O projeto de lei que proíbe acordos de delação premiada de quem está preso e pune a divulgação do conteúdo das delações é um dos melhores exemplos recentes das péssimas qualidades comuns aos partidos de esquerda e de direita, lulistas e bolsonaristas. A proposta mostra segundo o colunista Matheus Leitão, da Veja, como algumas siglas se apegam à defesa dos interesses particulares de seus dirigentes e articuladores.
Basta lembrar que o projeto foi apresentado em 2016 pelo então deputado federal Wadih Damous (PT-RJ), hoje secretário nacional do consumidor, no Ministério da Justiça do governo Lula. Na época, o principal impacto do projeto era inviabilizar as delações que embasavam acusações, denúncias e mídia negativa para caciques de esquerda.
Agora, o ressurgimento do projeto, patrocinado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira, tem como principal impacto imediato ameaçar a validade das delações que implicam figurões da direita na tentativa de golpe de Estado, no 8 de janeiro de 2023 – caso que tem como protagonista o presidente Jair Bolsonaro.
Quando se trata de atacar adversários ou de proteger correligionários, esquerda e direita lançam mão dos mesmos expedientes, sem se importar nem levar em consideração o que é melhor para o Brasil.
O país, aliás, aprendeu da pior forma quais são as nefastas consequências do mau uso das delações, usadas pela Lava Jato para antecipar a condenação pública de quem ainda não tinha recebido uma sentença judicial. Reputações, carreiras, famílias, empresas e empregos foram destruídos. Depois, muitos dos casos foram desmentidos ou derrubados na Justiça.
Os articuladores desse uso deturpado das delações – o agora senador Sergio Moro e o ex-deputado Deltan Dallagnol – são cobrados até hoje, de forma justa e correta, pelo mal que fizeram ao país.
No entanto, não se pode desprezar o benefício que o uso adequado das delações pode trazer ao Brasil. Ou seja: é preciso colher os depoimentos e investigá-los, separar o joio do trigo, a verdade da mentira, o comprovado do não comprovado, demandar perícias e outras ações necessárias. Em suma: é preciso que os agentes públicos responsáveis pelo processo penal trabalhem de verdade e da forma correta, como não fizeram na Lava Jato.
Quanto aos partidos, é evidente que escolhem o caminho fácil de descredibilizar as delações quando elas incomodam o interesse próprio. O que deveriam fazer, no entanto, é analisar o tema para propor projetos de longo prazo, que beneficiem o cidadão a partir da redução da impunidade. Infelizmente, estamos longe de obter qualquer projeto qualificado ou eficaz nessa área.