Quem passou dias às escuras em São Paulo, graças ao errático serviço da distribuidora de energia Enel, sabe o que é ser prisioneiro da ineficiência de uma concessionária de serviço essencial. O mesmo ocorre para quem tenta trocar de plano de celular e percebe que as únicas três operadoras que atuam no mercado brasileiro praticam (curiosamente!) preços e pacotes quase idênticos. E o que dizer daqueles que buscam crédito para financiar um imóvel e acabam reféns da burocracia do mesmo punhado de bancões, que dá pra contar nos dedos de uma única mão?
A concentração de mercado, o monopólio ou a falta de concorrência são alguns dos principais obstáculos para um desenvolvimento mais acelerado das economias da América Latina e Caribe, segundo estudo do Banco Mundial. O levantamento conclui que o ambiente de negócios da região, onde Brasil é a maior economia, é marcado por um forte contraste entre algumas grandes empresas que dominam os determinados setores, o filé mignon, e inúmeras pequenas empresas que disputam o osso que sobra. Atualmente, 70% dos trabalhadores são autônomos ou trabalham em empresas com menos de dez funcionários, dedicando-se, em sua maioria, a atividades de baixa produtividade.
Na avaliação do vice-presidente do órgão para a região, Carlos Felipe Jaramillo, é preciso buscar estratégias para contornar essa situação, já que o fraco crescimento se torna, com o tempo, uma barreira crônica para o desenvolvimento. “O baixo crescimento econômico se transforma em serviços públicos reduzidos, poucas oportunidades de emprego, salários baixos e mais pobreza e desigualdade”, afirmou Jaramillo. “Se as economias ficam estagnadas, o potencial de sua população é limitado e isso gera pobreza. Precisamos agir de forma decisiva para ajudar a América Latina e o Caribe a sair desse ciclo”, disse o executivo.
Pelas projeções do Banco Mundial, a economia brasileira deve crescer 1,7% em 2024.
• O percentual é menor do que a estimativa para 2023, de 2,9%,
• e mais baixo do que o esperado para 2025, de 2,2%.
Os dados são da equipe do economista-chefe para a América Latina e o Caribe, William Maloney. O levantamento acrescenta ainda que, apesar da existência de agências de regulatórias (como Aneel, Anatel e ANS), a concorrência em muitos países da América Latina e do Caribe é baixa porque a aplicação das leis é considerada frágil. “Isso se dá pois muitas agências não têm recursos financeiros ou não dispõem de pessoal suficiente”, disse Maloney.
Soma-se a isso o inegável fato de que grandes corporações, empresas poderosas e políticos de alta patente influenciam a seu favor as políticas governamentais, prejudicando a eficácia das leis de concorrência. Esses fatores, de acordo com o estudo, criam um ciclo em que poucas grandes companhias influenciam os mercados, e as empresas em geral têm pouco incentivo para inovar.
“Se as economias ficam estagnadas, o potencial de sua população é limitado e isso gera pobreza. Precisamos agir de forma decisiva.”
Carlos Jaramillo, vice-presidente do Banco Mundial
Além de apontar o problema, o Banco Mundial sugere a solução.
• No caso da América Latina, as economias terão de adotar estratégias de baixo carbono ou o chamado nearshoring, que consiste em levar a produção para mais perto dos mercados onde os produtos serão vendidos.
• Nesse quesito, o México tem feito a lição de casa, com louvor. Neste ano, pela primeira vez em mais de duas décadas, o país superou a China como maior fornecedor da economia americana. “A melhoria dos sistemas de concorrência vai impulsionar as economias e beneficiar consumidores e empresas”, apontou o estudo.
Outro ponto levantado pelo Banco Mundial como essencial para o desenvolvimento da região é o aprimoramento das estruturas de concorrência com o fortalecimento dos órgãos de regulamentação, apoio a políticas de inovação e o aumento das habilidades gerenciais – ou seja, da qualificação – da força de trabalho. Sem concorrência, definitivamente, não há crescimento.