É comum que dúvidas sejam levantadas sobre se um partido político insere-se no campo da esquerda ou da direita. Especialmente no caso brasileiro a resposta para esse problema é ainda mais complexa, dada a quantidade de legendas que competem nas eleições, atualmente 33 partidos.
Algumas soluções são possíveis. Há cientistas políticos que optam por perguntar para os parlamentares onde estes posicionam seus próprios partidos e os partidos dos adversários na escala esquerda-centro-direita.
Outra opção frequente é analisar a composição social do partido, quem são seus quadros e o perfil dos seus eleitores. Partidos que tendem a ter entre seus eleitos empresários estão mais próximos da direita, ao passo que partidos que elegem mais trabalhadores estão mais perto da esquerda.
Há quem prefira analisar a votação dos deputados em matérias específicas que separam as posições de esquerda e direita. Partidos que apoiam privatizações e redução de impostos tendem a ser considerados dentro do espectro da direita. Já aqueles que votam em matérias que defendem o papel do Estado na regulação da economia estariam na esquerda.
Existe ainda quem olhe para como o partido se comporta na eleição, com quem faz alianças: se com mais parceiros de um lado do que de outro do espectro ideológico. Ou quem olhe para o que os partidos dizem de si mesmos através de seus manifestos ou programas de governo.
Uma forma de entender ideologicamente os partidos é também olhar para seus financiadores. Partidos que possuem suas receitas advindas de sindicatos de trabalhadores, por exemplo, estão mais à esquerda do que legendas que recebem doações de associações religiosas, que tendem a estar ligadas à centro-direita. A crítica é que tais classificações são quase sempre realizadas para partidos europeus ou americanos e desconsideram as especificidades do Brasil.
Mas o problema principal é que não há partido que seja absolutamente coerente em suas posições, assim como a maioria dos seres humanos. Então os cientistas políticos costumam criar classificações intermediárias como centro-direita ou centro-esquerda. Há posições predominantes (e não exclusivas) vinculadas mais à direita no primeiro caso e mais à esquerda no segundo. Já os partidos de centro seriam aqueles que mesclam posições ora mais à direita, ora mais à esquerda, sem que ocorra o domínio de uma visão de mundo sobre a outra.
Para solucionar este tipo de dilema, onde exatamente os partidos políticos se posicionam, nós resolvemos perguntar para quem estuda, escreve e publica sobre partidos políticos: os próprios cientistas políticos.
Aplicamos então um questionário para 519 cientistas políticos, residentes no país e no exterior. A pesquisa foi realizada em julho de 2018, antes da campanha eleitoral daquele ano. A partir da resposta de cada um deles para os então 35 partidos existentes no Brasil fizemos a média da posição ideológica dessas legendas. Os respondentes foram instados a classificar os partidos em uma escala de zero a dez, em que zero representava a posição mais à esquerda e dez, mais à direita. As posições de cada partido aparecem na figura abaixo:
A pesquisa foi realizada pelo Laboratório de Partidos Políticos e Sistemas Partidários da UFPR e enseja alguns comentários. O primeiro é que, no momento da pesquisa, o presidente Jair Bolsonaro flertava com o Patriota, o que explica a posição deste sobreposta ao partido mais à direita da escala, o DEM e, também, uma posição mais moderada do PSL.
Quando foi feito o levantamento, a Unidade Popular (UP) não havia sido fundada. Posteriormente, o PRP foi incorporado ao Patriota, o PPL ao PCdoB e o PHS ao Podemos. Além disso, posteriormente a essa pesquisa houveram algumas mudanças de nomes em partidos: o PMDB mudou o nome para MDB, o PPS para Cidadania, e o PR hoje é PL.
Ainda que contemos com a valiosa contribuição da comunidade de Ciência Política, não sustentamos que erros ou equívocos não apareçam nos resultados. O que podemos afirmar é que a pesquisa com experts através de survey apresenta vantagens como contar com conhecimento especializado e despreocupado com pressões políticas como eleições ou votações legislativas. Essa metodologia possui alta validade. Quando comparada com outros métodos para mensurar ideologia, apresenta resultado semelhante.
Por fim, é interessante observar que a o espaço à direita é muito mais povoado do que o lado oposto. Isso não só dificulta posicionar ali os partidos, mas revela também uma indiferenciação muito maior entre as legendas à direita do que entre as que estão no centro e na esquerda.
Nota: Os autores agradecem a Associação Brasileira de Ciência Política (ABCP) pelo apoio à pesquisa.
Bruno Bolognesi é cientista político e professor na UFPR
Ednaldo A. Ribeiro é cientista político e professor na UEM
Adriano Codato é cientista político e professor na UFPR
Esse texto foi elaborado no âmbito do projeto Observatório das Eleições de 2020, que conta com a participação de grupos de pesquisa de várias universidades brasileiras e busca contribuir com o debate público por meio de análises e divulgação de dados.