O parecer do senador Marcelo Castro (MDB-PI) sobre o Novo Código Eleitoral, protocolado na última quarta-feira (20), mantém trechos aprovados pelos deputados que, segundo especialistas em transparência partidária, devem restringir a atuação da Justiça Eleitoral na fiscalização e no acompanhamento das contas.
Entre as mudanças, estão a restrição da auditoria feita pela Justiça Eleitoral, o limite para a multa em caso de gastos irregulares e regras que podem facilitar a prescrição das contas partidárias (veja mais abaixo).
A proposta faz uma reformulação ampla em toda a legislação partidária e eleitoral — revogando leis vigentes, como o Código Eleitoral e a Lei da Inelegibilidade, e unificando as regras em um único código.
Aprovação pela Câmara em 2021
Na Câmara dos Deputados, o projeto foi aprovado em setembro de 2021 e tinha mais de 380 páginas e quase 900 artigos.
Agora, a proposta aguarda análise dos senadores e deve passar, antes, pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Se aprovada, seguirá para votação em plenário. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse nesta segunda-feira (25) que irá priorizar a votação do tema ainda em abril.
Alterações nas regras diretamente relacionadas às eleições devem seguir o princípio da anualidade eleitoral — ou seja, só valem se forem aprovadas um ano antes do pleito. Por isso, ainda que sejam aprovadas neste ano, não valem para as eleições municipais de 2024.
Contudo, boa parte das mudanças diz respeito à prestação de contas partidárias, que são feitas ano a ano pelas legendas. Neste caso, não há necessidade de respeitar a anualidade eleitoral para que as mudanças entrem em vigor.
Diretor-executivo do Movimento Transparência Partidária, Marcelo Issa diz que um eventual enfraquecimento na fiscalização partidária, em certa medida, fragiliza também a democracia.
“Os partidos políticos são fundamentais para o fortalecimento e o amadurecimento de nossa democracia, mas isso demanda partidos com credibilidade junto à população e isso somente ocorrerá se tivermos mais transparência e integridade”, afirma.
Veja algumas mudanças
Restrição da auditoria
O texto de Castro restringe a auditoria das contas partidárias a “aspectos formais”. Ou seja, a Justiça Eleitoral estaria restrita a analisar, por exemplo, se a sigla apresentou nota fiscal ou recibo dos gastos e se a saída dos recursos está de acordo com o que foi apresentado.
Isso limitaria a análise que é feita hoje, que permite que se investigue, por exemplo, se a empresa contratada é fantasma, se o serviço foi efetivamente prestado ou se há indício de sobrepreços.
Devolução dos recursos
O parecer mantém a previsão da Câmara de limitar a multa paga pelos partidos a até R$ 30 mil, em caso de contas desaprovadas “em caso de gravidade”. Hoje, o limite é de até 20% sobre o valor do gasto irregular. Por exemplo, se os recursos irregulares forem de R$ 1 milhão, a multa do partido pode chegar a R$ 200 mil.
Gastos dos partidos e transparência nas viagens
O texto do Senado altera a versão da Câmara e restringe os gastos com o fundo partidário a despesas “comprovadamente a serviço do partido” e na contratação de serviços de segurança dos candidatos.
Porém, o texto afrouxa a versão dos deputados ao retirar a exigência de apresentação de lista de passageiros na contratação de aeronaves durante as campanhas eleitorais. Atualmente, a relação de passageiros e tripulantes é publicada pela Justiça Eleitoral.
Prescrição das contas
Na avaliação do diretor-executivo do Movimento Transparência Partidária, Marcelo Issa, o parecer do Senado “torna praticamente inevitável” a prescrição das contas partidárias ao reduzir em dois anos (de cinco pra três) o prazo a ser utilizado pela Justiça Eleitoral para avaliar as contas partidárias.
Parecer automaticamente favorável
Pelo texto, a área técnica da Justiça Eleitoral terá 360 dias para “apontar equívocos” nas contas partidárias. Do contrário o parecer será automaticamente favorável. O texto aprovado pela Câmara previa um prazo ainda menor, de 180 dias.
Contudo, segundo Issa, o prazo ainda é considerado curto e há um risco de que o parecer seja favorável sem qualquer análise. Além disso, o relatório altera o caráter jurisdicional das contas partidárias e o transforma em administrativo — o que retira eventuais prazos para a manifestação dos partidos e permite que o processo seja rediscutido indefinidamente.
Restrição na responsabilização
O texto prevê que os dirigentes partidários só respondam na esfera cível e criminal se a ocorrência de irregularidade for “grave, insanável” e se houver “conduta dolosa específica que importe enriquecimento ilícito e lesão ao patrimônio do partido”.
Na prática, segundo o Transparência Partidária, as exigências para a responsabilização podem enfraquecer a boa governança partidária.
Coligações
O relatório permite a propaganda conjunta de candidatos às eleições proporcionais (para deputados e vereadores) independentemente de estarem na mesma federação. A prática, segundo o Transparência Partidária, pode confundir o eleitor e prejudicar a formação de um voto consciente, principalmente em um contexto em que as coligações estão proibidas.
Propaganda conjunta
No caso da propaganda conjunta de material impresso de candidatos de partidos diferentes, os gastos podem constar apenas na prestação de contas do candidato que arcou com os custos — o que impossibilita a dedução de limite de gastos do beneficiário da propaganda, podendo levar a situações de abuso de poder econômico, avalia Issa.
Derrubada de resoluções do TSE
Uma das mudanças feitas pelo relator do Senado avaliadas como positivas por especialistas — por considerarem inconstitucional — é a retirada de trecho, aprovado na Câmara, que permitia que o Congresso Nacional derrubasse regulamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que “exorbite os limite e as atribuições” da corte eleitoral.