A Comissão de Agricultura e Política Rural da Assembleia Legislativa da Bahia (AL-BA) se atualizou sobre os problemas enfrentados pelos produtores rurais baianos ao longo da pandemia da Covid-19. Durante a audiência virtual “Os Impactos da Pandemia no Setor Agropecuário”, realizada na manhã da última quarta-feira (9), o colegiado teve a oportunidade de ouvir os representantes do setor com o objetivo de coletar informações que servirão de base para a atuação parlamentar.
Conduzido pela presidente da comissão, deputada Jusmari Oliveira (PSD), o encontro serviu como preâmbulo de uma ampla discussão estabelecida no âmbito do Parlamento da Bahia sobre a necessidade de amparo à agropecuária, setor que mesmo com o risco e os danos impostos pela pandemia manteve as atividades. Segundo a legisladora, embora a Casa legislativa já atue no sentido de ajudar o setor.
“Temos aprovado no plenário da comissão algumas audiências públicas para outros setores específicos – a exemplo da fruticultura e do algodão. Esta audiência é um apanhado geral. Além das audiências públicas, no dia a dia, nós deputados estamos fazendo os devidos encaminhamentos para contribuir para o setor ser ainda mais grandioso”, afirmou.
De acordo com o presidente da Federação da Agricultura do Estado da Bahia (Faeb), Humberto Miranda, a implantação de novas políticas públicas são importantes para o setor continuar produzindo e gerando renda e emprego. “O setor agropecuário tem grande relevância para a economia. Este setor, embora abrangente e promissor, também passa por dificuldades. Nem tudo são flores. Existem também muitos desafios e gargalos”, ressaltou.
Ainda segundo Miranda, a pandemia afetou a saúde, a educação, a economia, entre outros segmentos, mas o agro não parou. Conforme enfatizou o gestor da Faeb, mais de um bilhão de pessoas se alimentam do que sai do setor agropecuário brasileiro, evidenciando assim a dimensão do agro na vida da população. Em pronunciamento que levou cerca de dez minutos, Humberto Miranda narrou a conduta do setor durante o período de crise sanitária.
“O setor se esmerou a se adequar às exigências sanitárias. Nós tivemos muitos problemas, como na questão do trânsito dos produtos e em outras frentes também, o que gerou prejuízo aos produtores. O custo de produção está muito alto. O custo dos insumos praticamente dobrou de preço. Temos que lembrar que a maioria dos nossos produtores são pequenos produtores, que produzem para o consumo interno. Eles estão sendo impactados”, declarou.
Presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Bom Jesus da Lapa, Ervino Kogler apresentou o panorama do município, que aos poucos vem se consolidando como a capital baiana na produção de frutas. De acordo com Kogler, no que se refere à fruticultura, o preço do produto despencou em média 38%, ao tempo que os insumos tiveram aumento expressivo, o que dificultou a vida dos produtores da região.
“Tudo subiu. O cloreto é um adubo que utilizamos. Só ele elevou 45% o valor enquanto o preço da fruta caiu 38%. Hoje para comprar o cloreto eu gasto 125 kg de bananas. Se o produtor não tiver condições de tocar a lavoura, mais à frente vai refletir em desabastecimento”, disse.
Segundo Kogler, os preços das caixas de papelão e de pallet, utilizadas para o armazenamento, por exemplo, dobraram de preço, e o equipamento de irrigação subiu 150%. Conforme afirmou o sindicalista, os números são desfavoráveis para o setor.
“O consumo diminuiu, ao contrário do que as pessoas falam. A dona de casa tem receio de ir à feira livre. Ela vai ao supermercado, onde ela não compra na mesma quantidade que antes [da pandemia]. Além disso, com os hotéis fechados ou com poucos hóspedes, reduziram a compra de frutas, uma vez que são perecíveis”, desabafou.
No que se refere aos lacticínios, Danilo de Souza Reis, presidente da Associação dos Produtores de Leite do Estado da Bahia, alegou que a situação é semelhante ao da fruticultura, narrado anteriormente. Durante a pandemia, o setor viveu altos e baixos em relação à produção. No início do período pandêmico, houve redução nas vendas, o que fez com que alguns produtores tivessem que suspender a captação do leite. Com a concessão do auxílio emergencial, momentaneamente houve aumento do consumo dos laticínios, o que provocou euforia no setor. Em dezembro de 2020, o leite despencou de preço, enquanto os insumos subiram de valor. A baixa de preço não se sustentou, resultando em novo aumento do preço do leite e derivados.
Diante do cenário apresentado, Reis ressaltou a necessidade da oferta da linha de crédito, bem como a ampliação do prazo para o pagamento dos débitos, prorrogados de 2020 para 2021. “A maioria dos produtores estão trabalhando com o caixa no vermelho. A oferta da linha de crédito é louvável. A vaca, por exemplo, precisa ser bem alimentada para manter a produção. Se isso não acontece, quando o mercado estabilizar, nós vamos ter preço, mas não teremos produção. Além disso, os débitos que tínhamos conseguido prazo já estão vencendo novamente, e a pandemia ainda não acabou”, lamentou.
Presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Barreiras, David Schmidt reconheceu o momento delicado da produção rural, entretanto, ressaltou o crescimento do mercado do consumo de grãos. “Conseguimos uma recuperação dos preços de soja e algodão. Temos boas safras puxadas por boas chuvas. Não diminuímos a empregabilidade. Nós aumentamos. Imagina em uma crise onde a maioria está demitindo. Existir um setor que absorve esses trabalhadores é importante. É necessário ter esse sustentáculo na economia.”, afirmou.
Por outro lado, Schmidt, que também é fruticultor, criticou o aumento do preço dos insumos. “Os preços de soja e algodão subiram, mas os custos de produção aumentaram também. Foi um incremento de 75% de produção. 80% dos custos dos nossos insumos é em dólar. Antes a gente trabalhava com o dólar a R$ 3, agora trabalhamos a R$ 5,50. Isso traz impacto. Os insumos para irrigação subiram demais. Todos sabem como a irrigação é o carro-chefe para fazer os setores subirem. Hoje você tem o plástico e o ferro como insumos fundamentais para a irrigação. Plástico e ferro tiveram 150% de incremento nos preços”, explicou.
David Schmidt ainda chamou a atenção para a necessidade de uma maior conectividade para a zona rural, além de defender uma melhor infraestrutura para o abastecimento de energia elétrica. Segundo o convidado, com acesso à energia e à internet, o produtor rural expande o mercado e pode negociar diretamente com a zona urbana, e inclusive vender por meio do ecommerce.
“A oferta da energia está aumentando, mas a gente não está conseguindo levar a energia para a zona rural, porque a infraestrutura está muito defasada. A conectividade também está precária. Não dá mais para ser produtor rural sem conectividade, para que a gente ganhe competitividade no mercado, inclusive para ser mais eficazes com os recursos empregados”, alegou.
Presente no evento, o deputado Eduardo Salles (PP), que já foi secretário estadual da Agricultura na Bahia, defendeu a importância de novos investimentos dos governos estadual e federal em logística, bem como ressaltou a relevância da Desenbahia ofertar novas linhas de crédito para os produtores rurais. Segundo Salles, os temas deverão ser tratados com mais frequência com o governador Rui Costa e com o ministro de Minas e Energia, com quem a comissão tentará marcar uma reunião em breve.
“Acho que a palavra-chave é logística. Precisamos brigar por logística. Acho que o Governo do Estado tem feito algo importante, mas precisamos ter a cobrança direta. Essa pauta da logística tem que ser tratada com frequência com o governo. É algo muito importante”, afirmou.
Além dos já citados, participaram da audiência pública os deputados Paulo Câmara (PSDB) e Sandro Régis (DEM), juntamente com representantes de sindicatos e associações ligadas ao setor produtivo rural.