A tragédia do submarino que desapareceu no Oceano Atlântico nesta semana deixou muitas perguntas.
As autoridades dos Estados Unidos informaram na última quinta-feira (22) sobre a possível implosão do Titan, o navio com cinco passageiros que se dirigia para a região onde ficam restos do transatlântico Titanic, localizado a cerca de 4.000 metros de profundidade nas águas do Atlântico Norte.
A Guarda Costeira dos Estados Unidos informou que fragmentos do veículo foram encontrados, sugerindo que o submersível foi esmagado pela pressão do oceano de forma “catastrófica”. A entidade ofereceu suas condolências pela morte da tripulação.
Agora os especialistas se preparam para investigar o que aconteceu e o que deveria ter sido feito para evitar a tragédia, por meio do estudo das peças encontradas nas águas próximas ao histórico navio.
As autoridades vão juntar o máximo de fragmentos que puderem para construir um quadro completo da sequência de eventos que levaram à tragédia, de acordo com Ryan Ramsey, ex-capitão de submarino da Marinha Real Britânica.
“Isso não será diferente de uma queda de avião, mas, nesse caso, não há caixa preta, então você não será capaz de rastrear os últimos movimentos da embarcação”, diz Ramsey.
“Mas é importante trazer de volta o máximo de pedaços possível. Os peritos serão capazes de analisar a estrutura quebrada, quaisquer fraturas que tenham acontecido e talvez juntar o que realmente aconteceu naqueles últimos momentos”, afirma.
Os cinco fragmentos encontrados incluem “o convés traseiro do submersível” e um cone da frente do submarino.
Eles foram encontrados a cerca de 500 metros da proa do Titanic.
O contra-almirante John Mauger, da Guarda Costeira, disse que é muito cedo para determinar o momento da implosão.
No entanto, horas depois de encontrar os fragmentos, a Marinha dos EUA disse ter detectado “uma anomalia acústica consistente com uma implosão” logo após Titan perder contato com a superfície.
O submersível perdeu toda a comunicação com o exterior no domingo.
No submarino estavam Stockton Rush, 61, fundador da empresa proprietária do submersível, OceanGate Expeditions; o empresário paquistanês Shahzada Dawood, 48, e seu filho Suleman, 19; o bilionário britânico Hamish Harding, 58, e o explorador francês Paul-Henri Nargeolet, 77.
Todos morreram no acidente.
A teoria da implosão
A chave para a investigação serão os pedaços de fibra de carbono com que foi feita parte do veículo.
A grande dúvida é se ele sofreu uma falha estrutural que ocasionou a ruptura do casco, que por sua vez provocou a possível implosão.
Cada peça será examinada de perto no microscópio para analisar a direção dos filamentos de fibra de carbono, em busca de rasgos que sugiram o local exato onde ocorreu a ruptura.
Blair Thornton, professor de autonomia marinha na Universidade de Southampton, falou à BBC sobre o que pode ter acontecido.
“No caso de uma falha catastrófica do invólucro principal, o submersível teria sido submetido a pressões incrivelmente altas, equivalentes ao peso da Torre Eiffel, dezenas de milhares de toneladas, comprimindo a embarcação”, disse ele.
“Estamos falando de uma implosão muito poderosa na parte principal.”
Will Kohnen, presidente do Comitê de Veículos Subaquáticos Tripulados da Sociedade de Tecnologia Marinha, disse que o veículo pode ter explodido “para dentro em questão de milésimos de segundo”.
“Esse foi um final ‘mais gentil’ do que a situação incrivelmente difícil de ficar quatro dias no frio, no escuro, em um espaço confinado, com oxigênio acabando. Então, isso teria acontecido muito rapidamente. Eu não acho que qualquer um ali teria tido tempo de perceber o que aconteceu”, acrescentou.
Os investigadores também devem analisar se o acidente ocorreu por falta de vistorias e manutenção previamente necessários.
O engenheiro Roderick A. Smith, professor do Imperial College London, disse que um dos fragmentos mais importantes para responder a essa pergunta seria a seção de fibra de carbono do local da ruptura.
“A fibra de carbono falha devido a defeitos internos em sua construção. As juntas entre a fibra de carbono e o titânio precisam de uma inspeção muito cuidadosa”, comentou o especialista.
A violência da implosão significa que pode ser muito difícil determinar a sequência dos eventos. “Daí a necessidade de uma recuperação completa para a perícia, se possível”, acrescentou.
Outra fonte potencial de informações sobre exatamente o que aconteceu com o Titan podem ser os hidrofones, microfones subaquáticos usados para ouvir evidências de armas atômicas ilícitas.
Essas ferramentas ajudaram a estabelecer que o submarino argentino San Juan implodiu depois de desaparecer na costa do país em 2017.
É possível que os hidrofones tenham detectado a explosão do submersível da empresa OceanGate e possam nos dar o momento exato de quando ocorreu a tragédia.
Não está claro nesta fase qual agência governamental vai conduzir a investigação, pois não há protocolo para esse tipo de evento com submersíveis.
De acordo com o contra-almirante John Mauger, uma investigação pode ser particularmente complexa porque o incidente ocorreu em uma parte remota do Oceano Atlântico, envolvendo pessoas de várias nacionalidades.
O que é uma implosão catastrófica?
Texto de Eric Fusil, professor da Escola de Engenharia Elétrica e Mecânica da Universidade de Adelaide, Austrália.
A maioria, senão todos os submersíveis e submarinos que operam em profundidade, possuem um vaso de pressão feito de um único material metálico de alta resistência ao escoamento.
Ele geralmente é feito de aço para profundidades relativamente rasas (menos de 300 metros ou mais) ou titânio para profundidades mais profundas.
Um vaso de pressão grosso de aço ou titânio tem geralmente uma forma esférica que pode suportar as pressões de esmagamento esperadas de até 12.000 pés (cerca de 4 mil metros), a profundidade em que os destroços do Titanic se encontram.
O Titan, no entanto, era diferente.
Seu vaso de pressão era feito de uma combinação de titânio e fibra de carbono composta. Isso é um tanto incomum do ponto de vista da engenharia, pois, em um contexto de mergulho profundo, o titânio e a fibra de carbono são materiais com propriedades muito diferentes.
O titânio é elástico e pode acomodar uma ampla gama de tensões sem qualquer tensão permanente mensurável remanescente após o retorno à pressão atmosférica.
Ele se contrai para acomodar as forças de pressão e se expande novamente quando essas forças são aliviadas. Um composto de fibra de carbono, por outro lado, é muito mais rígido e não tem o mesmo tipo de elasticidade.
Podemos apenas especular sobre o que aconteceu com a combinação dessas duas tecnologias, que dinamicamente não se comportam da mesma forma sob pressão.
Mas o que podemos afirmar, quase com certeza, é que algum tipo de perda de integridade teria ocorrido devido às diferenças entre esses materiais.
Um material pode potencialmente sofrer de “delaminação”, o que leva a uma separação das camadas de reforço.
Isso teria criado uma falha que desencadeou a implosão instantânea devido à pressão subaquática.
Em menos de um segundo, a embarcação, empurrada para baixo pelo peso de uma coluna de água de 12.000 pés, teria implodido imediatamente por todos os lados.