De maio a junho deste ano, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) realizou sete sessões de julgamento para analisar um só caso: a ação penal contra o ex-presidente da República Fernando Collor. Ao final das discussões e dos votos, Collor saiu condenado por corrupção e ministros da Corte saíram com a certeza de que o julgamento de ações penais precisa mudar. Por isso, vem ganhando força entre diferentes alas do tribunal, segundo relatos feitos a Mariana Muniz, do jornal O Globo, a ideia de fazer com que essas ações voltem a ser julgadas pelas duas turmas e não mais pelo plenário.
Ao longo do último mês, magistrados ouvidos reservadamente pela reportagem afirmam que uma mudança da competência para o julgamento dessas ações está ganhando tração e pode ser implementada ainda na presidência da ministra Rosa Weber, que deixa o Supremo até o mês de outubro. Segundo interlocutores da Corte, a maioria dos ministros, hoje, é favorável à mudança.
Na avaliação destes ministros, que integram diferentes alas dentro do Corte, a modalidade de julgamento das ações penais no plenário provocou uma demora para que mais ações fossem analisadas. Além disso, ressaltam que esses julgamentos são complexos e acabam tomando muito tempo, o que provoca um congestionamento de processos que precisam também ser analisados, mas que, diante do alongamento das discussões, entram e saem da pauta sem conseguirem sequer ser chamados.
Exemplo do engarrafamento causado pelo caso de Collor é a ação que discute a descriminalização do porte de drogas para consumo próprio. Pautado para 21 de maio, o caso saiu e entrou da pauta de todo o mês de junho pelo fato de o debate sobre o ex-presidente se alongar por tantas sessões. Ao final, o processo não chegou a ser analisado neste semestre e acabou ficando para depois do recesso do Judiciário.
Atualmente, existem 21 ações penais em tramitação no STF, duas delas prontas para serem julgadas, dependendo apenas da escolha de uma data pela presidência.
A mudança da atribuição para julgar ações penais foi adotada em outubro de 2020, por iniciativa do presidente do STF, Luiz Fux. Essa alteração mandou todos os casos da Operação Lava-Jato, que antes eram analisados pela Segunda Turma, para o plenário. A nova regra foi debatida administrativamente pela Corte e, na época, foi vista como uma saída para mitigar os resultados desfavoráveis à operação que se acumulavam no órgão fracionado, na época de perfil mais garantista.
Nos bastidores, ministros avaliam que em 2020 havia um contexto favorável para a medida adotada por Fux, quando o Supremo ainda lidava com os impactos da Lava-Jato. Para esses magistrados, a transferência para o plenário “fazia sentido”. Mesmo assim, uma parte dos integrantes da Corte teceu uma série de críticas à mudança que, na prática, retirou poder do colegiado.
Além do caso Collor, desde a mudança do Regimento Interno, em outubro de 2020, o plenário físico julgou pelo menos um caso criminal de grande relevância: o recebimento da denúncia e depois a ação penal do ex-deputado federal Daniel Silveira. Outros casos e incidentes de ações penais e inquéritos (agravos regimentais, embargos) foram julgados no Plenário Virtual, onde não há debate entre os ministros.
O plenário é composto por todos os 11 ministros do STF, embora agora esteja desfalcado com a vaga aberta pela aposentadoria do ministro Ricardo Lewandowski — mas que em breve será ocupada por Cristiano Zanin, já nomeado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e com posse marcada para o dia 3 de agosto.
A Primeira e a Segunda Turma são formadas por cinco ministros cada uma e têm perfis distintos em matéria penal. Enquanto a Primeira é conhecida por ser mais legalista, com resultados mais rigorosos aos réus, a Segunda, mais garantista, prioriza uma interpretação da lei mais favorável a quem está sendo julgado. Apenas o presidente do Supremo não participa de nenhuma das duas turmas.
Caso esta mudança se concretize, não será a primeira vez que o xadrez se desenha em torno das ações penais. Até 2014, o julgamento deste tipo de caso ocorria no plenário, mas em razão do grande volume de processos a Corte mudou a regra, mandando a maioria dos processos criminais para as duas turmas do STF. Esse entendimento mudou em 2018, quando a Corte restringiu o alcance do foro privilegiado, diminuindo assim o número de ações penais e inquéritos analisados na Corte.