Os barracos no Poder Judiciário sempre existiram, mas com os recursos dos princípios da transparência, eles se tornaram mais evidentes. No Supremo Tribunal Federal, os bate-bocas entre ministros são constantes. E no Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), os debates têm sido mais propagados.
Na última terça-feira (10), durante a sessão da 5ª Câmara Cível, um debate foi protagonizado pelo desembargador José Edivaldo Rocha Rotondano e pelo juiz substituto de 2º Grau, João Batista Alcântara Filho.
Na pauta estava um agravo interno de um processo envolvendo a Austrália Empreendimentos Imobiliários. Durante uma licença da desembargadora Márcia Borges, o juiz João Alcântara atuou como substituto no processo. O debate se deu entorno da cessão da substituição como previsto no regimento interno do TJ-BA. A sessão está registrada em vídeo.
Segundo a desembargadora Márcia Borges, o juiz substituto não poderia ter mais acesso aos processos de sua relatoria, pois a substituição encerrou quando retornou de licença. Ela é relatora de três agravos envolvendo a imobiliária, sendo dois físicos e um eletrônico. “O que eu levantei aqui é que meu substituto não poderia ter colocado, ter julgado prejudicado os dois primeiros, porque não foi dado, não colocou em pauta, e agora não pode colocar mais em pauta, porque [ele] não está mais vinculado a processos do meu gabinete”.
Márcia ainda acrescentou que se houvesse embargos declaratórios, era ela quem daria a decisão, pois o regimento interno prevê isso. Ela disse que levantou a questão para não prejudicar o julgamento que foi feito pelo substituto. “Me parece que o substituto disse que estava colocando agora o processo em pauta”. João Alcântara disse que o processo já estava pautado e que havia indicado no voto que, julgando o agravo, se perdia o objeto dos dois primeiros. “O senhor não pode colocar mais, não pode julgar mais, porque cessou a substituição”, pontuou.
O desembargador Rotondano tentou esclarecer que há vinculação do processo. “O que eu quis dizer, desembargadora, que sendo fiel ao regimento, a única vinculação que existe, cessando a convocação, [foi] quando o juiz substituto pediu pauta e prolatou o relatório para a secretaria”, disse, complementando que isso ocorre em qualquer processo. João disse que gostaria de divergir do esclarecimento de Rotondano. “Não é questão de divergir, Dr. É o caso, é o regimento”, pontuou. Foi aí que começou o bate-boca entre os dois magistrados.
O debate foi acalorado a ponto do desembargador Rotondano dizer que foi um dos membros do TJ que atuou na reforma do Regimento Interno e sair da sala da sessão: “acabou, não quero mais ouvi-lo”. João questionou onde estava o “princípio da cortesia”, previsto no Código de Ética da Magistratura.
O presidente da sessão, desembargador Baltazar Miranda, pediu para o juiz substituto retirar um trecho do voto que menciona os outros agravos, para “evitar qualquer tumulto processual”, pois não poderá mais atuar no caso. João disse que acataria a recomendação pelo “princípio da cordialidade”. A desembargadora Márcia Borges comentou que era “um absurdo” o substituto colocar em julgamento dois processos que ele “não conheceu”, pois os processos estavam em sua casa, sem fazer carga. “Por mais que o senhor tenha dito em meu gabinete que é um absurdo desembargador pegar processo no gabinete dele sem carga, eu levei sem carga”, rechaçou. João Alcântara declarou que não abria mão de sua autoridade e disse que, “de jeito nenhum”, indicou ou mencionou as atitudes praticadas pela desembargadora. Como resposta de Márcia, ouviu que ela não lhe “daria essa oportunidade”. “O senhor foi um substituto que eu reneguei no momento que o senhor foi indicado para mim para me substituir”, reclamou.
Por Cláudia Cardozo