Coronel-general foi nomeado pelo presidente Volodimir Zelenski para o lugar do popular Valerii Zaluzhnyi. Medida é justificada devido a “objetivos do país”, mas também questionada, apesar dos feitos militares de Syrskyi.Com a justificativa de que o comando militar da Ucrânia precisa de “mudanças urgentes” a fim de alcançar “os objetivos do país” na guerra contra a Rússia, o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, anunciou nesta quinta-feira (09/02) Oleksandr Syrskyi como novo chefe das Forças Armadas. Ele assume o posto no lugar do popular Valerii Zaluzhnyi, que teria relação estremecida com o presidente.
Ao nomear Syrskyi para o cargo, Zelenski elogiou a experiência do novo comandante, principalmente por ter desempenhado um papel fundamental na defesa de Kiev nos primeiros meses da invasão russa – iniciada em 24 de fevereiro de 2022 –, bem como nas contraofensivas no leste da Ucrânia, meses mais tarde.
Dias depois que a Rússia abandonou a tentativa de tomar a capital ucraniana, entre o final de março e o começo de abril de 2022, Zelenski concedeu a Syrskyi o prêmio de Herói da Ucrânia, a maior honraria do país. No decreto, o presidente ucraniano elogiou a “coragem pessoal” de Syrskyi e sua “contribuição significativa para a defesa da soberania e da integridade territorial da Ucrânia”.
Antes de a Rússia começar a invasão, Syrskyi era mais conhecido por coordenar uma operação de remoção na cidade ucraniana de Debaltseve em 2015. Ele criou um grupo militar apelidado de “Bars” (leopardos da neve) para dar cobertura aos soldados que estavam sendo evacuados. Devido a isso, recebeu uma medalha e se tornou chefe das forças terrestres da Ucrânia, além de herdar o apelido “Bars”.
Após o início da invasão da Ucrânia pela Rússia, Syrskyi foi um dos principais arquitetos da defesa de Kiev. Por recomendação dele, as forças ucranianas estabeleceram uma defesa de dois níveis ao redor da cidade e destruíram pontes e uma represa local. De acordo com analistas, essas medidas tornaram extremamente difícil o avanço dos agressores. As tropas russas não conseguiram chegar a Kiev e acabaram sendo forçadas a se retirar.
Campanhas no leste e no sul
O coronel-general também esteve envolvido nas contraofensivas bem-sucedidas ucranianas em Kharkiv, no leste, e Kherson, no sul, o que fez com que a Ucrânia recuperasse rapidamente o controle de vastas áreas de seu território – impondo, assim, derrotas à Rússia.
No outono europeu de 2022 e na primavera europeia de 2023, Syrskyi também foi encarregado de defender Soledar e Bakhmut, áreas que as forças ucranianas tiveram que abandonar após longas e sangrentas batalhas.
Na época, analistas militares questionaram se a defesa de Bakhmut havia sido mesmo bem-sucedida, devido ao número de baixas sofridas pelas tropas ucranianas. Syrskyi, no entanto, insistiu que defender a cidade deteriorou o poder militar da Rússia ao enfraquecer o grupo mercenário Wagner.
Escola soviética?
Syrskyi nasceu em 1965 na região de Vladimir, na então União Soviética, hoje território russo, e frequentou a Escola de Comando Militar Superior de Moscou, onde graduou-se em 1986, e, posteriormente, serviu na artilharia soviética.
Descrito como um planejador obsessivo e extremamente disciplinado, ele rebate o rótulo de que estaria mais próximo da natureza militar soviética do que dos princípios da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), baseados em flexibilidade operacional.
Em dezembro de 2022, Syrskyi disse que o exército ucraniano opera de forma completamente diferente do exército soviético ou mesmo do exército russo moderno: “vemos que as pessoas são bucha de canhão para eles”, afirmou à emissora ucraniana 1+1.
“Nós temos uma abordagem totalmente diferente. Para nós, as pessoas são o maior valor. E sem esquecer as tropas. É preciso sair, conversar, conhecer os comandantes militares, os sargentos e os soldados. Assim, você pode entender o que está acontecendo, como as pessoas vivem, quais problemas elas têm”, complementou.
Luta na Crimeia
Nos anos 1980, Oleksandr Syrskyi foi deslocado para a Ucrânia, que, na época, era uma república soviética. Após o fim do bloco, no início dos anos 1990, o militar decidiu não retornar à Rússia e juntou-se ao exército da Ucrânia recém-independente, dando continuidade aos estudos na Universidade de Defesa Nacional em Kiev.
Nos anos 2000, comandou a 72ª brigada mecanizada do exército ucraniano, com base em Bila Tserkva, cerca de 100 quilômetros ao sul de Kiev. Em 2009, foi promovido a general e, em 2013, participou de treinamentos em cooperação com a Otan.
Um ano depois, em 2014, após a revolução pró-europeia de Maidan na Ucrânia, a Rússia anexou a península da Crimeia. Syrskyi tornou-se então um dos chefes das operações para impedir que Moscou assumisse o controle total da região do Donbass.
O que muda
No momento em que as tropas ucranianas têm sido pressionadas por ataques russos em vários pontos, principalmente em Avdiivka, perto de Donetsk, a promoção de Syrskyi poderia ser uma “grande mudança estratégica” para a Ucrânia, especialmente em vista das diferenças entre Syrskyi e Zaluzhnyi, segundo declarou Frank Ledwidge, ex-oficial de inteligência militar do Reino Unido, à DW.
“Por exemplo, não tenho dúvidas de que [Syrskyi] está recomendando, agora, enquanto conversamos, que os ucranianos aguentem o máximo que puderem em Avdiivka, independentemente do custo, assim como ele fez durante a campanha de Bakhmut, o que foi, na minha opinião, e na opinião de muitos outros, provavelmente um grande erro”, disse Ledwidge.
Por outro lado, o especialista militar Nico Lange afirmou à emissora pública alemã ZDF que Syrskyi provavelmente se concentrará mais na defesa sustentável: “acredito que o general seja alguém que conheça muito bem as Forças Armadas russas, e minha perspectiva é que é muito importante ter alguém que seja bom em defesa, considerando a pressão que a Ucrânia está enfrentando no leste.”
Questões políticas?
Supostamente, o presidente ucraniano tem um relacionamento complicado com o antecessor de Syrskyi, Valerii Zaluzhnyi, desde o fracasso da contraofensiva da Ucrânia em 2023.
Também há rumores de que Zaluzhnyi estaria planejando entrar na política e concorrer contra Zelenski assim que eleições forem marcadas no país, embora o popular general nunca tenha expressado publicamente quaisquer ambições políticas.
Em Kiev, entretanto, parte da população questiona abertamente a medida. “Essa é uma decisão muito estranha. Conhecemos nosso inimigo, e ele não é Zaluzhnyi”, disse Svitlana Kalinina, uma consultora.
“Estou muito chateada. Não sei quanto aos outros, mas eu estou muito chateada. É um movimento que me preocupa”, declarou Olena, uma médica.
No final do ano passado, uma pesquisa colocou a confiança do público em Zaluzhnyi em mais de 90%, significativamente maior do que os 77% de Zelenski.