A governança corporativa, um dos pilares do ESG (sigla para meio ambiente, social e governança), voltou a ser um dos principais assuntos midiáticos em 2023 após grandes empresas se envolveram em escândalos. Com o lançamento de novas tecnologias, como a inteligência artificial (IA), esses problemas tendem a diminuir, segundo especialistas ouvidos pelo Estadão.
Eles destacam que o uso da inteligência artificial na governança corporativa pode ser benéfico para fortalecer a transparência. Por isso, essa associação já é vista como uma tendência por parte das empresas.
“A IA tem o potencial de ser uma ferramenta poderosa para prevenir escândalos de governança. Algoritmos podem ser treinados para identificar comportamentos anormais ou transações suspeitas que possam indicar fraude ou má conduta”, explica o diretor executivo da C&S Projetos e Mercado, Bruno Siqueira.
Ele afirma que a IA pode servir como uma ferramenta para aprimorar as práticas de governança corporativa, melhorando a eficiência operacional, a conformidade regulatória e a tomada de decisão. Com isso, o maior ganho é a possibilidade de combater e detectar fraudes.
Siqueira lembra que nem mesmo os conselheiros estão imunes aos próprios vieses. “A racionalidade de uma estrutura de IA pode atenuar tanto os comportamentos disfuncionais dos conselheiros como indivíduos, quanto os vieses de grupo.”
Benefícios na prática
Em termos práticos, Siqueira destaca que um dos maiores benefícios é a possibilidade de automatizar tarefas rotineiras de compliance, o que aumenta não só a confiabilidade dos relatórios gerados, por exemplo, mas também torna o processo mais rápido e menos burocrático.
“A inteligência artificial auxilia na tomada de decisão. Ela funciona como uma curadoria para as informações”, explica o gerente de produtos da Axur, Rodrigo Alves, destacando que a maior vantagem da IA na tomada de decisão é selecionar os contratos mais importantes a serem avaliados, por exemplo, com base em critérios personalizados para a empresa.
Outros benefícios, segundo ele, são: insights de áreas ou temáticas que devem receber mais atenção das empresas, a criação de resumos de documentos – que, dependendo do volume, poderiam levar muito tempo – ou encontrar possíveis inconsistências em contratos, por exemplo.
Além disso, a tecnologia pode ajudar na avaliação de riscos, no monitoramento em tempo real de transações financeiras e na melhoria das comunicações internas e externas levando a uma governança mais eficaz, transparente e responsável.
Siqueira afirma que outra vantagem é a detecção de fraudes por meio de algoritmos e fornecer análises mais profundas para a tomada de decisão estratégica.
É preciso cautela
O especialista destaca que é importante deixar claro que a inteligência artificial é uma ferramenta e deve ser parte de uma abordagem mais ampla de uma boa governança, incluindo o uso de outros sistemas de controle.
Rodrigo Alves, da Axur, afirma que, embora a tecnologia faça o trabalho inicial na curadoria de dados, por exemplo, é importante haver trabalho humano posteriormente.
Ele ainda destaca que os dados a serem tratados devem ser personalizados, com a adição de critérios que direcionam para a necessidade da empresa. “Quanto mais genérico, mais arriscado é.”
O especialista ainda destaca que o uso dos modelos abertos acaba sendo mais arriscado e impreciso. Por isso, a dica é que as empresas optem por domínios específicos em plataformas como o ChatGPT ou outras inteligências artificiais. “Elas estão funcionando melhor do que as abertas, já que você entrega para ela uma base de dados mais filtrada e de qualidade do que todas as informações disponíveis na internet, por exemplo”.
Bruno Siqueira ainda alerta que a IA está sujeita a falhas, por ter limitações, o que demonstra a necessidade de que o sistema de IA usado em governança seja regularmente auditado e atualizado, e que os seres humanos continuem envolvidos no processo de supervisão.
“Algoritmos podem ser influenciados por dados imprecisos ou preconceituosos, e podem não ser capazes de capturar a totalidade de um problema complexo. Isso pode levar a relatórios que são imprecisos ou até mesmo enganosos”, afirma.
O Presidente do Instituto Smart Business, Lorenzo Madrid, destaca que o uso da IA na governança corporativa segue sendo uma tendência no mercado corporativo, além da automação de processos e o uso de sistemas de tecnologia em tempo real.
Para ele, a blockchain (cadeia de dados que permite o compartilhamento de bens e informações em uma base segura e imutável) também se mostra forte no mercado, e já começa a ser usada nos chamados contratos inteligentes.