A escalada autoritária do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), com ataques ao STF (Supremo Tribunal Federal) e incitação ao descumprimento de decisões judiciais, deve aproximar mais partidos do campo da oposição e acelerar a definição de blocos partidários de olho nas eleições de 2022.
Conforme a Folha de S. Paulo, o novo degrau na radicalização impulsionou movimentos mais claros nos partidos em torno do impeachment, intensificou o debate sobre a necessidade de união partidária e escancarou os rachas existentes em partidos onde há setores ligados ao bolsonarismo.
O primeiro movimento foi feito pelo PSDB. Um dia após os protestos bolsonarista de raiz golpista do 7 de Setembro, a legenda se colocou formalmente na oposição a Bolsonaro após reunião da Executiva Nacional e informou que vai iniciar discussões sobre o impeachment.
Presidenciáveis como o governador de São Paulo, João Doria, e o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, se anteciparam ao debate e anunciaram apoio ao impeachment do presidente. Mas a posição sofre resistência de parlamentares ligados a Bolsonaro, que se ancoram em benesses como o pagamento de emendas e cargos na estrutura do governo federal.
O novo cenário político, contudo, deve aprofundar o isolamento dos bolsonaristas do PSDB – setores do partido já falam em expulsão de parlamentares aliados do presidente.
Com a decisão de migrar para a oposição, o PSDB se junta a Cidadania e PV entre os partidos de centro que estarão em campo oposto ao de Bolsonaro. O Solidariedade também desceu do muro e anunciou apoio ao impeachment.
Em uma tentativa de construir um bloco oposicionista descolado da esquerda, o PSDB deve intensificar conversas com esses partidos e tenta atrair outras legendas como o MDB. Mas a tarefa não é simples.
PSDB e MDB têm aproximação em São Paulo e no Rio Grande do Sul, mas os emedebistas têm em seus quadros bolsonaristas convictos que participaram dos atos com pautas antidemocráticas e aliados do PT em estados do Nordeste.
Entusiasta de uma terceira via, a direção nacional do MDB subiu o tom nas críticas a Bolsonaro em uma nota assinada pelo presidente Baleia Rossi e em declarações da senadora Simone Tebet, pré-candidata do partido ao Planalto.
Por outro lado, o partido viu o ex-presidente Michel Temer (MDB) ser o principal fiador da carta de Bolsonaro de quinta-feira (9) na qual ele afirma que não teve “nenhuma intenção de agredir quaisquer dos Poderes” e atribui palavras anteriores ao “calor do momento”.
O PSD, que já vinha em um processo de descolamento de Bolsonaro, deu um passo além após o 7 de Setembro com a instalação de uma comissão para avaliar uma possível adesão ao impeachment. Mas não deve embarcar nas manifestações contra o presidente.
“Entendemos que a continuidade desse governo não é o melhor para o Brasil e, por isso, teremos candidato próprio à Presidência. Mas jamais vamos trabalhar contra o Brasil”, afirma o presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab.
De olho na eleição presidencial do próximo ano, o partido joga sozinho em sua raia e trabalha para filiar o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM), para ser candidato à Presidência. Mas mantém canais abertos com PSDB, PDT e até mesmo com setores do PT.
Internamente, há uma expectativa de que Pacheco ganhe mais protagonismo em meio à radicalização de Bolsonaro.
Na bancada, a avaliação é que a temperatura baixou após a promessa de pacificação do presidente. Com perfil de oposição, o senador Otto Alencar (BA) diz que o PSD não defende o impeachment, mas se mantém vigilante.
“Ninguém deseja o impeachment, mas o presidente pede. Todas as crises são gestadas no Palácio do Planalto. O presidente vive de ataque, parece uma cantiga de grilo, um samba de uma nota só”, afirma Alencar, que faz parte da ala do partido que deve apoiar Lula na eleição de 2022.
Entre os partidos de esquerda, a avaliação é que a escalada autoritária do presidente pode se tornar um fator de aglutinação, consolidando um sentimento de que derrotar Bolsonaro deve ser prioridade entre os partidos de oposição.
“Bolsonaro fez uma aposta inconsequente e saiu menor. O movimento de oposição ficou muito forte e não vai recuar por causa de uma carta”, avalia o deputado federal Marcelo Freixo (PSB-RJ), líder da minoria na Câmara dos Deputados.
Neste campo, a candidatura mais forte é a do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que trabalha para formar um bloco que inclua PSB, PC do B e PSOL, além de setores de partidos como o PSD e MDB.
O campo da centro-esquerda ainda tem o PDT do presidenciável Ciro Gomes, que após o 7 de Setembro acelerou o processo de expurgo de quadros alinhados a Bolsonaro.
Na Bahia, por exemplo, o partido abriu na quarta-feira (8) o processo de expulsão do deputado federal Alex Santana e do deputado estadual Samuel Júnior. Ambos são ligados à Assembleia de Deus e participaram dos atos com pautas antidemocráticas no 7 de Setembro.
Ao mesmo tempo, a decisão do PDT e de Ciro de participar dos protestos pelo impeachment deste domingo (12) estreita as pontes com o eleitorado da direita antibolsonarista.
Com perfil mais à direita e com quadros alinhados ao bolsonarismo, DEM e PSL tentam consolidar um outro bloco e emitiram uma nota conjunta com críticas a Bolsonaro após o 7 de Setembro na qual repudiam o discurso de Bolsonaro.
A nota foi a primeira ação conjunta das duas legendas que estudam uma fusão para formar o partido de maior bancada da Câmara dos Deputados e se cacifar para a eleição presidencial.
O DEM apresenta para a disputa da Presidência os nomes do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta (MS) e de Rodrigo Pacheco. A aposta do PSL é o apresentador José Luiz Datena (SP).
Os partidos dialogam nacionalmente com siglas como MDB e PSDB. No caso do DEM, também há pontes com o PDT de Ciro Gomes em estados do Nordeste como Bahia, Ceará e Pernambuco.
O presidente Bolsonaro, que ainda está sem partido para a sucessão de 2022, manteve no seu entorno o núcleo duro do centrão formado por PP, Republicanos e PL, além de ter o apoio incondicional de legendas como o PTB, que adotou uma agenda extremista.
A tendência é que, independentemente da radicalização de Bolsonaro, o núcleo duro do centrão permaneça na base de apoio do presidente até o próximo ano, quando cada partido fará uma análise de cenário para decidir sobre as eleições. Nenhuma dessas siglas condenou os atos de raiz golpista.
Ainda orbitam em torno do presidente setores de partidos como Podemos e Novo. Este último declarou oposição ao governo em março deste ano, mas parte da bancada segue alinhada a Bolsonaro.
O Podemos, que congrega deputados e senadores ligados ao lavajatismo, emitiu uma nota na última quarta na qual defende uma convergência em torno de uma terceira via, mas descarta apoiar o impeachment do presidente.