Com a discussão sobre um possível flerte do presidente Jair Bolsonaro e de parte de seus apoiadores com o autoritarismo e o fascismo na ordem do dia, turbinada segundo o jornal Estado de SP, pelo inquérito que corre no Supremo Tribunal Federal (STF) para apurar a realização de atos considerados antidemocráticos, um novo livro dedicado ao integralismo promete esquentar ainda mais o debate sobre a questão.
Intitulado O Fascismo em Camisas Verdes – do Integralismo ao Neointegralismo, o livro vai além da história do movimento criado pelo político e escritor Plínio Salgado, em 1932, e procura relacioná-lo com o presidente, os bolsonaristas e os grupos de extrema direita que surgiram no País nos últimos anos.
Numa manobra arriscada, os historiadores Odilon Caldeira Neto e Leandro Pereira Gonçalves, professores da Universidade Federal de Juiz de Fora (MG) e autores de outros títulos sobre o tema, misturam acontecimentos longínquos, cuja análise é favorecida pela ação do tempo, com fatos atuais, cujos desdobramentos ainda estão por se revelar em toda a sua extensão.
Em nome da atualidade da obra, cujo lançamento da edição digital está marcado para a próxima terça-feira, eles resolveram encarar o desafio, mesmo sem ter o distanciamento que costuma permitir uma melhor compreensão dos acontecimentos históricos e do papel desempenhado por seus protagonistas.
Ao final, porém, podem ter chegado a conclusões precipitadas, ao concluir que Bolsonaro carrega os genes do integralismo e do fascismo, presentes também nos grupos neointegralistas. Mesmo levando em conta que, de um jeito ou de outro, Bolsonaro está participando do jogo democrático, eles o colocam na extrema-direita do espectro ideológico, lado a lado com os neointegralistas, defensores da mudança do regime, com a adoção do chamado Estado integral, formado por representantes de categorias profissionais, como pregava Plínio Salgado nos velhos tempos.
Para os autores do livro, Bolsonaro já deu diversas demonstrações ao longo de sua trajetória política que o afastam até do que eles classificam de direita radical e o aproximam dos integralistas e da extrema direita, como o apoio ao regime militar, o anticomunismo, o antidemocratismo e o conservadorismo na área de costumes. A crítica à “velha política”, presente em seu discurso de campanha e hoje deixada de lado, em razão da aliança firmada com o Centrão, é outro ponto que reforça, na visão dos autores, sua identificação com os integralistas em seus primórdios, quando se levantavam contra as forças políticas tradicionais.
É preciso levar em conta, porém, que a política econômica liberal praticada pelo ministro Paulo Guedes pouco ou nada tem a ver com o nacionalismo e o protecionismo defendidos pelos integralistas ou neointegralistas. São, aliás, motivo de rusgas com Bolsonaro. O mesmo se pode dizer em relação à aproximação do Brasil com os Estados Unidos e com Israel, promovida pelo atual governo, alvo de críticas contundentes dos neointegralistas. Ao contrário da maior parte dos grupos que reivindicam a herança do integralismo, que sempre cultivou um sentimento antissemita, principalmente as correntes mais identificadas com o advogado e escritor cearense Gustavo Barroso, Bolsonaro também, ao que se sabe, não costuma colocar os judeus como a razão de todos os males do mundo.
Hoje em dia, o termo fascismo perdeu muito de seu significado original. Os traços autoritários de Bolsonaro e de muitos de seus seguidores podem ser observados a olho nu. Provavelmente, as ideias e as posturas de Bolsonaro tenham pontos em comum com as dos integralistas. Agora, também há divergências, que o afastam do grupo. Carimbar o presidente como fascista pode ser compreensível no jogo político, por parte de seus adversários. Agora, do ponto de vista histórico, ainda é algo que está por se confirmar.