Após o fracasso da chamada “Lei Ómnibus”, a Câmara de Deputados da Argentina aprovou nesta terça-feira (30) a Lei de Bases, um novo projeto de reformas econômicas e do Estado do presidente do país, Javier Milei.
Desta vez, para garantir a aprovação, Milei fez concessões a potenciais aliados para conseguir que um texto legislativo fosse aprovado.
Agora, os deputados votarão pontos específicos do projeto, que passará para o Senado.
O projeto foi aprovado após 20 horas de debate, que começou na noite de segunda-feira (29) e entrou na madrugada e na manhã desta terça, e por 142 votos a favor, 106 contra e cinco abstenções.
Logo no começo de seu governo, Milei baixou um Decreto de Necessidade e Urgência (DNU), uma espécie de medida provisória e enviou ao Congresso um projeto de “lei ómnibus”. Os dois sofreram derrotas no Legislativo.
- Em 6 de fevereiro, a “Lei Ómnibus foi retirada de pauta pelos próprios deputados governistas pois sabiam que o texto seria derrotado.
- Em 14 de março, os senadores derrubaram o “decretaço”.
A Lei de Bases aprovada é uma nova versão, reduzida, da “lei ómnibus” (o nome formal da “lei ómnibus” também era Lei de Bases). Além disso, aprovou-se um pacote fiscal.
O texto da “lei ómnibus” que foi tirado de pauta no Congresso em 6 de fevereiro, originalmente, tinha mais de 600 artigos. Essa nova versão da Lei de Bases tem cerca de 250.
No entanto, esse novo texto incorpora uma parte importante do “decretaço”: a reforma trabalhista.
Quando o governo Milei baixou o DNU, a Justiça impediu que a parte da reforma trabalhista entrasse em vigor, pois essas regras não poderiam ser alteradas via decreto. Agora, as mudanças foram reduzidas e vão passar a fazer parte da Lei de Bases.
Essa nova reforma trabalhista, no entanto, é muito mais enxuta. O número de artigos diminuiu de 60, no “decretaço”, para 17 nessa proposta aprovada.
O governo desistiu de medidas que restringiam o poder dos sindicatos e que poderiam ser um motivo de conflitos. Por exemplo, um desses artigos que ficaram pelo caminho era uma restrição ao direito de greve de atividades consideradas essenciais, e outra acabava com uma contribuição obrigatória que os trabalhadores não sindicalizados pagavam aos sindicatos.
Entre as medidas que entraram no texto da “Lei de Bases” estão:
- A criação de um período de experiência de seis meses para pessoas recém-contratadas.
- O fim de multas para empresários que contratam empregados sem registro.
Na parte sobre privatização, a nova Lei de Bases exclui duas empresas estatais importantes do programa de venda para a iniciativa privada. O governo desistiu de vender o Banco Nación e as Aerolíneas Argentinas.
O novo texto também tem uma mudança em relação à “lei ómnibus” original: tem uma lista de órgãos que não podem ser dissolvidos por ordem do governo federal, como o Instituto Nacional de Cinema e Artes Audiovisuais (Incaa) e a Entidade Nacional de Comunicadores
O texto proíbe que o Executivo possa intervir em universidades nacionais, no Poder Judicial, no Poder Legislativo e no Ministério Público.
Veja abaixo uma reportagem sobre um protesto de estudantes universitários contrários ao congelamento dos valores dos repasses às universidades públicas do país.
Essa versão reduzida da Lei de Bases ainda dá ao Executivo o poder de reestruturar órgãos governamentais, privatizar empresas e alterar regras para atrair investimentos.
Pacote de mudanças fiscais
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Além da Lei de Bases, a Câmara está aprovaram ao mesmo tempo um pacote de mudanças fiscais.
O pacote de reformas fiscais inclui um programa para regularizar capitais não declarados e a redução do imposto sobre bens pessoais. O texto aumenta o imposto de renda para quem têm rendimentos altos.
De acordo com Lucas Romero, da Consultoria Synopsis, o governo federal incluiu artigos que garantem um aumento de arrecadação dos governos das províncias. É uma tática para tentar receber apoio dos governadores provinciais.
“É por isso que as duas iniciativas vão ser aprovadas: os governadores querem o pacote fiscal e estão mais predispostos a acompanhar o governo na (votação da) Lei de Bases”.
Negociando para aprovar
Se a Lei de Bases seja aprovada no Senado, será a primeira lei que o governo Milei conseguirá aprovar.
O número de deputados governistas é baixo, e para conseguir aprovar será preciso contar com o apoio de aliados circunstanciais –na Argentina, eles receberam o nome de “dialoguistas”, ou seja, dispostos a dialogar.
Lucas Romero, da consultoria Synopsis, afirmou que, para Milei, é importante que a lei seja aprovada porque ele precisa demonstrar que consegue governar. “Ele tem que deixar gravado em leis suas pretensões de mudar (o país). O Fundo Monetário Internacional (FMI), que é o auditor da Argentina, é quem pede isso”.
O analista faz uma comparação:
- Milei ainda não conseguiu aprovar uma única lei.
- Todos os presidentes de esquerda desde o ano 2000 conseguiram aprovar as primeiras leis em menos de 10 dias.
Maurício Macri, da direita moderada e que governou em minoria entre 2015 e 2019, demorou 28 dias para conseguir renegociar dívida.
Ana Iparraguirre, sócia da consultoria de estratégia política GBAO, Milei precisa impulsionar o investimento e dar sinais de que seu plano é sustentável porque nesses meses de ajuste fiscal o crescimento econômico foi baixo e logo mais não haverá como seguir reduzindo o gasto do governo.