Contaminado por paixões de ambos os lados, o debate do projeto das fake news — adiado na noite desta último terça-feira (2) por falta de votos da base para evitar a derrota do texto de Orlando Silva (PCdoB-SP)— evidenciou segundo Robson Bonin, da Radar, a debilidade do presidente Lula (PT) para fazer valer a vontade do governo nas discussões patrocinadas pelo Planalto na Câmara.
Valendo-se de fórmulas antigas para tentar construir uma base de sustentação no Parlamento, o petista chegou ao quinto mês de mandato sem obter maioria legislativa segura para impor derrotas à oposição barulhenta do bolsonarismo.
O lobby poderoso das plataformas digitais tornou a missão governista mais dura, é verdade, mas um presidente da República que, no quinto mês, não consegue maioria para vencer no plenário da Câmara mostra que algo vai mal na condução do Planalto.
Chefe da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) foi, até aqui, atacado pelo petismo radical que sempre viu nele um aliado de Jair Bolsonaro. Graças a ele, no entanto, o governo conseguiu aprovar matérias valendo-se da influência do alagoano nas bancadas. Fiador do governo, Lira tem buscado ajudar justamente no momento em que o Planalto manobra para esvaziar seus poderes sobre o orçamento e retomar o espaço perdido por Bolsonaro nessa área. O dilema é claro: Lula precisa retomar os poderes da Presidência sobre o orçamento, mas corre o risco de esvaziar Lira e sua estrutura hoje disposta a cooperar com o Planalto.
Temendo repetir a história de Dilma Rousseff com Eduardo Cunha, os aliados de Lula apoiaram a eleição do presidente da Câmara em fevereiro. A união momentânea, no entanto, deu-se pela constatação petista de falta de forças para tratorar Lira. A convivência com o chefe da Câmara segue incômoda e as ações do petismo instalado no Planalto para esvaziar Lira na liberação de emendas mostra que o caminho para uma eventual parceria será longo. No momento, a palavra de ambos os lados é tolerância. Ainda que não haja romantismo, um lado sabe que precisa do outro e vice-versa.
Lira deu recados claros a Lula no fim de semana. Disse que está disposto a ser parceiro, não um faz-tudo do Planalto. Reivindicou, com isso, poderes que o consolidem como sócio, não funcionário do chefe da República, mas também deixou claro que não faz milagres. A formação da base governista pelo petismo patina nas mãos de Rui Costa e no temperamento centralizador do presidente da República.
A existência de bancadas fisiológicas, fortalecidas pelos recursos públicos do fundo partidário, também complica a vida de Lula. É preciso, nesse caso, conversar mais, lacrar menos e permanecer mais em Brasília investindo tempo na formação de alianças. Enquanto isso não mudar, será difícil vencer na Câmara.