As alegações do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de que o primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, lhe pediu um acordo “emergencial” para diminuir a escassez de um produto alimentício não especificado “não condizem com a lembrança dos eventos”, informou o gabinete do premiê britânico à BBC News Brasil.
Nos bastidores, contudo, o entendimento é de que o governo britânico trata as declarações de Bolsonaro como falsas.
Johnson e Bolsonaro se encontraram na semana passada, quando ambos viajaram a Nova York, nos Estados Unidos, para a Assembleia-Geral das ONU (Organização das Nações Unidas).
Durante a reunião, Johnson falou a Bolsonaro sobre os benefícios da vacina da AstraZeneca contra a covid-19, desenvolvida no Reino Unido.
Bolsonaro respondeu dizendo que não havia sido vacinado. Três dos integrantes de sua comitiva receberam diagnóstico positivo para o novo coronavírus — o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, um diplomata que havia viajado a Nova York antes para organizar a viagem do presidente brasileiro e o filho do presidente, deputado Eduardo Bolsonaro. Queiroga já havia tomado as duas doses do imunizante, enquanto o diplomata, apenas a primeira.
‘Acordo emergencial’
Em sua live semanal a apoiadores na quinta-feira (23), Bolsonaro disse que Johnson lhe pediu um acordo emergencial para importar “algum tipo de mantimento nosso que está em falta na Inglaterra”.
“Ele quer um acordo emergencial conosco para importar algum tipo de mantimento nosso que está em falta na Inglaterra. Então, a inflação veio para todo mundo depois do ‘fique em casa, a economia a gente vê depois’, e alguns países estão com falta de alimento. Essa batata eu já passei lá para a dona Tereza Cristina (ministra da Agricultura)”, afirmou o presidente brasileiro, sem mencionar a qual produto Johnson teria se referido.
As especulações são de que o produto não especificado possa ser carne de peru. O Brasil é um dos maiores produtores mundiais dessa matéria-prima.
Na mesma transmissão para as redes sociais, Bolsonaro também falou que Johnson lhe pediu para facilitar as importações de uísque para o Brasil.
O Reino Unido passa por uma crise de desabastecimento e há fortes preocupações sobre uma possível escassez de alimentos nas prateleiras dos supermercados no período que antecede o Natal.
A isso se deve uma combinação de fatores, entre os quais falta de funcionários para preencher vagas importantes da cadeia alimentícia, sobretudo motoristas de caminhão, além de problemas na oferta de CO2, usado para o abate de animais e criar gelo seco para manter os alimentos frescos.
O Brexit — a saída do Reino Unido da União Europeia — e a covid-19 seriam os principais culpados pela atual crise.
O governo britânico pediu à população que não estocasse produtos, como aconteceu no início da pandemia do coronavírus, após o anúncio da BP de que pode haver falta de combustível em alguns postos de gasolina.
Algumas das maiores redes de supermercados britânicas — como Tesco e Iceland — já haviam feito o mesmo apelo, apesar de confirmarem que o setor passa por um “momento de alerta”.
Na semana passada, a gigante americana CF Industries decidiu interromper as operações de suas duas fábricas de fertilizantes no Reino Unido, que respondem por 60% da produção nacional de CO2, sob a alegação de que os preços em alta do gás natural as tornaram não lucrativas.
Para evitar um colapso do setor de alimentos e bebidas, que depende dessa matéria-prima, o governo britânico decidiu intervir na empresa. A retomada das operações deve levar “vários dias”.