Voa Brasil: passagem a R$ 200 vira abacaxi para o governo, e auxiliares defendem lançamento sem Lula

Criado para oferecer passagens áreas de R$ 200 aos mais pobres, o Voa Brasil sequer foi lançado, mas já é visto como uma iniciativa com potencial de gerar segundo Jeniffer Gularte, do O Globo, desgaste político para o presidente Lula da Silva. Críticos do programa no Palácio do Planalto apontam que há muitas barreiras para o acesso ao benefício, o que pode gerar frustrações nos segmentos que, há pelo menos três meses, aguardam para acessar a plataforma.

Insatisfeitos com o desenho do projeto, aliados de Lula passaram a defender, inclusive, que o petista não participe de solenidade de apresentação do Voa Brasil. Após sucessivos adiamentos, a cerimônia segue sem data para acontecer. Uma das promessas do então candidato petista, em 2022, era fazer “o pobre voltar a andar de avião”.

As regras já divulgadas estabelecem que serão beneficiados com a passagem a R$ 200 aposentados do INSS que recebem até dois salários mínimos e estudantes do ProUni. Além de obedecer a este critério, é necessário que o passageiro não tenha voado nos últimos doze meses.

De acordo com o Ministério de Portos e Aeroportos, chefiado por Silvio Costa Filho, o país tem 22 milhões de aposentados com essa faixa de renda e 700 mil universitários com bolsa do Ministério da Educação. A estimativa é que entre 10% e 15% desse público poderia aderir ao programa inicialmente, o que representaria um acréscimo de 3 milhões de passageiros na aviação brasileira.

Apesar do levantamento, as previsões sobre a eficácia do programa não são tão exatas. Um dos receios levantados pelo núcleo próximo ao ministro da Casa Civil, Rui Costa, é que o governo não terá qualquer controle da oferta de passagens. Isso porque não há dinheiro do governo federal para subsidiar os preços. Esse modelo, avaliam, deixa o Executivo nas mãos das empresas, que podem alterar os preços e a quantidade de voos oferecidos.

— Todo programa que tem recurso público é mais fácil de operacionalizar, porque você está bancando e investindo. Esse não (tem recurso do governo). É um programa (com uma) desconstrução coletiva. O desejo de todos nós é atender a uma ampla maioria da sociedade, mas as companhias não têm condições, neste momento, de poder fazer mais do que estamos construindo no Voa Brasil — disse o ministro Silvio Costa Filho, que reconhece algumas das dificuldades.

O ministro explica que um dos focos do programa é dar oportunidade de viagens a quem praticamente não conseguiu voar nos últimos dez anos.

Outra crítica de quem torce o nariz para o programa é a de que o Voa Brasil será uma mera plataforma de busca de voos de até R$ 200, semelhante a outros sites que já existem no mercado. Também pontuam que haverá menos ofertas em época de alta temporada, como em julho e no final do ano, o que também poderá elevar críticas à plataforma. A insatisfação pode afetar a imagem do presidente, avaliam auxiliares. Os aliados de Lula temem a possibilidade de ser difícil buscar voos ou mesmo de encontrar bons horários para viagens.

Enquanto isso, Silvio Costa Filho busca uma data, há três meses, junto ao chefe de gabinete de Lula, Marco Aurélio Santana Ribeiro, para inaugurar o Voa Brasil. Já houve cancelamento em datas que o próprio ministro anunciou. A última delas foi em 17 de abril, data mencionada pelo ministro, mas que coincidia com viagem de Lula a Bogotá. Aliados de Costa Filho negam que haja má vontade da agenda do presidente ou da Casa Civil em entregar o programa.

O ministro já apresentou uma primeira versão do programa a Lula e deve mostrar, na próxima semana, a roupagem final da plataforma, com os ajustes solicitados pela Casa Civil. A finalização da plataforma e a estruturação técnica do programa também tem exigido mais tempo do ministério, já que o site estará interligado às companhias áreas e deverá ter camadas de segurança para não haver problemas nas compras dos bilhetes.

Programa ‘velho’

Integrantes da Casa Civil afirmam que o programa já nasce “velho”, uma vez que detalhes do seu lançamento vêm sendo vazados desde março do ano passado, quando o ministro Márcio França, na época chefe da pasta de Portos e Aeroportos, deu a primeira declaração pública sobre a ideia.

Na ocasião, o projeto não havia passado pelo crivo da Casa Civil, e Lula veio a público dizer que os ministros deveriam apresentar suas “genialidades” à equipe do ministro Rui Costa antes de as divulgarem. Agora, pessoas próximas ao ministro Silvio Costa, atual chefe da pasta, avaliam que o fato de o antecessor ter lançado o programa “sem combinar com ninguém” criou na opinião pública imagem de que haverá passagens a R$ 200 para uma parcela maior da população.

Essa percepção equivocada “caiu no colo” da nova equipe, que precisa administrar as expectativas em relação ao Voa Brasil. Márcio França deixou o ministério em setembro do ano passado, quando Lula abriu espaço no governo para o Republicanos, enquanto o ministro do PSB passou a comandar o Ministério de Micro e Pequenas Empresas. Integrantes da antiga equipe de França afirmam, em caráter reservado, que a Casa Civil tem implicâncias conceituais com o programa desde sua origem.

A ideia original de França era inaugurar o programa por faixas. Nos primeiros seis meses seriam oferecidas passagens a R$ 200 o trecho a aposentados e, depois, com o segundo grupo, estudantes do ProUni. O objetivo é estimular que as companhias comercializem a esse valor os assentos ociosos dos voos, que tem uma média de 15%.