No último domingo (27), mais de 9,9 milhões de eleitores não compareceram para votar no segundo turno das eleições municipais — índice equivalente a 29,2% de abstenção.
Além disso, a abstenção nas eleições municipais subiu a cada edição desde 2000. De 2020 para 2024 houve pequena queda, mas é porque aquele foi o ano do auge da pandemia de Covid-19, onde era natural que a abstenção fosse maior.
Na época, a orientação era que as pessoas permanecessem em casa, para evitar a disseminação do vírus (veja o cenário aqui).
A explicação para, no segundo turno de 2024, tantos brasileiros optarem por não comparecer às seções eleitorais, no entanto, não tem uma justificativa tão clara.
Diante do registro, a ministra Cármen Lúcia, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), prometeu iniciar uma investigação em parceria com os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs), para tentar averiguar os motivos da abstenção.
Ministra Cármen Lúcia fala sobre o segundo turno das eleições
Um dos pontos de destaque para a ministra foi que houve uma variação significativa entre as regiões brasileiras. “A gente também vai ter que apurar em cada local. Houve município que teve 16% [de abstenção] e houve município com 30%”, detalhou.
Especialistas consultados pelo g1 avaliam que o alto nível de abstenção neste ano pode trazer recados importantes sobre o contexto político brasileiro. Entre eles, que os cidadãos perderam a confiança nos candidatos ou no poder do voto, diante de cenários mais consolidados.
A curva da abstenção
Nas últimas eleições municipais, em 2020, o Brasil vivia uma pandemia sem precedentes. A taxa de abstenção foi a maior já registrada — 11,3 milhões de brasileiros não votaram, ou seja, 29,53% da população.
A expectativa era que o cenário fosse diferente neste ano, visto que a emergência sanitária foi superada.
Abstenção no 2º turno
- 2024: 29,26%
- 2020: 29,53% (pandemia)
- 2016: 21,6 %
- 2012: 19,1%
- 2008: 18,1%
- 2004: 17,3%
- 2000: 16,2%
Porém, por pouco, a abstenção dos votos em 2024 não ultrapassou a do ano pandêmico. Segundo a professora Marcela Machado, do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB), os números podem representar um descontentamento com a política.
“Se as pessoas, mesmo num cenário onde não tenha uma emergência sanitária, estão deixando de votar, sinaliza uma possível desilusão com os candidatos que estão postos”, pondera a profissional.
“No caso da abstenção, a pessoa nem quer sair de casa para falar que nenhum candidato interessou. De fato isso sinaliza que as pessoas não estão interessadas, os candidatos não atenderam aos interesses delas, pode sinalizar também um desengajamento cívico”, prossegue.
Resultado definido
O cientista político Antônio Lavareda pontua ainda que esse desinteresse também pode ter origem em uma sensação, nos brasileiros, de que a eleição já está ganha e o voto deles não pode mudar tal cenário.
Se os candidatos não entusiasmam o suficiente, ou se a disputa já parece resolvida de antemão pela larga de dianteira de um candidato sobre o outro, isso desestimula o eleitor” ressalta o especialista.
De acordo com Lavareda, além do aspecto conjuntural, da falta de interesse dos cidadãos, também há uma questão estrutural.
É o caso do cenário socioeconômico, contexto que pode explicar por que eleitores de baixa renda não se sentem motivados de votar.
“O grosso da abstenção no Brasil se verifica entre eleitores que tem escolaridade mais baixa e nível de renda mais baixo. A falta de interesse se associa a condições socioeconômicas mais difíceis explicando uma parte substancial das abstenções”, pondera.
Além das questões já citadas pelos especialistas, outros fatores também podem ter motivado os brasileiros a não manifestarem o direito e a obrigação do voto.
São eles:
- Falta de interesse, identificação e confiança nos candidatos.
- Disputa que parece óbvia, com um vencedor claro desde do início da campanha.
- Baixo nível de escolaridade e renda reduzida de grande parte dos eleitores.
- Falta de propostas eficazes para melhoramento dos munícipios.
- Questões estruturais, como dificuldades de deslocamento e a facilidade da tecnologia para justificar o voto, por meio do E-Título.