quarta-feira 12 de março de 2025
O senador Carlos Portinho (PL-RJ), no plenário do Senado: proposta para garantir previsibilidade de gastos para Defesa Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado
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quarta-feira 12 de março de 2025 às 07:09h

Enquanto o mundo se rearma, projeto no Congresso põe a corda no pescoço do Exército e da Marinha

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Em 2023 o senador Carlos Portinho (PL-RJ) apresentou no Congresso o texto de uma PEC que previa vincular o orçamento da Defesa a uma parcela do PIB, que começaria em 1,2% até chegar a 2%. Em meio a críticas e à necessidade se controlar os gastos públicos, a proposta dormiu um ano nas gavetas do Senado até o novo mandato de Donald Trump bagunçar a geopolítica mundial, rompendo a confiança que nações aliadas tinham desde os anos 1940 de poder contar com os EUA para a sua defesa.

O Leopard 1, principal carro de combate do Exército, durante treinamento no Rio Grande do Sul; Força quer substituir sua frota
O Leopard 1, principal carro de combate do Exército, durante treinamento no Rio Grande do Sul; Força quer substituir sua frota – Foto: Exército Brasileiro

Com esse novo cenário, senadores têm procurado Portinho para apoiar sua proposta, uma pauta que agrada ao ministro José Múcio (Defesa), mas enfrenta a oposição do Ministério da Fazenda. Entre os interlocutores de Portinho estão Jaques Wagner, Sergio Moro e Otto Alencar. “É preciso garantir o mínimo de previsibilidade para os investimentos da Defesa. Sem ela não há território, nação, educação ou saúde.” O ex-líder do governo Bolsonaro no Senado diz que a PEC é um projeto de Estado, suprapartidário (leia abaixo sua entrevista à coluna).

José Genoino, ex-presidente do PT, considera que o Brasil não pode perder a oportunidade para discutir sua Defesa, modernizá-la e buscar um caminho autônomo, que reduza a dependência externa. Para ele, é preciso definir uma nova Estratégia Nacional de Defesa.

O mundo parece estar mais distante do soft power de Joseph Nye Jr e próximo de relações internacionais pautadas pelo realismo ofensivo de John J. Mearsheimer, para quem nenhum Estado pode ter certeza de que os outros vão se abster de usar suas capacidades militares ofensivas. Daí a necessidade de cuidar da sobrevivência acima de todos os objetivos.

Portinho diz que a previsibilidade de gastos significaria garantir recursos para pesquisas e projetos estratégicos, como o submarino nuclear e o míssil tático de cruzeiro. Mas isso está longe do projeto de lei orçamentária de 2025. Ele prevê que as despesas discricionárias do Exército embutidas no Novo PAC devem chegar a R$ 1,43 bilhão, 36% abaixo do R$ 1,95 bilhão necessário à Força Terrestre. O mesmo vale para as demais despesas discricionárias: dos R$ 3,9 bilhões necessários, o Congresso quer destinar R$ 2,2 bilhões.

Na Marinha, a situação não é diferente. Embora o Novo PAC preveja R$ 3,67 bilhões para os novos navios patrulha, os recursos dependem da estabilidade fiscal. O submarino nuclear enfrenta cortes e a construção das novas fragatas requer previsibilidade de recursos de R$ 3 bilhões até 2030, para evitar a interrupção. Assim, enquanto nações da Europa e da Ásia decidiram investir trilhões em carros de combate, aviões e munições, muito no Brasil se comportam como se isso não fosse da sua conta.

Leia abaixo a íntegra da entrevista do senador Portinho à coluna:

O senhor acha que em razão do novo cenário geopolítico mundial é possível sensibilizar seus pares para que a discussão sobre a necessidade de desenvolvimento autônomo da defesa nacional vá adiante no Congresso, inclusive com a apreciação da PEC da Previsibilidade de Gastos da Defesa?

Acho que não teria um momento melhor do que esse. Justamente pelo que tá acontecendo no mundo – o mundo está em guerra. E o Brasil sempre teve uma indústria de defesa de ponta e foi um país que desenvolveu tecnologia, como os satélites e o submarino nuclear, cuja tecnologia é importante para o País. Tudo que foi aprendido na medicina nuclear já é um reflexo sobre o domínio dessa energia pelo Brasil. Além disso, a indústria de defesa gera empregos e tem uma participação importante no PIB. É lógico que, quando a gente fala em orçamento para as Forças Armadas, todo mundo imagina o soldado e a guerra. Mas não é só isso. Basta lembrar as medidas de socorro aos refugiados da Venezuela na fronteira de Roraima. Isso tem custo. Ou a vigilância das fronteiras, por onde entra a maioria dos fuzis usados por criminosos em grandes capitais, principalmente, no Rio. Lógico que a Polícia Federal tem uma grande participação, mas o Exército também participa do controle das nossas fronteiras e pode fortalecer esse trabalho. E tem as medidas humanitárias, como na cheia do Rio Grande Sul. O Brasil não precisa participar de nenhuma guerra, mas aproveitar vantagens comerciais para ter uma indústria militar bem formada e avançada.

Sei que existem resistência e críticas à PEC: ‘Ah, mas vai engessar o orçamento’. Sim, a gente tem um orçamento engessado com investimento em educação e saúde, que são fundamentais para desenvolvimento do País, mas a gente tem de pensar na necessidade de garantir o mínimo de previsibilidade para os investimentos de nossa Defesa, pois sem Defesa não há território, Nação, Educação e Saúde. Não há povo. O mundo está mostrando isso. As relações estão mais tensas nas fronteiras da Europa, e a gente tem de olhar para o Brasil como uma oportunidade, porque tem uma indústria de defesa de ponta e pode ser exportadora, inclusive, de tecnologia, inovação e de equipamentos

As Forças Armadas defendem a existência de projetos estratégicos. No caso da Marinha, o submarino nuclear. O Exército procura concluir o míssil tático de cruzeiro (MTC-300) e a Força Aérea, a projeto do Gripen. O que fazer para buscar meios para garantir a continuidade desses projetos sem os quais nenhuma dissuasão contra potências extrarregionais é possível? É possível um compromisso suprapartidário?

A gente tem que olhar nos últimos anos para o orçamento militar brasileiro, que está muito abaixo do que é recomendado. Sempre que há um corte no orçamento, o primeiro a ser cortado são as forças militares. No governo Dilma, o corte foi muito grande. E nesse último ano também ocorreu um corte muito grande. O que a PEC deseja é que haja um mínimo de previsibilidade no orçamento. O Brasil não pode ter uma conta pendurada com fornecedores de suas aeronaves. É institucional: o País não pode ficar dependendo de um orçamento tão pequeno, tendo de fazer tanta contingência, e, ao mesmo tempo, deixando de honrar compromissos. É importante observar o que está acontecendo na indústria militar na China, bem como na guerra na Ucrânia com os drones. Tem uma evolução tecnológica que o Brasil não pode ficar atrás. Para isso, você tem de ter a previsibilidade mínima do orçamento. A gente tem de fixar um percentual, se não sobre o PIB, que é a proposta original, que seja sobre uma receita líquida anual do governo, o que daria previsibilidade para saber se a gente vai ter 11 caças, seis caças e poder honrar os compromissos que o País assumiu.

No momento atual, a China pressiona Taiwan, a Rússia combate na Ucrânia e Donald Trump fala em tomar a Groenlândia de um jeito ou de outro. As grandes potências parecem optar pelo uso da força para satisfazer ambições territoriais. Os chefes militares brasileiros têm alertado para o risco de o Brasil ser alvo da ganância estrangeira. O Brasil não estaria desarmado para defender seus interesses?

Sim. A própria questão da margem equatorial, né? É uma questão estratégica e militar também. Não é só a perfuração, a questão do petróleo, da economia, não é isso. Aqui a gente está na nossa margem de fronteira com outros países que estão avançando.

O senhor está se referindo à Venezuela e suas pretensões na Guiana?

Sim, exatamente. Então, assim, o que a PEC quer é previsibilidade. O que eu vejo hoje no Senado é uma adesão maior. Inclusive na própria posse do presidente da Comissão de Constituição e Justiça, o senador Otto (Alencar, PSD-BA). Na minha fala, no final da sessão, eu coloquei a importância dessa PEC, e o senador Otto na sua na sua fala, replicando, ele também manifestou apoio à proposta.

O senhor acha que o PT também pode apoiar a PEC em razão do novo cenário mundial e da defesa de nossa soberania?

Isso é uma questão de Estado. Essa PEC não pode ser vista de forma alguma como algo que foi o líder do governo Bolsonaro que apresentou. Sempre coloco dessa maneira: isso aí é uma questão de Estado. Inclusive porque a própria proposta transpassa futuros governos, que a gente não sabe nem quais serão. Esse aumento do orçamento para gerar previsibilidade será gradativo, para que não tenha um impacto imediato nas contas do governo. A PEC tem uma ‘escadinha’, que passará para outros governos. Tenho conversado muito com o senador Jaques Wagner, por exemplo. A grande dificuldade quando se fala em orçamento está no Ministério da Fazenda, o que é absolutamente natural. Qualquer ministro da Fazenda deve ter essa preocupação, mas também deve ter a preocupação de que o Brasil honre os seus compromissos e esteja na vanguarda do desenvolvimento tecnológico, além de ter capacidade de ação e de defesa, porque tem que olhar também para o Estado e não para o governo. Sempre disse isso tanto ao ministro (José) Múcio (Defesa), quanto aos chefes das Forças Armadas, bem como ao senador Jaques Wagner: esse projeto deve ser relatado por alguém do próprio governo para sinalizar que é um projeto de Estado.

Agora, eu sinto que esse assunto, a partir da manifestação do senador Otto, presidente da CCJ, ele ganha tração, com a adesão de outros senadores pela questão mundial, sem dúvida alguma. O senador Sergio Moro, inclusive, também se manifestou a respeito da necessidade, até no Twitter (X) dele, da necessidade de garantir os investimentos na Defesa. Assim, se por acaso o governo não indicar o relator, eu acredito que, por essas adesões e manifestações, vai ser indicado um outro relator de qualquer partido, até porque, como eu disse, esse projeto é um projeto de Estado. E ele começa a ganhar tração até pelo momento que a gente vive, pela manifestação de vários senadores.

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