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quarta-feira 5 de julho de 2023 às 17:56h

Lula coloca aliado no caminho para presidir o Banco Central

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Se o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) conseguir o que quer, Gabriel Galípolo será o próximo presidente do Banco Central. Por ora, terá de se contentar em ter Galípolo como seu representante mais importante dentro da autoridade monetária contra a qual tem lutado desde que assumiu o cargo em janeiro.

O Senado aprovou na terça-feira (4) as nomeações de Galípolo e Ailton Aquino para ocupar cargos de diretor e que dão a eles voz sobre a taxa básica de juros, que permanece em 13,75%, maior patamar em seis anos.

A mudança é o passo inicial na primeira transição de poder do banco desde a promulgação da lei que garante a autonomia do BC, em 2021. Seis meses depois de uma disputa pública com a instituição dominada por diretores nomeados por seu antecessor, Lula começará a moldar o futuro da casa. Mais duas vagas devem ser abertas na diretoria de nove membros em dezembro. O presidente, Roberto Campos Neto – alvo de grande parte da ira de Lula – e outros dois diretores deixarão o cargo no final de 2024.

Galípolo, ex-presidente do Banco Fator, de 41 anos e braço direito do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, está no centro de tudo. Sua condição de queridinho de Lula e principal interlocutor dos investidores, junto com a expectativa de que ele seja o sucessor de Campos Neto, deixou os analistas em busca de pistas sobre como ele vai lidar com o cargo de diretor de política monetária.

Alguns esperam que ele desempenhe o papel de mediador que assumiu durante a eleição presidencial do ano passado e mais tarde como número dois da Fazenda. Outros temem que ele faça parte do esforço de Lula para exercer o tipo de influência política sobre o banco que a nova lei procura prevenir.

A abordagem que ele adota moldará o futuro imediato da política monetária brasileira. Também pode fornecer uma indicação de como será na prática a recém-conquistada autonomia do Banco Central – questionada por Lula.

A maioria dos analistas concorda que Galípolo adotará uma postura menos restritiva em relação à política monetária do que os atuais membros do Copom, especialmente se os juros se mostrarem um limitador ao crescimento.

Ele parece que vai focar mais no crescimento e ser mais flexível em seu apoio à meta de inflação, o que o torna estruturalmente mais “dovish” (favorável a juros mais baixos), disse Natália Victal, economista-chefe da Sul América Investimentos, de São Paulo.

Tanto Galípolo quanto Campos Neto minimizaram a importância de sua indicação, especialmente em meio a expectativas crescentes que os cortes nas taxas começarão em breve. Em entrevista, Galípolo argumentou que queria ajudar o governo a “alinhar a política monetária e a política fiscal”, não reformular a postura do banco.

“Meu papel é estabelecer diálogo e construir pontes”, disse ele à Bloomberg News em junho. “Tenho um ótimo diálogo com a diretoria do Banco Central e converso muito com eles.”

Campos Neto argumentou que a presença de Galípolo ajudará a convencer Lula de que a política do banco é conduzida por avaliações técnicas, não por fatores políticos. Desentendimentos, disse ele, fazem parte do processo de estabelecer a credibilidade do banco como uma instituição autônoma.

Ele citou o Banco da Inglaterra, onde os votos divididos são comuns. O Federal Reserve, por sua vez, enfrentou disputas internas, crítica de republicanos e democratas, e perdeu confiança do público. Mas sua independência perdura.

“Temos diretores que vão entrar no Copom com opiniões diferentes, e isso faz parte do jogo, faz parte dos ganhos institucionais”, disse Campos Neto em entrevista à imprensa na semana passada. “Faremos uma comunicado que reflita um consenso e detalharemos o debate em nossas atas. Mas tudo será feito de forma técnica.”

Nem todo mundo é tão otimista. A crítica de Lula à lei de autonomia e pedidos para que o Senado responsabilize Campos Neto geraram preocupação com a autonomia do banco e levaram a comparações com governos anteriores do Partido dos Trabalhadores.

Sob o comando da ex-presidente Dilma Rousseff, o governo defendeu taxas mais baixas mesmo quando os preços ao consumidor estavam em alta, e a reação do banco gerou especulações de que estava buscando uma taxa de inflação próxima do topo de sua faixa de tolerância. A desconfiança na política monetária fez com que os analistas mantivessem as expectativas de inflação acima das metas, o que acabou levando a fortes aumentos nas taxas de juros e à recessão.

“Galípolo está entrando com uma missão”, disse Alexandre Schwartsman, que esteve na diretoria durante o primeiro mandato de Lula e se preocupa com a repetição da era Dilma Rousseff. “A política monetária não terá como objetivo reduzir a inflação. Em vez disso, servirá à agenda política do governo”.

Galípolo evitou críticas às atuais taxas de juros durante sua audiência no Senado. Mas os comentários sobre a autonomia levantaram dúvidas sobre sua visão da autoridade monetária, que ele disse precisar respeitar o “poder eleito democraticamente”.

“A autonomia do banco central é muitas vezes entendida como se fosse uma autonomia do processo democrático”, disse ele. “É preciso entender que é óbvio que é o poder democraticamente eleito, a vontade das urnas, que determina o destino econômico de nossa sociedade.”

Alteração de cenário

Ao contrário de muitos aliados próximos de Lula, Galípolo não vem das fileiras do Partido dos Trabalhadores ou tem um relacionamento de décadas com o presidente. Apesar de ter laços com outros integrantes do partido, Galípolo só conheceu Haddad em 2020, graças a um amigo em comum.

Ele é um entusiasta tanto do uso de recursos do governo para impulsionar o crescimento quanto de parcerias e concessões público-privadas.

“Parece haver uma ansiedade na economia para tentar identificar a linha de pensamento de uma pessoa”, disse ele. “Eu me identifico com várias pessoas diferentes. Eu me identifico, por exemplo, com Fernando Haddad. Prefiro não ser colocado em uma caixa.”

Como número dois da Fazenda, Galípolo participou da elaboração de políticas que ajudaram a acalmar os temores dos investidores sobre este governo. Ele está confiante de que o plano está funcionando.

“O fato é que o câmbio está em outro patamar, valorizou bastante. As taxas de juros de longo prazo estão caindo, a inflação está caindo”, afirmou. “Tudo isso demonstra um cenário positivo para a economia.”

O cenário para o Brasil mudou desde que os analistas receberam a nomeação de Galípolo em maio com temores de que isso pudesse levar a cortes prematuros da Selic. A inflação recuou para dentro do intervalo da da meta, e empresários e parlamentares se juntaram a Lula nos apelos para um início imediato de um ciclo de flexibilização. Muitos analistas agora preveem que começará em agosto, coincidindo com a primeira reunião da qual participará Galípolo.

“Campos Neto está vencendo a batalha da inflação e as coisas estão indo na direção certa depois de seus pedidos de paciência e serenidade”, disse Silvia Matos, economista da Fundação Getúlio Vargas. “Sempre há riscos de mais leniência com a inflação, mas temos que ver como Galípolo se comporta.”

Galípolo está se juntando a um Copom que Campos Neto descreveu como “muito dividido” em sua última reunião, com o chefe do banco prevendo que decisões divididas – algo incomum em um banco tradicionalmente centrado nas opiniões de seu presidente – estão no horizonte.

Os mandatos sobrepostos da lei de autonomia podem estar transformando-a em uma instituição mais parecida com a autoridade monetária do México, cujos diretores muitas vezes expressam publicamente opiniões opostas.

“Faz parte do processo de adaptação a um banco central independente”, disse Caio Megale, economista da XP Investimentos em São Paulo. “A primeira novidade foi ter um presidente que não foi escolhido pelo presidente da República, e agora teremos a segunda novidade que é ter um diretor de banco que não está 100% alinhado com seu chefe. Mas isso é comum entre outros bancos centrais.”

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