Um mês após se reunir em Brasília com membros da bancada ruralista, do Instituto Pensar Agro (IPA) e da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), começou a destravar as pautas do chamado “combo da morte”, consideradas prioritárias pelos ruralistas.
Em despacho assinado na quinta-feira (2), ele distribuiu o Pacote do Veneno apenas à Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA), ignorando os pedidos da oposição para que a matéria seja discutida também nas demais comissões, como Meio Ambiente (CMA), Direitos Humanos (CDH) e Assuntos Sociais (CAS), antes da votação definitiva, em plenário.
A CRA é dominada por representantes do agronegócio. Dos 33 integrantes (um posto está atualmente vago), ao menos 26 votam com o governo Jair Bolsonaro (PL-RJ). O presidente do colegiado, Acir Gurgacz (PDT-RO), cujo partido forma bloco com Cidadania e Rede, é também um membro da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). Ele estava na reunião do dia 27 de abril.
Naquela ocasião, os parlamentares da frente debateram ainda os projetos da Grilagem (PL 510/2021), do Licenciamento Ambiental (PL 2.159/2021) e do Autocontrole (PL 1.293/2021). O vice-presidente da FPA no Senado, Zequinha Marinho (PL-PA), pré-candidato ao governo do Pará, enviou um ofício ao chefe do Legislativo, solicitando o andamento das propostas e uma agenda para debater seus “benefícios”.
“Deixamos de forma bem encaminhada para ter essas pautas nas comissões e no plenário”, afirmou, à época. O documento foi assinado por 43 senadores, sendo 23 da FPA. Quem também participou, em nome da CNA, foi o ex-deputado Nilson Leitão, presidente do Instituto Pensar Agro (IPA), motor logístico da bancada.
PRESIDENTE PROMETEU DISCUSSÃO “SEM ATROPELO”
Em entrevista coletiva depois do encontro, Pacheco garantiu que não haveria “atropelo nem açodamento” na apreciação dos projetos. “Todos terão a cadência necessária nas comissões permanentes que devem apreciar esses temas”. O político recebeu uma série de requerimentos da minoria pedindo análises na CMA, na CAS e na CDH, bem como a realização de oitivas. Até agora, porém, não atendeu a nenhum deles.
A Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, que reúne diferentes organizações, avaliou que Pacheco descumpriu o combinado. “No mês do meio ambiente, o senador quer nos presentear com o prato cheio de veneno”, publicou a articulação, em nota. “Se não voltar atrás nesse requerimento, após apreciação na CRA a matéria está pronta para deliberação do plenário”.
Gurgacz será o relator da proposta, registrada no Senado sob o número 1.459/2022. Dono de uma propriedade de 31,6 mil hectares em Envira, no sul do Amazonas, ele é o segundo senador com maior extensão de terras, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), compilados pelo De Olho em 2019 no Mapa das Terras dos Parlamentares.
O pedetista chegou a cumprir pena por crimes contra o sistema financeiro: “Senador preso que passaria férias em Aruba é segundo maior latifundiário do Congresso“.
DE OLHO MOSTROU CONFLITOS DE INTERESSE NA LIBERAÇÃO DE AGROTÓXICOS
De autoria do “rei da soja” Blairo Maggi (MT), o PL 6.299/2002 foi aprovado na Câmara em fevereiro, na forma de um substitutivo do relator, Luiz Nishimori (PL-PR). Neste link é possível consultar como cada um dos deputados federais votou, por estado. O observatório falou sobre os conflitos de interesse envolvendo a tramitação da proposta em uma série de reportagens.
A Mariagro Agrícola Ltda, que pertence à família de Nishimori, fechou um acordo de R$ 1,5 milhão para quitar uma dívida com a Syngenta, líder do mercado mundial de agrotóxicos e interessada direta em flexibilizar a lei. A “composição amigável” foi assinada em dezembro de 2020, quando o PL já tramitava na Casa.
O parlamentar também fez lobby para as empresas japonesas Marubeni e Mitsui, que produzem os pesticidas, e já acompanhou Jair Bolsonaro e filhos em viagens pelo Japão. Ele não esconde que usava DDT em suas lavouras e que comercializou os produtos no Paraná.
PL DA GRILAGEM DEVE SER O PRÓXIMO DA FILA
No caso do PL do Autocontrole, o pedido da minoria e dos movimentos sociais e ambientais para ampliação do debate foi acatado em parte. A votação na CAR, que aconteceria nesta quinta-feira, acabou adiada em uma semana; um dia antes, acontece uma audiência pública sobre o tema.
Em relação ao licenciamento, o observatório contou que os ruralistas articulam uma manobra. Como o PL 2.159/2021, que já passou pela Câmara, travou nas mãos da relatora, Kátia Abreu (PP-TO), eles podem priorizar o PLS 168/2018, relatado por Marinho. O senador é conhecido por defender madeireiros e garimpeiros ilegais.
Assim, entre organizações da sociedade civil e oposição, há o temor de que a próxima boiada a passar seja a do PL da Grilagem. Isso porque o relator, Carlos Fávaro (PSD-MT), solicitou licença a partir de 07 de junho para disputar o governo do Mato Grosso. Se ele não conseguir apresentar seu parecer até lá, a análise ficará a cargo da primeira suplente, Margareth Gettert Busetti (PP-MT).