Cidade em Gaza é último bastião de “terroristas do Hamas”, mas também abrigo para mais de 1 milhão de refugiados palestinos. Campanha militar israelense é alvo de críticas, planos de evacuação segura provocam ceticismo. Na noite de domingo (11), acobertadas por bombardeios aéreos em massa, as forças militares de Israel realizaram um ataque de surpresa à cidade de Rafah, na Faixa de Gaza sitiada, libertando dois israelo-argentinos, sequestrados pelo grupo islamista palestino Hamas durante os atentados do 7 de outubro.
O presidente da Argentina, Javier Milei, agradeceu a Israel pelo resgate dos reféns. Segundo as autoridades sanitárias de Gaza, os ataques aéreos teriam matado 67 civis palestinos ou mais, além de arrasar diversos edifícios residenciais e pelo menos uma mesquita.
Em entrevista à rede de TV americana ABC News, o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, anunciou que pretende “atingir os demais batalhões terroristas de Rafah, que é seu último bastião”. Isso indicaria a iminência de uma incursão terrestre em massa. Planos nesse sentido têm suscitado crítica internacional a Israel, com agências humanitárias e aliados-chave apelando por moderação.
Por que Israel lançou uma campanha militar em Gaza?
O grupo militante Hamas é classificado como organização terrorista pelos Estados Unidos, União Europeia, Israel, Alemanha e outros. Em 7 de outubro de 2023, ele lançou uma série de ataques-surpresa sobre Israel, a partir da Faixa de Gaza. Além de provocar 1.200 mortes, segundo estimativas israelenses, na ocasião o Hamas levou para Gaza cerca de 240 reféns.
Tel Aviv reagiu com uma ofensiva aérea e terrestre contra o Hamas nesse enclave, parte da qual está sob o controle do grupo islamista desde 2007. Até o momento, segundo o Ministério da Saúde de Gaza, administrado pelo Hamas, a campanha militar matou mais de 28 mil palestinos, e 1,9 milhão de civis foram forçados a deixar suas casas. A ONU calcula que 85% dos palestinos residentes em Gaza foram deslocados internamente.
Qual seriam os efeitos de uma ofensiva terrestre para a população de Rafah?
Desde 7 de outubro, Israel tem expandido gradualmente suas operações terrestres na Faixa de Gaza em direção ao sul, deixando Rafah como um dos últimos refúgios para mais da metade dos 2,3 milhões palestinos que tentam escapar da violência.
A população da cidade, que era de 300 mil antes da guerra, explodiu para 1,5 milhão. Muitos refugiados vivem em acampamentos improvisados e abrigos das Nações Unidas.
Rafah se localiza ao longo da fronteira com o Egito, adjacente à única passagem ainda parcialmente acessível da Faixa de Gaza sitiada. Cairo vem reforçando sua segurança de fronteira, por temores de que as operações israelenses causem migração em massa dos habitantes de Gaza para seu território.
No domingo, o ministro do Exterior egípcio, Sameh Shoukry, alertou que uma continuação da escalada em Rafah teria “consequências desastrosas”. Caso a ofensiva terrestre prossiga, seu governo ameaça retirar-se de um acordo de paz com Tel Aviv, vigente há décadas.
Há zonas seguras no norte de Gaza?
Neste ínterim, o premiê Netanyahu anunciou que os palestinos dispostos a abandonar Rafah teriam “passagem segura” para “áreas que liberamos” ao norte da cidade, acrescentando que “estamos elaborando um plano detalhado”, cujos componentes ainda não foram divulgados.
Não está esclarecido onde essas zonas seguras se localizariam, se seriam adequadas a acolher centenas de milhares de refugiados e como se garantiria passagem segura para eles.
O centro de satélites das Nações Unidas Unosat estima que 30% de todas as estruturas de Gaza foram danificadas desde o início da campanha militar israelense contra o Hamas. O “acréscimo mais significativo de danos” seria na província do centro-norte de Gaza e na de Khan Yunis, no sul.
Segundo outra estimativa, por Corey Scher, da Universidade da Cidade de Nova York, e Jamon van den Hoek, da Universidade do Estado de Oregon, mais da metade dos prédios de Gaza estaria destruída.
Como os EUA se manifestam sobre uma ofensiva a Rafah?
No domingo, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, disse a Netanyahu que “uma operação militar em Rafah não deve proceder sem um plano plausível e executável para assegurar a segurança e apoio aos mais de 1 milhão lá abrigados”.
Apesar de os EUA virem assistindo Israel em sua campanha para erradicar o Hamas, nas últimas semanas o democrata tem repetidamente apelado por moderação. Em dezembro, ele já advertira que Tel Aviv arriscava perder respaldo devido ao “bombardeio indiscriminado” no enclave palestino. Em fevereiro, Biden comentou a jornalistas que “a conduta da reação na Faixa de Gaza está passando da conta”.
Qual é a reação da União Europeia?
O encarregado de política externa da União Europeia, Josep Borrell, se manifestou apreensivo de que uma ofensiva israelense por terra contra Rafah possa acarretar “uma catástrofe humanitária indescritível e graves tensões com o Egito”. “Retomar as negociações para libertar os reféns e suspender as hostilidades é a única maneira de evitar um banho de sangue”, escreveu no sábado, no X (ex-Twitter).
Em coletiva de imprensa na segunda-feira. Borrell expressou ceticismo quanto às promessas de Netanyahu de retirar os civis de Rafah: “Eles vão evacuá-los… para onde? Para a Lua?”
Uma ofensiva a Rafah afetará as negociações sobre os reféns?
No último fim de semana, uma autoridade do Hamas afirmou que uma ofensiva terrestre israelense “detonaria” as negociações em curso para a libertação dos reféns.
Dos cerca de 240 reféns de Israel sequestrados em 7 de outubro, 112 já foram libertados. Já de outros cerca de 130 nem o paradeiro se sabe. Autoridades israelenses creem que 30 deles estejam mortos.