob as mesmas regras, com base na realidade dos estados (e respectivos municípios) que não atingem valor mínimo por aluno.
Parte dos recursos, referentes a 7,5% (a serem atingidos em 2026), serão distribuídos a partir do valor total investido na área por cada rede. Esse modelo contempla municípios pobres e com baixo investimento em estados mais ricos e que, no sistema atual, não são levados em conta.
Outra parte dos novos recursos, de 2,5%, será distribuída a redes que obtenham bons resultados em indicadores de aprendizagem. Esse formato ainda não está definido.
O texto da PEC já atualizou a progressão da complementação, que aumenta para 12,5% em 2021 –antes eram 15%. Também retirou a possibilidade de usar um recurso que já é da área, o chamado salário-educação.
Mas ainda há pontos em disputa, como o veto ao pagamento de inativos e a obrigatoriedade de usar 70% dos recursos com pagamentos de profissionais da educação.
O pagamento de profissionais ativos já consome, no entanto, cerca de 80% do fundo em estados e municípios, segundo estudo da organização D3E.
A alta na complementação amplia o protagonismo da União no financiamento da educação básica –quase 80% desse dispêndio saem dos cofres dos outros entes. Também busca equalizar o investimento pelo Brasil, uma vez que o gasto com a área varia sete vezes entre os municípios que contam com o menor e maior orçamento.