O governo recorreu ao modelo chileno como inspiração para o decreto que irá editar com o objetivo de regulamentar o lobby no Brasil. Entre as medidas em estudo, estão a criação de uma central com todas as informações sobre a agenda de representantes do governo e a publicidade de indicações feitas por setores para cargos públicos. O ministro da Controladoria-Geral da União (CGU), Wagner Rosário, afirmou que a intenção é publicar o texto em até 30 dias.
Nesta semana, ele se reunirá com o presidente Jair Bolsonaro para discutir a versão final. “Estamos tentando amarrar um decreto com regras mais claras sobre o que é a representação de interesses”, afirmou o ministro.
O País ainda não possui um marco legal sobre o assunto. No Congresso, a regulamentação da atividade de lobby é discutida há cerca de quatro décadas. Neste período, foram apresentados aproximadamente 30 projetos sobre a matéria.
O decreto do governo prevê um sistema unificado de informações sobre reuniões e audiências marcadas para os gabinetes e palácios da União, com dados detalhados sobre o motivo, hora, local, participantes, quem está sendo representado e qual é o assunto tratado. Além de agregar as agendas, o sistema apresentará mecanismos de busca e filtragens específicas pelos nomes dos lobistas e pelas instituições representadas.
Segundo o ministro, se o agente público receber durante uma audiência um pedido para nomeação de cargo na administração federal, ele deverá registrar a informação na agenda oficial. “Tem de ficar claro para a população quem influenciou nesta decisão.”
Hoje, uma resolução da Comissão de Ética Pública da Presidência da República estipula regras para a divulgação da agenda de ministros e secretários, mas a norma não alcança o presidente. Sem a força do decreto, a resolução é ignorada pela maioria dos órgãos, publicou o jornal Estado de SP.
O sistema também irá distinguir o que é reunião governamental, que envolve apenas representantes do poder público, e audiências concedidas a setores de fora do governo. A estimativa do ministro da CGU é de que a central de informações seja concluída em seis meses. A ideia é adaptar o modelo existente no Chile. “Lá, por exemplo, só entra na agenda uma reunião que foi solicitada pelo lobista. Se a autoridade o convidar, não é publicado. Queremos publicar as duas informações aqui”, disse Rosário.
O ministro esteve no Chile em março, onde assinou termos de cooperação com o governo de Sebastián Piñera. Lá, uma plataforma administrada pelo Executivo apresenta a lista de pessoas físicas ou jurídicas inscritas nos registros de lobistas. Também é possível ter acesso a todas as audiências realizadas pelos governos centrais e municipais, presentes e doações recebidas, além de viagens realizadas por autoridades com financiamento privado.
Segundo Rosário, a inclusão das estatais no escopo do decreto ainda está sendo discutida no governo. A decisão passaria, no entanto, por uma análise de cada conselho administrativo. O ministro ressalta como um complicador o fato de essas empresas atuarem com informações estratégicas de mercado.
Congresso
O governo quer usar o decreto como base para sugerir alterações em um projeto de lei que regulamenta o lobby. Essa proposta apresentada em 2007 pelo deputado Carlos Zarattini (PT-SP) está na pauta do plenário da Câmara e, pelo menos no papel, tramita em regime de urgência.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que sua intenção, “a princípio”, é colocar o projeto que regulamenta o lobby em votação neste ano. Para Zarattini, seu projeto de lei não foi votado até hoje por causa dos “diferentes interesses” em dar mais transparência para a relação entre o setor público e privado. Ele não critica a proposta do decreto pelo governo federal, mas disse que seu alcance seria limitado. “O decreto só chegaria ao Executivo Federal. Para alcançar o Legislativo, é preciso aprovar a lei.”
O ministro da CGU pretende participar de conversas com parlamentares nas próximas semanas para apresentar sugestões. Rosário afirmou que o projeto de lei está focado em definir o que é a atividade do profissional do lobby e deixa de lado avanços que precisariam ser feitos na transparência da relação entre o público e o privado. “Uma lei que diz que o profissional tem de ser correto, não serve para nada. O que serve são informações claras e acessíveis para o cidadão.”
O projeto estabelece que qualquer pessoa pode exercer a atividade de lobista, incluindo instituições e órgãos públicos, além de entidades representativas de interesses coletivos ou de setores econômicos e sociais. O texto defende que a representação de interesses nos processos de decisão política é atividade legítima que visa a contribuir para o equilíbrio do ambiente normativo e regulatório do País.
Os lobistas terão de se cadastrar nos órgãos em que atuarão e portar crachás. Fará parte do escopo da atividade apresentar sugestões de emendas, substitutivos, requerimentos no âmbito do processo legislativo ou regulatório. Eles também poderão fornecer relatórios e estudos que embasem alguma decisão. O projeto também trata das agendas oficiais de autoridades públicas, com a determinação de que encontros com lobistas sejam publicados.