Em todo o mundo, pessoas e empresas enfrentam escassez de tudo, desde café até carvão.
Os transtornos causados pela pandemia de Covid são os principais culpados — mas há muitos fatores e os efeitos estão sendo sentidos de diferentes maneiras.
No Brasil, não é diferente.
Confira abaixo quais países produtores estão enfrentando problemas de escassez que acabam repercutindo no suprimento de bens para o resto do mundo.
China: Carvão e papel
Uma “tempestade perfeita” na China está atingindo consumidores e empresas no país e no exterior.
E ela está afetando tudo, desde papel, alimentos, têxteis e brinquedos a chips do iPhone, diz Michal Meidan, do Instituto de Estudos de Energia de Oxford.
Meidan diz que esses itens “podem acabar faltando neste Natal”.
O problema decorre principalmente de uma crise de eletricidade, durante a qual mais de 20 províncias sofreram cortes de energia.
Mais da metade da eletricidade do país vem do carvão, cujo preço aumentou em todo o mundo. Esses custos não podem ser repassados aos consumidores chineses por causa de um teto de preço rígido, de modo que as empresas de energia estão reduzindo a produção.
A produção de carvão também foi afetada por novas checagens de segurança nas minas, regras ambientais mais rígidas e inundações recentes, acrescenta Meidan.
Isso significa que, mesmo com o aumento da demanda por produtos chineses, as fábricas foram solicitadas a reduzir o uso de energia ou fechar alguns dias.
EUA: brinquedos e papel higiênico
No Natal, “haverá coisas que as pessoas não poderão obter”, advertiu um funcionário da Casa Branca.
Os estoques de brinquedos serão afetados, assim como itens básicos como papel higiênico e água engarrafada, roupas novas e ração para animais de estimação.
Parte do problema é um gargalo nos portos dos EUA. Quatro em cada dez contêineres que entram nos EUA passam por apenas dois portos — em Los Angeles e Long Beach, Califórnia.
Em um único dia de setembro, um recorde de 73 navios foram forçados a fazer fila fora do porto de Los Angeles. Antes da covid, não era comum haver mais de um esperando.
Ambos os portos estão agora operando 24 horas por dia, 7 dias por semana, para ajudar a aliviar as pressões.
Em alguns casos, a escassez também foi causada por problemas contínuos relacionados à covid em outros países.
A gigante americana de roupas esportivas Nike, por exemplo, fabrica muitos de seus produtos em países do sudeste asiático, como o Vietnã, onde fábricas foram fechadas.
Mesmo quando os bens são produzidos, entregá-los aos varejistas se tornou mais difícil, diz o professor Willy Shih, da Escola de Negócios de Harvard, nos EUA.
Houve um aumento nos gastos dos consumidores americanos, mas a interrupção nas fábricas, portos e redes rodoviárias e ferroviárias “sobrecarregadas” criaram um gargalo, explica ele.
Índia: Carros e chips de computador
A maior fabricante de automóveis da Índia, Maruti Suzuki, viu a produção despencar, em parte devido à escassez global de chips de computador.
Esses chips gerenciam recursos como alimentação do motor e frenagem de emergência.
A escassez foi causada por interrupções relacionadas à pandemia em países como Japão e Coreia do Sul.
A demanda global pelos chips — que também são usados em telefones e computadores — já aumentava antes da pandemia, com a adoção da tecnologia 5G. A mudança para o trabalho doméstico levou a outro aumento na demanda, pois as pessoas precisavam de laptops ou webcams para trabalhar.
A escassez de componentes que chegam à Índia foi agravada pela própria interrupção de energia do país.
Os estoques de carvão estão perigosamente baixos. A economia se recuperou após a segunda onda mortal de covid-19 na Índia, levando a um aumento na demanda por energia. Mas os preços globais do carvão aumentaram e as importações da Índia caíram.
O impacto foi generalizado, disse Zohra Chatterji, ex-chefe da Coal India Limited.
“Todo o setor de manufatura — cimento, aço, construção — tudo sofre impacto quando há escassez de carvão.”
As famílias na Índia também serão atingidas, dizem os especialistas, com o aumento dos preços da eletricidade. A inflação alta significa que o preço dos produtos essenciais, como alimentos e petróleo, já subiu.
Brasil: café e água
A seca mais severa do Brasil em quase um século é parcialmente responsável pela decepcionante safra de café deste ano.
Combinado com as geadas e o ciclo natural das colheitas, tem contribuído para uma queda significativa da produção cafeeira.
Os desafios para os produtores de café foram agravados pelos altos custos de transporte e pela falta de contêineres.
Seus custos crescentes serão repassados aos cafés de todo o mundo, já que o Brasil é o maior produtor e exportador de café.
Como a maior parte da energia do país vem de hidrelétricas (65%), a falta de água está tendo um impacto direto no abastecimento de energia do país.
À medida que os preços da energia sobem, as autoridades estão pedindo à população que limitem o uso de eletricidade para evitar o racionamento.
No mês passado, o Ministério de Minas e Energia lançou um programa de incentivo à redução voluntária no consumo de energia elétrica. Por meio dele, ganha um desconto na conta de luz quem reduzir de 10% a 20% o consumo médio entre setembro a dezembro deste ano, em relação ao consumo médio do mesmo período do ano passado.
Nigéria: Gás de cozinha
A Nigéria está enfrentando escassez de Gás Liquefeito de Petróleo (GLP), que é usado principalmente para cozinhar.
Isso apesar do país ter as maiores reservas de gás natural da África
O preço do GLP aumentou quase 60% entre abril e julho, ficando fora do alcance de muitos nigerianos.
Como resultado, as famílias e empresas recorreram a carvão, ou lenha, fontes de energias muito mais sujas, para cozinhar.
Um dos motivos do aumento do preço é a escassez global da oferta — o país ainda depende do GNL importado.
É provável que a situação tenha piorado com a desvalorização da moeda e a reintrodução de impostos sobre o GNL.
Especialistas alertam que a escassez pode ter implicações alarmantes para a saúde e o meio ambiente, à medida que as pessoas procuram alternativas de combustível mais baratas, porém mais perigosas.
Líbano: Água e medicamentos
Há preocupações com a escassez de água, remédios e combustível no Líbano.
Nos últimos 18 meses, o país enfrentou uma crise econômica, que empurrou três quartos de sua população para a pobreza, afetou sua moeda e gerou grandes manifestações contra o governo e o sistema político do Líbano.
A economia do país já tinha problemas antes da covid. Mas a pandemia piorou as coisas.
A escassez de combustível levou a frequentes interrupções de eletricidade, deixando empresas e famílias dependentes de caros geradores privados movidos a diesel, se puderem pagar.
Em agosto, a coordenadora humanitária da ONU para o Líbano Najat Rochdi disse que estava “profundamente preocupada com o impacto da crise de combustível no acesso a cuidados de saúde e abastecimento de água para milhões de pessoas no Líbano”.