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Vista área do Tribunal de Justiça da Bahia — Foto: Divulgação/TJ-BA
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quinta-feira 22 de agosto de 2024 às 06:16h

Jornalistas formaram organização criminosa e desviam dinheiro doado, afirma MP-BA

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As 12 pessoas denunciadas pelo Ministério Público da Bahia (MP-BA) por envolvimento no caso conhecido como “Golpe do Pix” formaram uma organização criminosa para desviar e lavar dinheiro que deveria ser repassado para pessoas em situação de vulnerabilidade social. As informações são de Valma Silva e Ilana Pepê, do portal g1.

O g1 acessou a denúncia oferecida pelo Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas e Investigações Criminais (Geaco) do MP-BA para a 9ª Vara Criminal da Comarca de Salvador . Os documentos trazem detalhes sobre a forma como o grupo agia. [Confira abaixo]

Em uma decisão datada de 12 de agosto de 2024 e assinada pelo magistrado Eduardo Afonso Maia Caricchio, é apontado que as pessoas se juntaram para obter vantagem mediante a prática de infrações penais. São elas:

  • Lucas Costa Santos, 26 anos
  • Jakson da Silva de Jesus, 21 anos
  • Daniele Cristina da Silva Monteiro, 27 anos
  • Débora Cristina da Silva, 27 anos,
  • Rute Cruz da Costa, 51 anos
  • Carlos Eduardo do Sacramento Marques Santiago de Jesus, 29 anos
  • Gerson Santos Santana Junior, 34 anos
  • Eneida Sena Couto, 58 anos
  • Thais Pacheco da Costa, 27 anos
  • Alessandra Silva Oliveira de Jesus, 21 anos
  • Marcelo Valter Amorim Matos Lyrio Castro, 36 anos
  • Jamerson Birindiba Oliveira, 29 anos

Foi através dos jornalistas Marcelo Castro e Jamerson Oliveira que o caso ganhou repercussão em maio de 2023 e ficou conhecido como “Golpe do Pix”. O g1 entrou em contato com Marcus Rodrigues, advogado dos dois, mas não obteve retorno. Além disso, tenta localizar a defesa das outras pessoas.

Conforme o documento judicial, “foi imputado aos réus a prática dos crimes de apropriação indébita, lavagem de dinheiro e associação criminosa”. Entretanto, a vara afirma que trata-se, “na verdade e a princípio, de uma organização criminosa”.

A decisão destaca que a organização criminosa possui uma disposição mais hierárquica e organizada, enquanto a associação tem uma estrutura mais simples. Diante do exposto pelo MP-BA, a justiça considerou que o grupo formou uma organização, avaliada como estruturalmente complexa, muito ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas.

Por esses motivos, o juiz titular da 9ª Vara Criminal da Comarca de Salvador determinou a remessa dos autos para que a Vara dos Feitos Relativos a Delitos Praticados por Organização Criminosa da capital baiana siga com os procedimentos, tendo em vista que o caso necessita ser acompanhado por uma unidade especializada.

Como cada um atuava

Os valores desviados foram arrecadados através de entrevistas exibidas no programa “Balanço Geral Bahia”, na emissora TV Record/Itapoan, que não é alvo da ação. As apurações apontam que aproximadamente R$ 410 mil deixaram de ser entregues aos que participaram das reportagens e seriam beneficiados. [Veja detalhes abaixo]

No dia 20 de junho de 2023, Marcelo, Jamerson e Lucas foram indiciados pela Polícia Civil, pelos crimes de estelionato, associação criminosa e lavagem de dinheiro. Mais de 40 pessoas prestaram depoimento.

Em 9 de agosto de 2024, o MP-BA denunciou os envolvidos. No documento remetido à Justiça o Gaeco menciona o inquérito policial, que aponta que eles agiram “de forma consciente e devidamente ajustadas ao propósito criminoso, se associaram para o fim de cometerem crimes contra pessoas em estado de vulnerabilidade social, as quais tinham seus dramas pessoais ou familiares exibidos em um quadro do programa de televisão”.

O MP concluiu que Marcelo e Jamerson eram os líderes da organização. O primeiro, na condição de repórter, entrevistava as vítimas narrando dramas, pedia doações e informava o número de uma chave Pix, que aparecia na tela para que as pessoas recebessem as contribuições, mesmo sabendo que estas não pertenciam aos entrevistados, e sim a terceiros.

Jamerson, então editor-chefe do programa, era responsável pela transmissão, oportunidade em que autorizava a inserção e a exibição da chave Pix destinada ao recebimento das doações, também ciente de que pertencia a um dos integrantes do grupo criminoso.

Lucas atuava como “operador”, identificando casos para serem exibidos na TV. Ele também foi o responsável por cooptar os outros participantes do esquema e obteve com eles os números das chaves Pix que eram exibidas na TV, bem como das contas bancárias para receberem os valores doados pelos telespectadores.

Todos os envolvidos no esquema tinham algum tipo de relação familiar com Lucas, exceto Jamerson e Marcelo. Ele é filho de Rute, companheiro de Thais, primo de Alessandra, Débora, Daniele e Gerson. Já Gerson é filho de Eneida e companheiro de Débora.

Juntas, essas 12 pessoas se apropriavam indevidamente da maior parte das doações, e destinavam aos donatários “uma ínfima quantia” dentre o total arrecadado. Em seguida, dividiam entre si valores proporcionais à atuação e liderança dentro do grupo.

Jornalista Marcelo Castro é apontado como um dos líderes da organização criminosa — Foto: MP-BA
Jornalista Marcelo Castro é apontado como um dos líderes da organização criminosa — Foto: MP-BA

O Gaeco destaca que as vítimas acreditavam que a chave Pix informada era de titularidade da emissora ou de alguém ligado ao programa, porque essa era a informação repassada por Marcelo Castro quando era questionado por alguém. Sem acesso à informação do montante efetivamente arrecadado, elas satisfaziam-se com os valores recebidos, e apenas tomaram conhecimento da fraude quando os fatos foram divulgados na imprensa.

A TV Record/Itapoan demitiu os dois então funcionários quando os casos vieram à tona. [Veja detalhes abaixo] O g1 entrou em contato com a assessoria de comunicação da emissora e aguarda posicionamento.

Estopim

Os fatos só vieram à público após a apresentação do programa transmitido no dia 28 de fevereiro de 2023, quando foi exibida a situação de uma criança com grave problema de saúde, que precisava de ajuda.

Na oportunidade, houve uma doação realizada por um jogador de futebol aos familiares da vítima. Posteriormente, um assessor dele, que tinha conhecimento da ação, assistiu ao programa e constatou que a Chave Pix exibida na transmissão divergia da utilizada na doação feita pelo atleta. Ao simular uma transação, foi constatada divergência de titularidade das chaves.

“Ele descobriu que aquela chave PIX era de uma pessoa que desenvolvia a atividade de rifeiro. Como ele queria fazer essa doação, desconfiou e conseguiu o telefone da mãe da criança com câncer. Foi feito um acerto de que doação seria feita diretamente para ela, não para aquela chave”, contou, há alguns meses, o delegado Charles Leão, responsável pelas investigações.

A partir disso, o fato foi levado ao conhecimento da direção da emissora, que realizou procedimentos internos e identificou outros casos semelhantes. Conforme o MP, foi a própria TV Record/Itapoan que procurou a polícia, e então foi iniciada a apuração.

Caso com criança doente foi o primeiro a ser descoberto no esquema fraudlento  — Foto: MP-BA
Caso com criança doente foi o primeiro a ser descoberto no esquema fraudlento — Foto: MP-BA

De acordo com o Gaeco, as investigações realizadas pela Polícia Civil demonstram que além da situação que deu origem às investigações, outros 11 casos semelhantes foram identificados, seguindo exatamente o mesmo modo de ação do grupo criminoso.

Em todos os 12 fatos investigados e imputados na denúncia do MP, ocorreram participações “efetivas e estáveis” de Marcelo, Jamerson e Lucas. Os outros se alternaram na execução, inclusive de forma estratégica, para não apresentarem movimentação financeira volumosa nas contas bancárias e serem identificados por órgãos de controle. Alguns atuaram em um caso, enquanto outros, em dois ou mais.

Ainda segundo o Gaeco, o primeiro programa em que houve a apropriação indevida de parte dos valores doados às vítimas foi transmitido em 8 de setembro de 2022.

Durante todo o período da fraude, o grupo arrecadou mais de R$ 540 mil em doações, que deveriam ser totalmente repassadas às vítimas. Apesar disso, apenas 75% do valor foi repassado, o que equivale a aproximadamente 136 mil.

Em um dos casos exibidos no programa, por exemplo, foram arrecadados R$ 64.127,44. Desse valor, eles se apropriaram de R$ 57.591,26 e repassaram apenas R$ 6.536,18 às vítimas.

O MP requer seja fixado, no total, a quantia de R$ 607.143,78 a serem pagos pelos envolvidos, para reparação dos danos.

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