Quase dois anos atrás, conforme relembrou a Folha de S. Paulo, e exatamente no começo de novembro de 2020, os Estados Unidos viveram dias de expectativa até que o perdedor da eleição presidencial reconhecesse o resultado e desse início ao processo de transição para o opositor que ficou à frente nas urnas.
Na ocasião, foram necessários 16 dias entre a vitória de Joe Biden e o começo oficial da transição de governo, à época ocupado por Donald Trump.
O prazo, contudo, foi marcado por um longo silêncio até o republicano reconhecer a vitória do democrata –Trump levou mais de uma semana para, deixando claro o contragosto, escrever dois posts em seu Twitter, um admitindo a derrota e outro voltando atrás.
O cenário guarda certa semelhança com o silêncio de Jair Bolsonaro (PL) sobre a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições deste domingo (30). Aliado de Trump, o brasileiro ainda não fez qualquer manifestação pública admitindo a derrota.
Em 7 de novembro de 2020, quando o resultado da eleição americana foi anunciado, Trump foi jogar golfe na comunidade de Sterling, no estado da Virgínia, a cerca de 30 minutos de Washington. Na ocasião, enquanto os americanos estavam ansiosos para saber o vencedor do pleito, o republicano era apenas um senhor de 74 anos, recuperado há pouco da Covid-19, vestindo um boné em que se lia “Make America Great Again” (faça a América grandiosa outra vez) e praticando seu esporte favorito.
Enquanto o presidente americano se divertia, porém, a Pensilvânia atualizou os números da votação no estado e chancelou a vitória de Joe Biden. Os advogados de Trump rapidamente se pronunciaram e prometeram continuar a enxurrada de ações judiciais para tentar reverter os resultados, principalmente os da Pensilvânia, onde, segundo eles, mais de 600 mil cédulas foram fraudadas. Já o republicano ficou calado.
Ao longo dos dias, Joe Biden repudiava a ação do republicano e chamava a recusa de Trump de vergonha. À época, porém, o democrata acreditava que a postura de seu adversário não teria muitas consequências para o processo de transição -mal sabia ele que em menos de dois meses um multidão insuflada por Trump invadiria o Capitólio e protagonizaria um dos maiores ataques à democracia americana.
Em 15 novembro de 2020, o então presidente americano disse que Biden “ganhou porque a eleição foi fraudada”, sem citar o nome do rival, para uma hora depois voltar atrás e afirmar que “não reconhecia nada” e que o democrata só era considerado vencedor pela “imprensa de fake news”.
Da família Bolsonaro, as únicas manifestações públicas até a publicação deste texto foram de Michelle, mulher do presidente –que fez um post com um salmo da Bíblia em seu Instagram, sem mencionar as eleições– e do senador Flávio, filho mais velho do político, que em rede social falou em erguer a cabeça e “não desistir do Brasil”.
Nos EUA, a transição formal de governo começou depois de Trump ter bloqueado por mais de duas semanas o acesso da equipe de Biden a informações e recursos para a troca de poder. Mesmo quando finalmente cedeu, o republicano disse que ia seguir contestando os resultados das eleições, que ele argumentava sem provas –como o faz até hoje– terem sido fraudadas.
Biden teve mais de dois meses entre o começo oficial da transição e sua posse, em 20 de janeiro de 2021.
No Brasil, o gabinete de Bolsonaro não adotou, de forma coordenada, preparativos prévios para um cenário de mudança de governo, segundo interlocutores ouvidos pela reportagem. O assunto de uma eventual transição era considerado um tabu nos bastidores.
Ainda não está claro quanto tempo Lula terá para preparar o terreno para sua posse, marcada para 1º de janeiro.