O presidente Jair Bolsonaro disse nesta última terça-feira (27) que se moldou para obter apoio do Congresso, ao discursar diante do futuro ministro da Casa Civil, o senador Ciro Nogueira (PP-PI), a quem entregou “a alma” de seu governo. O ingresso de Nogueira contou com a bênção de outro ícone do Centrão, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
A fala de Bolsonaro ocorreu em evento no Palácio do Planalto, horas depois de Nogueira ter anunciado que aceitaria o convite para assumir um dos postos mais importantes do governo, responsável pela articulação entre os ministérios.
Presidente do PP, ele toma o lugar do general da reserva Luiz Eduardo Ramos, que assumirá a Secretaria-Geral (SG), uma espécie de “zeladoria” do Palácio.
“Chegamos ao governo em 2018 e tínhamos que fazer algo realmente diferente. Tive a oportunidade ímpar de escolher nosso ministério baseado em questões técnicas, pouco políticas. Mas era o que poderíamos e tínhamos de fazer naquele momento. Compusemos um time de ministros nunca visto em outros governos”, afirmou Bolsonaro. “Abandonamos um pouco a questão política, mas vimos que era necessário cada vez mais buscarmos o apoio e o entendimento do Parlamento brasileiro. Fomos nos moldando.”
O presidente completou o discurso dizendo que não abandonou a bandeira do combate à corrupção com a qual se elegeu, apesar da nova moldagem.
Nogueira estava em um canto do palco, ao lado da ministra da Secretaria de Governo (Segov), Flávia Arruda, deputada pelo PL do Distrito Federal também com fortes ligações com Lira. Foi anunciado pelo locutor oficial da Presidência como “senador Ciro Nogueira”. Ramos, ainda chefe da Casa Civil, estava ao lado de Bolsonaro.
O presidente da Câmara participou na manhã de ontem da reunião que selou a nomeação do senador como ministro-chefe da Casa Civil.
“Tenho a certeza que irá desempenhar um papel importante, com amplo diálogo entre os Poderes e dentro do próprio governo”, afirmou Lira em foto divulgada em suas redes sociais.
Ele estava em viagem por causa do recesso e o encontro não constou de sua agenda oficial.
Também estiveram no encontro Flávia Arruda, Ramos e o ministro das Comunicações, Fábio Faria. Onyx Lorenzoni, que trocará a Secretaria-Geral pelo futuro Ministério do Trabalho e Previdência, a ser recriado, não participou.
No fim da tarde, em entrevista à Rede Nordeste de Rádio, Bolsonaro afirmou que a escolha de Ciro Nogueira levou em conta a dificuldade de Ramos, na articulação.
“Nós precisávamos melhorar nossa interlocução com o Congresso. O general Ramos é uma excepcional pessoa, eu o conheço desde 1973. É meu irmão. Agora, o linguajar com o Parlamento, ele tinha dificuldades”, admitiu. “É a mesma coisa que você colocar o Ciro Nogueira para conversar com generais, ele não vai saber, por melhor [sic] boa vontade que tenha.”
Bolsonaro afirmou ter entregado a Nogueira “a alma” do governo, mas “de forma salutar”.
“E dizer ao senhor presidente Lula: não é o Ministério das Minas e Energia, onde o orçamento é milionário, não é o Transporte, não é o Ministério do Desenvolvimento Regional, é a chefia da Casa Civil, é a alma de um governo”, afirmou. “É realmente a nossa interlocução aumentando com o parlamento de forma salutar e não de forma comprada como acontecia no passado.”
A posse deve ocorrer apenas na terça-feira. A intenção é evitar a cerimônia em meio ao recesso do Congresso, o que esvaziaria a presença de políticos no Planalto. Bolsonaro gostaria que ocorresse ainda ontem, mas que Nogueira sugeriu deixar para a próxima semana para que mais aliados estivessem em Brasília.
Dentro do Planalto, o comentário é que a chegada de Ciro Nogueira fortalece ministros como Fábio Faria e Flávia Arruda. Egressa da Câmara, a ministra vinha tendo dificuldades na articulação com o Senado. Agora, poderá contar com a ajuda do parlamentar.
Faria, por sua vez, é próximo de Nogueira e também trabalhou para que ele substituísse o general Ramos, com quem mantém uma relação cordial, mas não de confiança.
A cúpula do Congresso espera que a mudança na Casa Civil faça com que o ministério assuma de fato uma posição de coordenação das diferentes posições do governo na discussão de projetos com o Legislativo.
Na avaliação deles, conforme o Valor, a Casa Civil deve ser o órgão responsável por consolidar uma posição única de governo e levá-la para o Parlamento, mas a gestão do ainda ministro Luiz Eduardo Ramos peca pela falta de diálogo interno sobre as propostas em debate no Congresso.
Parlamentares reclamam que é comum terem que arbitrar disputas entre os ministérios quando discutem projetos em tramitação. Às vezes, as divergências existem até entre áreas de um mesmo ministério, o que atrapalharia a negociação das propostas.
O relator de uma importante medida do governo votada neste ano pelo Congresso relatou recentemente ao jornal Valor que, durante a tramitação, ouviu um secretário do Ministério da Economia reclamar de trecho incluído a pedido de outro secretário em seu parecer.
Ciro Nogueira não deve acumular o Ministério da Casa Civil com a presidência nacional do PP. A direção partidária deve ser assumida, ao menos interinamente, pelo deputado André Fufuca (MA).