O interior do planeta Terra tem um núcleo que permaneceu quente por mais de 4,5 bilhões de anos, mas que lenta e inevitavelmente está esfriando.
O núcleo da Terra é chave para a vida. Se um dia ele se apagar, o planeta se converterá numa gigantesca rocha fria e inerte. Agora uma pesquisa recente calculou que esse esfriamento está ocorrendo mais rápido do que se pensava.
Esse esfriamento ocorre em escalas de milhares de milhões de anos, portanto, por mais rápido que ocorra, nenhum de nós estará vivo para ver como seria essa morte fria do planeta.
Os especialistas, no entanto, concordam que investigar esses processos naturais é chave para compreender melhor a evolução da Terra e os fenômenos que afetam a vida no planeta.
Mas em que consiste esse esfriamento e como descobriram que ele está ocorrendo mais rapidamente do que se pensava?
O interior da Terra
O núcleo da Terra fica a quase 3.000 km de profundidade da crosta terrestre, com um raio de 3.500 km. As temperaturas do núcleo podem flutuar entre 4.400° C e 6.000° C, temperaturas simulares às do Sol.
O núcleo interno é uma esfera sólida, composta majoritariamente de ferro. O núcleo externo é formado por um líquido maleável, composto de ferro e níquel. É no núcleo externo que se forma o campo magnético da Terra, que protege o planeta dos perigosos ventos solares. A colossal quantidade de energia térmica que emana do interior do planeta coloca em marcha fenômenos como as placas tectônicas e a atividade vulcânica.
Além disso, nas fronteiras do núcleo ocorre um processo que foi crucial para o novo estudo: a convecção do manto terrestre, que se refere à transferência de calor do núcleo até o manto.
A fronteira do núcleo
Os cientistas não sabem exatamente quanto tempo levará para a Terra esfriar até o ponto em que os fenômenos naturais que impulsionam o núcleo parem de ocorrer ou que o campo magnético desapareça, por exemplo.
Uma equipe do Instituto Federal Suíço de Tecnologia de Zurique (ETH) e da Carnegie Institution for Science, nos Estados Unidos, acredita que a chave para desvendar esse mistério está nos minerais que transportam calor do núcleo para o manto.
Esta região fronteiriça é constituída principalmente por um mineral chamado bridgmanita, que tem uma estrutura cristalina e só pode existir sob grande pressão, a partir de cerca de 700 km de profundidade.
Não existe tecnologia para escavar e estudar minerais nessa profundidade, então o professor da ETH Motohiko Murakami projetou um experimento para simular essas condições em laboratório.
Pressão e temperatura
Murakami e seus colegas desenvolveram um método para medir a quantidade de calor que a bridgmanita pode conduzir. O que eles fizeram foi fabricar um diamante bridgmanita a partir dos elementos que compõem esse mineral.
Eles então inseriram o cristal em um dispositivo que simula a pressão e a temperatura que prevalecem no interior da Terra. Dentro do dispositivo, eles dispararam pulsos de feixes de laser que irradiaram e aqueceram o mineral, em um processo conhecido como “medição de absorção óptica”.
Dessa forma, eles puderam ver como o mineral reagia em diferentes pressões e temperaturas. “Esse sistema de medição nos permitiu mostrar que a condutividade térmica da bridgmanita é cerca de 1,5 vezes maior do que se supunha anteriormente”, diz Murakami em comunicado.
Segundo o pesquisador, isso indica que o fluxo de calor do núcleo para o manto também é maior do que se pensava anteriormente.
O resultado do experimento sugere que quanto mais rápido o calor é transferido do núcleo para o manto, mais rápido o calor é perdido do núcleo, o que acelera o resfriamento da Terra.
Alem disso, os autores acreditam que esse esfriamento mudaria a composição dos minerais do manto.
Quando a bridgmanita esfria, ela se transforma em outro mineral chamado pós-perovskita.
A pós-perovskita conduz o calor com muito mais eficiência do que a bridgmanita, então, à medida que a bridgmanita no limite do manto se converte em pós-perovskita, a Terra esfria ainda mais rapidamente, dizem os pesquisadores.
Destinados a morrer?
Esse resfriamento mais rápido pode ter várias consequências, observam os autores do estudo. Por um lado, pode fazer com que as placas tectônicas, que são mantidas em movimento pelo fluxo do manto, desacelerem mais rápido do que o esperado.
“Nossos resultados podem nos dar uma nova perspectiva sobre a evolução da dinâmica da Terra”, explica Murakami.
Murakami, no entanto, adverte que, neste momento, eles não podem estimar quanto tempo levará para esse resfriamento interromper a atividade no manto.
Para isso, eles precisam entender melhor a dinâmica do manto e as reações dos elementos que o compõem.
“Este estudo oferece uma nova visão do principal processo geológico que afeta planetas rochosos (como a Terra): a velocidade com que eles esfriam”, disse à BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, Paul Byrne, professor de Ciências Planetárias e da Terra da Washington University em Saint Louis, Estados Unidos, que não esteve envolvido na pesquisa.
“Marte, Mercúrio e a Lua esfriaram tanto nos últimos 4,5 bilhões de anos que, geologicamente falando, são essencialmente inertes.”
Portanto, diferentemente da Terra, Marte, Mercúrio e a Lua não possuem placas tectônicas, explica o especialista. “É esse o destino que aguarda nosso mundo?” Byrne se pergunta.